14.5.05

Saindo do poço

Jeremias, ponha esses trapos debaixo dos braços para que as cordas não machuquem você.
Jeremias 38. 12

Jeremias era um incômodo para a liderança de Israel. Sua palavra, vinda do Senhor, denunciava os pecados e a injustiça cometidas especialmente por aqueles que deveriam ser responsáveis pela vida espiritual do povo. Durante o cerco de Jerusalém, Jeremias incomodou tanto que terminou sendo preso. No pátio da guarda. Mas ninguém poderia calar sua voz e ele continuou profetizando. Até que um grupo chefiado por Safatias procurou o rei Zedequias afirmando que o profeta devia morrer. O rei, impotente, permitiu que o grupo lançasse Jeremias em poço. Não havia água no poço, mas apenas uma lama, imagino, fedida. Jeremias estava condenado. Se não morresse devido a alguma doença adquirida naquela lama, morreria de fome. Pelas mãos dos líderes de seu próprio povo.
Só que existia um eunuco etíope, Ebede-Meleque, temente a Deus. Procurou o indeciso rei, intercedeu pelo profeta e recebeu autorização para resgatá-lo da morte certa. Junto com um grupo de trinta homens, o etíope arma o esquema para resgatar Jeremias. Pegou trapos e roupas usadas, desceu cordas, mandou Jeremias proteger as axilas com as roupas e ergueu o fragilizado corpo do profeta com cordas. Ajudaram Jeremias a sair do poço.
Hoje eu queria extrapolar um pouco esta história. Meu desejo é usar alguns elementos desse relato como metáfora para algumas situações que acometem nossas vidas, vez por outra. Diversas situações podem nos lançar em poços fedidos como aquele em que se encontrava Jeremias. Ali, estaremos condenados à morte certa, ainda que não seja uma morte física. Podemos nos sufocar na lama e na sujeira. Podemos nos infectar com algum vírus mortal. Quem sabe a mágoa. Quem sabe o ressentimento. Quem sabe a tristeza. Quem sabe os desejos de vingança. Quem sabe qualquer desses pesos que podem nos arrastar para um destruição ainda maior. No fundo do poço, cercado por essa fedentina que nos sufoca, não encontramos, não contemplamos qualquer chance de escapatória. Sentimo-nos e vemo-nos como realmente estamos: condenados. Sozinhos somos impotentes para sair dali.
O profeta não caiu no poço por si só. Foi lançado ali por líderes que desejavam silenciar a sua voz. Se tivessem a chance, aqueles homens ainda afundariam ainda mais Jeremias na lama. Se pudessem, eles não titubeariam em jogar ainda mais lama, sujeira e podridão sobre ele. Sufocá-lo mais rápido, roubar-lhe as chances de escapar. Às vezes não temos inimigos assim a nossa volta. Às vezes são os amigos que fazem isso, mesmo repletos de boas intenções. Estamos mergulhados em um poço profundo de tristeza, mágoa, dor e ressentimento. E, nessas horas, nos cercam amigos que, ainda que queiram nos ajudar, não sabem muito o que fazem. Alimentam, assim, ainda mais a lama de nossas piores emoções. Fomos feridos por terceiros e os nossos amigos nos sufocam, estimulando os desejos de vingança. Fomos marcados por ações de outros, os conselhos que ouvimos nos conduzem a alimentar a mágoa e o ressentimento. Mesmo que nosso maior desejo seja escapar do poço, como se estivéssemos na areia movediça, nos afundamos ainda mais cada vez que nos esforçamos por sair. Além disso, as vozes que optamos por ouvir jogam mais lama ainda em nossa cabeça. Quando olhamos para o alto, vemos a luz da saída. Sabemos que podemos sair. Mas todo nosso esforço, todo o apoio que recebemos tem sido vão. Afundamos mais. Mais tristeza. Mais mágoa. Mais dor. Afundamos mais. Estamos cercados pelas pessoas erradas que nos afundam, mesmo sem perceber.
O que precisamos para sair? Precisamos de um eunuco etíope. Alguém que tenha a visão do alto. Alguém que tenha o coração quebrantado na presença do Senhor. Alguém que venha e possa interceder junto ao rei porque sabe que Jeremias é um profeta de Deus. Precisamos de alguém que interceda por nós. Precisamos de alguém que lance as cordas para nos puxar do fundo do poço. Precisamos de alguém que esteja lá em cima, na boca do poço, não de alguém que esteja do nosso lado e nem perceba que lança ainda mais lama para nos afundar. Alguém que se deixe levar mais perto por Deus. Alguém que tenha o seu coração em Jesus. Precisamos de alguém que nos apóie, não estimulando nossos desejos de vingança, mas nos ajudando a ver além de toda dor, toda mágoa, todo ressentimento.
Cada um pode enfrentar uma situação como a que descrevo. Eu já enfrentei, por isso sou capaz de afirmar que passamos por algo assim pelo menos uma vez na vida. É nessas horas que devemos escolher com quem vamos andar. E restam apenas duas alternativas. Felizes são aqueles que não se deixam levar pelos conselhos dos maus, que não seguem o exemplo dos que não querem saber de Deus e que não se juntam com os que zombam de tudo o que é sagrado! Pelo contrário, o prazer deles está na lei do Senhor, e nessa lei eles meditam dia e noite (Sl. 1. 1 – 2).
Toda a dor pela qual passamos, toda tristeza, são oportunidades que Deus nos dá para andarmos mais junto a Ele. São ações de Deus para moldar o nosso caráter. Depende de nós escolher que efeito essas coisas terão em nossa vida. Podem nos trazer mais perto de Deus, podem nos afundar em um poço de morte. A escolha das pessoas a quem pediremos ajuda pode ser decisiva nessas horas. A quem buscaremos? Ao que tem prazer no Senhor ou àquele cujo prazer é sentar e escarnecer, alimentando as dores, as mágoas e o pecado?

