27.11.03

Sinais e Maravilhas


Apascentava Moisés o rebanho de Jetro, seu sogro, sacerdote de Midiã; e, levando o rebanho para o lado ocidental do deserto, chegou ao monte de Deus, a Horebe. Apareceu-lhe o Anjo do Senhor numa chama de fogo, no meio de uma sarça; Moisés olhou, e eis que a sarça ardia no fogo e a sarça não se consumia. Então, disse consigo mesmo: Irei para lá e verei essa grande maravilha; por que a sarça não se queima? Vendo o Senhor que ele se voltava para ver, Deus, do meio da sarça, o chamou e disse: Moisés! Moisés! Ele respondeu: Eis-me aqui! Deus continuou: Não te chegues para cá; tira as sandálias dos pés, porque o lugar em que estás é terra santa. Disse mais: Eu sou o Deus de teu pai, Deus de Abraão, o Deus de Isaque e os Deus de Jacó. Moisés escondeu o rosto, porque temeu olhar para Deus.
(Êxodo 3. 1-6).

Introdução.
Se nós temos algumas chance de conhecermos a Deus é devido à Sua extrema solicitude e graça para conosco.

Mesmo sendo o Alto e o Sublime, o Eterno, Ele desce até o homem por amor, se revela a ele e o livra.

Dessa forma, para se fazer conhecido, o Senhor faz uso de sinais, instrumentos usados em nosso socorro. Isso porque o nosso conhecimento de Deus não pode ser imediato. Lembra que no capítulo 33 de Êxodo Moisés pede ao Senhor que lhe permita ver a Sua glória: Rogo-te que me mostres a tua glória (33. 18). Deus então lhe diz que fará passar a Sua bondade por Moisés e lhe proclamará o Seu nome, mas completa: Não me poderás ver a face, porquanto homem nenhum verá a minha face e viverá (20). Moisés, então, vê a Deus pelas costas! O conhecimento, a visão de Deus não pode ser imediata.

Isso nos leva a perguntar: O que são sinais? São isso mesmo: sinais que nos apontam Deus. São meios que Deus utiliza para se revelar.

Não podemos nos concentrar nos sinais sob pena de criarmos amuletos no lugar de crermos nAquele que é nosso Refúgio e Fortaleza; sob pena de crermos eu um ídolo em vez de crermos em Deus. Há um ditado que nos vale aqui: precisamos tomar cuidado para que as copas das árvores não nos impeçam de ver a beleza da floresta inteira. Para encontrarmos a Deus, precisamos olhar a realidade que cada evento, cada sinal manifesta e precisamos transcender até a visão de Deus. Aqui voltamos ao nosso texto. Moisés está apascentando o rebanho de seu sogro quando vê um espetáculo: uma sarça está envolta pelo fogo mas não se consome. Quando Moisés se aproxima, o Senhor lhe dirige a palavra e se apresenta como o Deus de Israel que desceu a fim de livrá-lo.

O versículo 3 nos diz: Então, disse consigo mesmo: Irei para lá e verei essa grande maravilha; por que a sarça não se queima?

Moisés foi tentado a se concentrar no sinal. Mas a voz do Senhor chamou sua atenção para o maravilhoso Deus que se revelava e a sarça cumpriu seu papel: ser sinal. Daí em diante, ela não será mais mencionada no texto. Deus tirou o foco de Moisés da maravilha da sarça e pôs sua atenção na maravilha exata: o Deus vivo que desce para livrar o Seu povo. Moisés é um exemplo de uma postura correta diante do sinal que revela Deus.

Mas a Bíblia tem exemplos negativos do trato do povo do Senhor com Seus sinais. Sobre três desses exemplos gostaria de falar agora.

1. O texto de 1 Samuel 4. 1-11 nos diz que por ocasião de uma batalha com os filisteus, os israelitas foram derrotados. Sem entender a causa do ocorrido, Israel decide trazer para o campo de batalha a arca do Senhor:

Voltando o povo ao arraial, disseram os anciãos de Israel: Por que nos feriu o Senhor, hoje, diante dos filisteus? Tragamos de Siló a arca da Aliança do Senhor, para que venha no meio de nós e nos livre das mãos de nossos inimigos (3).