13.5.05

Ansiedade

Por isso, não fiquem preocupados com o dia de amanhã...
Mateus 6. 34.

A segunda semana é a pior semana do meu mês. São os dias mais angustiantes da minha vida. É geralmente na segunda semana do mês que recebo o meu pagamento. Mas como ele não tem uma data fixa, dependendo da boa vontade da universidade em repassar a verba da Capes, sofro demais. Minha primeira conta em débito automático vence no dia 12. Nunca estou certo de que terei o dinheiro para cobri-la. Ontem aconteceu isso. Acordei, acessei minha conta e descobri que estava devendo dinheiro ao banco: nenhum centavo da bolsa havia entrado e a minha conta tinha sido debitada.
Os dias 11, 12 e 13 de cada mês são os mais angustiantes na minha vida. São os dias de maior e mais intensa ansiedade. As caspas explodem na minha cabeça, fico irritadiço. Sofro demais e outras pessoas terminam sofrendo por extensão. O ruim é descobrir e perceber que não adianta de nada sofrer assim. O dito popular diz que o que não tem remédio remediado está. Jesus diz que nenhum de nós pode encompridar a sua vida, por mais que se preocupe com isso (Mt. 6. 27).
Pior ainda é perceber com clareza que toda ansiedade não serve para nada, muito menos para resolver qualquer coisa. Por mais que nos preocupemos com alguma coisa, e geralmente as coisas que mais nos pré-ocupam se relacionam a dinheiro, no fim de tudo, todas as coisas acontecerão e não teremos a menor chance de controlar coisa alguma. E percebemos que manter a ansiedade beira à nossa estupidez porque estamos ansiosos por acreditar que temos alguma chance de controlar os eventos de nossa vida, quando, na verdade, não temos, nunca tivemos e nunca teremos o controle da nossa vida totalmente nas mãos. As coisas que nos acontecem não podem ser controladas ou conduzidas por nós mesmos e, quando não percebemos isso, resta-nos a profunda ansiedade de querer ter o leme nas mãos e nunca alcançar a cabina de comando. A vida é, aproximadamente, como ilustra a metáfora de Forrest Gump: aquela pena conduzida pelo vento. Quer nos conformemos ou não, não a controlamos em absoluto.
É sobre isso que fala Jesus. Ele fala, nós pregamos, mas muito poucos de nós realmente ouvimos. Em primeiro lugar, Ele esclarece que a vida é mais que comida, bebida ou roupas. A vida é mais que as coisas que sabemos ser as mais essenciais da vida. E é mais que isso porque o Deus que veste as flores do campo, alimenta os passarinhos, cuida com tanto carinho de Sua Criação é o supridor de todas as nossas necessidades básicas. Ele cuida da Criação e não cuidará de nós? Portanto, não fiquem preocupados, perguntando: “Onde é que vamos arranjar comida?” ou “Onde é que vamos arranjar bebida?” ou “Onde é que vamos arranjar roupas?” (Mt. 6. 31).
Afirmar que nós não temos o controle da nossa vida não significa dizer que ela está fadada a ser sem controle. Afirmar que ela é como aquela pena do filme de Tom Hanks não significa que ela segue de qualquer jeito, como canta Zeca Pagodinho (Deixa a vida me levar, vida leva eu...). O texto nos convida a entregar o controle absoluto de nossa vida nas mãos de Deus. E essa vida rendida a Deus, a vida do Espírito, é a aquela vida levada por um Vento diferente: O vento sopra onde quer, e ouve-se o barulho que ele faz, mas não se sabe de onde ele vem, nem para onde vai. A mesma coisa acontece com todos os que nascem do Espírito (Jo. 3. 8). A vida que entrega o controle, o leme, a direção nas mãos do Pai. Vida na qual rendemos qualquer intenção de ter o controle. Qualquer mesmo. E colocamos como prioridade, não mais a tentativa de dirigi-la por nós mesmos, mas sim as coisas mais importantes do mundo: Portanto, ponham em primeiro lugar na sua vida o Reino de Deus e aquilo que Deus quer, e Ele lhes dará todas essas coisas (Mt. 6. 33).
É isso. A vida do homem é mais que comida, bebida ou roupas. Essas jamais podem ser ou serão as coisas mais importantes da vida. A coisa mais importante da vida é de outro teor. É graça, que é melhor que a vida (Sl. 63. 3). É Reino de Deus, pois o Reino de Deus não é uma questão de comida ou de bebida, mas de viver corretamente, em paz e com a alegria que o Espírito Santo dá (Rm. 14. 17).

12.5.05

Coisas impossíveis

Prepararei um caminho no deserto e porei rios no ermo.
Isaías 43. 19

Deus faz coisas improváveis. Deus faz coisas impossíveis. Dia a dia a gente se depara com as ações surpreendentes de Deus. Nas horas mais inesperadas, porém mais necessárias.
Dois anos atrás recebemos aqui em Natal um grupo de jovens goianos para duas semanas de evangelismo. Foram duas semanas de muitas ações surpreendentes de Deus. Porém, o momento mais inesquecível para mim se deu em um domingo, em uma congregação em um bairro da periferia da cidade. Tínhamos preparado todo o impacto, conseguindo até um potente som. Já tínhamos convidado as pessoas do bairro para o evento.
A ação começaria às 19 horas e 30 minutos. Por volta das 18 horas começou a chover muito. Reunimo-nos na congregação e fomos pedir a Deus o fim da chuva. O pastor André, líder do grupo goiano, havia dito que se não parasse de chover até às 19 horas, cancelaríamos a ação. Eu e ele fomos orar na rua. Eu já estava preparado para o cancelamento, pois faltavam poucos minutos para as 19 horas. A chuva ainda estava caindo, o céu estava completamente fechado com as nuvens pesadas.
De repente, como se fosse um gol aos quarenta e quatro minutos do segundo tempo, a lua começou a aparecer sobre as nossas cabeças. Era pontualmente 19 horas. Se alguém lembrasse que ainda havia chance de chover, ninguém nos poderia convencer que ainda choveria enquanto estivéssemos ali para falarmos de Jesus. Deus havia respondido nosso clamor. Na hora exata. Não choveria mais.
Prepararei um caminho no deserto e porei rios no ermo. O nosso Deus é um Deus que faz as coisas mais improváveis, as mais impossíveis, em favor do cumprimento de Seu projeto com o Seu povo. Afinal, imagine o que sejam caminhos no deserto. Essa é a coisa mais improvável de você encontrar em um terreno inóspito e, mais que isso, tomado por dunas móveis. Quem mora em Natal ou já conhece Jenipabu sabe o efeito das dunas móveis, como são no deserto. De que adianta construir um caminho ali, se provavelmente amanhã tudo será tomado pela areia? No entanto, Deus fala que tem esses caminhos para nós. Caminhos nos quais Ele nos conduz nas formas mais improváveis e mais impossíveis. Ele faz coisas inesperadas, como fazer cessar uma chuva forte que nos impediria completamente a ação evangelística.
Além disso, Deus sempre age para refrigerar a alma de Seu povo. Prometendo que abrirá caminhos no deserto para que Seu povo passe, de volta à terra da promessa, promete também que esse povo terá um suprimento para matar a sede. Ele fará uma outra coisa ainda mais surpreendente, ainda mais impossível: porá rios no ermo. Além de mostrar o caminho até o mar (rios sempre correm para o mar), esses rios são fonte de vida.
Essas coisas nos ensinam que podemos ter sempre confiança em Deus. Confiança por saber que Deus tem sempre a solução, mesmo quando parece, quando tudo indica, que não há mais solução. Quando a solução é impossível. Quando o jogo chega aos 44 do segundo tempo. Ainda aí, podemos ter confiança que Deus é poderoso para solucionar o pior dos problemas. E agir tornando real o que de mais impossível possa parecer existir.
A ação de Deus é uma ação de refrigério. Deus refrigera a alma do Seu povo por meio de Sua ação libertadora. O povo pode sair da dor do passado e receber o consolo e a alegria do Senhor no presente. Este Senhor que mostra o caminho no deserto, caminho para o futuro. Este povo, que vivia na escuridão, na região da sombra da morte, e pode encontrar a vida, porque uma luz brilhou sobre ele. Porque já nasceu uma criança, Deus nos mandou um menino que será o nosso rei. Ele será chamado de “Conselheiro Maravilhoso”, “Deus Poderoso”, “Pai Eterno”, “Príncipe da Paz”. Porque Jesus nos nasceu e Deus pode nos preparar um caminho no deserto, rios no ermo.