Eles criam que a simples presença da arca lhes garantia a vitória. Vieram a arca e os dois filhos do sacerdote Eli, Hofni e Finéias. A princípio, os filisteus temeram: Os deuses vieram ao arraial. E diziam mais: Ai de nós! Que tal jamais sucedeu antes (7). Mas eles decidem se por lutar varonilmente. A conseqüência dessa batalha se descreve no fim do nosso texto: Então, pelejaram os filisteus; Israel foi derrotado, e cada um fugiu para a sua tenda; foi grande a derrota, pois foram mortos de Israel trinta mil homens de pé. Foi tomada a arca de Deus, e mortos os dois filhos de Eli, Hofni e Finéias (10-11). O que era a arca? Era o instrumento, o testemunho da revelação de Deus.

Com o tempo, adquiriu o caráter de amuleto. Os israelitas passaram a acreditar que a simples presença da arca garantiria a presença de Deus e Sua bênção Esse tipo de atitude para com o sinal de Deus faz com que a religiosidade do povo se degenere em puro culto supersticioso.

2. Jeremias 7. 1-7 diz: Palavra que da parte do Senhor foi dita a Jeremias: Põe-te à porta da Casa do Senhor, e proclama ali esta palavra, e dize: Ouvi a palavra do Senhor, todos de Judá, vós, os que entrais por estas portas, para adorardes ao Senhor. Assim diz o Senhor dos Exércitos, o Deus de Israel: Emendai os vossos caminhos e as vossas obras, e eu vos farei habitar neste lugar.

Não confieis em palavras falsas, dizendo: Templo do Senhor, templo do Senhor, templo do Senhor é este. Mas, se deveras emendardes os vossos caminhos e as vossas obras, se deveras praticardes a justiça, cada um com o seu próximo; se não oprimirdes o estrangeiro, e o órfão, e a viúva, nem derramardes sangue inocente neste lugar, nem andardes após outros deuses para o vosso próprio mal, eu vos farei habitar neste lugar, na terra que dei a vossos pais, desde os tempos antigos e para sempre.


O que era o templo? Era o local escolhido por Deus para se manifestar a Seu povo.

No entanto, não passava de um meio. O próprio Salomão, quando consagrou o templo, reconheceu que o Deus que criou o universo não poderia habitar em uma casa feita por homens. No tempo de Jeremias o templo tinha se tornado um meio de aplacar a consciência, em uma religiosidade sem conversão. Essa religiosidade sem conversão, nessa atitude errada diante do templo, era manifestação de um culto hipócrita.

3. Por fim, a história contada em Números 21. 4-9 é bastante conhecida. Devido ao pecado do povo, Deus enviou serpentes que começaram a ferir e matar Israel. Então, o Senhor disse a Moisés que construísse uma serpente de bronze; todo aquele que mordido por uma serpente, olhasse para aquela feita de bronze, seria curado, seria salvo.

A serpente de bronze era sinal da salvação de Deus. Quando Jesus fala a respeito de sua morte, ele a liga à serpente: E do modo por que Moisés levantou a serpente no deserto, assim importa que o Filho do Homem seja levantado, para que todo o que nele crê tenha a vida eterna (João 3. 14-15). No entanto, a serpente, sinal da salvação de Deus, foi tornada em objeto de culto idólatra. Você pode ler em 2 Reis 18 sobre o rei Ezequias, que promoveu uma grande reforma religiosa e política em Judá. No versículo 4 está escrito que Ezequias: Removeu os altos, quebrou as colunas e deitou abaixo o poste-ídolo; e fez em pedaços a serpente de bronze que Moisés fizera, porque até àquele dia os filhos de Israel lhe queimavam incenso e lhe chamavam Neustã.

Conclusão.

Quanto mais corrermos atrás dos sinais (e nos concentrarmos neles) por si mesmos, mais distantes vamos estar daquele que eles revelam e de quem são instrumentos: Jesus. Centralizar nossa fé nos sinais é uma tentativa nossa de controlar o Soberano Deus. Nossa idolatria é criar um Deus que funcione a nosso bel-prazer; um amuleto que garanta a bênção divina independente do culto verdadeiro.

Nos exemplos, Israel transformou os meios da revelação de Deus em amuletos, garantia da presença divina. O Senhor continua usando meios para se fazer conhecido a nós. Não se concentre nos sinais. Os sinais servem para nos apontar Deus, mas podem nos fazer cultivar uma vida religiosa sem conhecimento, um culto supersticioso. Podem nos fazer cultivar uma vida religiosa sem responsabilidade pessoal e compromisso, um culto hipócrita. Podem transformar o sinal ou meio em um deus manipulável, manifestação de um culto idolátra. Cuidado para que as copas das árvores (os sinais) não o impeçam de ver a beleza da floresta inteira (o Deus vivo).