11.5.05

Coisa nova

Pois agora vou fazer uma coisa nova, que logo vai acontecer,e, de repente, vocês a verão.
Isaías 43. 19

Israel era um povo que adorava reclamar. Nunca estava satisfeito com coisa alguma. Sempre se voltava contra Moisés no deserto, acusando-o, não sei bem de quê. A insatisfação era a marca registrada daquele povo. Então, veja só, apenas passados dois meses após ter sido libertado da escravidão no Egito, o povo se voltou contra Moisés e seu irmão Arão: Teria sido melhor que o Senhor tivesse nos matado no Egito! Lá, nós podíamos pelo menos nos sentar e comer carne e outras comidas à vontade. Vocês nos trouxeram para este deserto a fim de matar de fome toda esta multidão (Ex. 16. 3). Que povo ingrato! O Senhor lhe devolveu a liberdade, está lhe conduzindo para uma terra que será toda dele e ainda encontra tempo para reclamar contra o Senhor. Mas por Deus ser paciente com Seu povo é que essa história introduz o aparecimento do Maná no deserto.
O Maná [O que é isso?] tinha umas regras e uns sentidos interessantes. Representava, acima de tudo, o cuidado de Deus por Israel durante a caminhada do deserto. Tanto que, tão logo o povo entra em Canaã e pode colher com suas próprias mãos o que comer, diz a Bíblia, cessa o Maná. O Maná é a presença da Graça de Deus no meio dos momentos mais complicados de um povo que, tantas vezes, era tremendamente complicado. Mas esse povo, que carregava o nome do Senhor, precisava se alimentar e precisava aprender a depender da Graça. Daí, o Maná.
As regras acerca do Maná eram muito interessantes. E essas regras querem ensinar umas coisas curiosas. Todas as manhãs, à exceção da manhã de sábado, Deus faria chover Seu pão do céu. O suficiente para cada um. Ninguém teria demais, ninguém teria de menos. Nenhum israelita poderia tentar colher mais do que precisava, a fim de guardar para o dia seguinte. Se assim fizesse, a porção colhida apodreceria. E, para ninguém pensar que esse alimento seria “natural”, no sábado não haveria o Maná. Então, na sexta-feira, e apenas na sexta-feira, o povo poderia colher a porção dobrada para guardar para o dia seguinte. E essa porção não apodreceria. Para completar o quadro sobrenatural do Maná, mais à frente, após a construção da Arca, uma porção dele é guardada como testemunho acerca do cuidado do Senhor dentro dela.
O relato do Maná me ensina que a graça de Deus é para cada dia. Eu não posso tentar levar para amanhã aquilo que vivo com Deus hoje. A cada dia é preciso vivenciar e experimentar uma nova porção da Graça de Deus, da comunhão com Ele. Do mesmo modo, Ele é Deus que faz novas todas as coisas. Nossa relação com o Pai, por meio de Jesus, nas duas vias, indo a Ele e vindo dEle, é uma relação que se renova todas as manhã. Tudo se faz novo. Tudo se renova.
Pois agora vou fazer uma coisa nova, que logo vai acontecer,e, de repente, vocês a verão. O Deus que vence o passado é o mesmo que nos avisa que sempre faz coisas novas. Deus não é caduco, não se agarra às velhas estruturas, às velhas posturas, aos relacionamentos de ontem. Deus faz novas todas as coisas. O nosso problema, às vezes, é de visão. Enquanto Deus quer fazer e está fazendo coisas novas, muitas vezes ficamos desatentos e não conseguimos ver isso, porque queremos continuar olhando para ontem. O resultado é sermos surpreendidos quando essa novidade aflora, “de repente”, diante de nossos olhos. Às vezes, como não estamos preparados, a rejeitamos. Mesmo que seja uma novidade promovida pelo próprio Deus. Ela é tão surpreendente, nos surpreende a tal ponto, que corremos o sério risco de não percebermos que é fruto da ação da Graça de Deus. Foi Deus quem fez, mas foi tão novo e tão “repentino”, que nos quedamos perdidos e surpresos.
Pois agora vou fazer uma coisa nova, que logo vai acontecer,e, de repente, vocês a verão. Deus faz sempre coisas novas. Ele não é caduco, as coisas dEle sempre se renovam. É o homem quem tenta manter tudo como está, manter tudo envelhecido. O Espírito de vida e de Graça de Deus é Espírito de novidade.
Além de ações novas, Deus faz um povo novo. Ele toma Seu povo e o faz de novo. Ele nos toma em Suas mãos e nos faz de novo. A profecia de Isaías se refere à volta do cativeiro babilônico. Um povo, um Israel, vai para o cativeiro por causa dos seus pecados, de sua idolatria. É outro povo que volta de lá. É um povo renovado. É um povo refeito. Depois desse retorno, nunca mais a idolatria que condenou Israel voltou a ser praticada. Deus fez um Povo novo. E Deus continua a fazer isso por meio de Jesus Cristo, como bem diz Paulo aos Coríntios, em texto que já citei ontem: Quem está unido com Cristo é uma nova pessoa; acabou-se o que era velho, e já chegou o que é novo (2 Co. 5. 17). Deixe o Espírito de novidade do Senhor fazer diferença em sua vida e em seu coração.

10.5.05

Vitória sobre o passado

Não fiquem lembrando o que aconteceu no passado, não continuem pensando nas coisas que fiz há muito tempo.
Isaías 43. 18

Isaías escreve uma nova história a partir do capítulo 40. Até ali, sua palavra é uma dura condenação contra o pecado dos judeus e demais nações. O capítulo 40 começa com o Senhor dizendo que agora é preciso falar uma palavra diferente. É preciso consolar o povo do Senhor. E Deus começa a contar a nova história de reconstrução, de restauração ao Seu povo amado. Afinal, por mais que o povo tenha pecado e tenha sofrido o castigo, pai e mãe poderiam abandoná-lo, mas o Senhor jamais faria isso.
Nesse contexto Deus dirige uma palavra acerca do fim do cativeiro e da opressão na distante babilônia. O cerne da mensagem é afirmar que o Senhor de Israel não permitirá que aquele castigo se estenda além do que deve. Em breve, Deus fará coisas novas para tirar Seu povo da opressão e trazê-lo de volta à sua terra. Mas esse processo implica e se realiza por meio de algumas coisas.
A primeira afirmação do texto que destacamos é que Deus cura as memórias e vence o passado. Não fiquem lembrando o que aconteceu no passado. Ficar preso às lembranças, ao passado, é caminho certo para a obsessão doentia. Tantas vezes Deus já começou a desfazer tudo e a fazer outras coisas, e nós perdemos a visão, a capacidade de contemplar o presente e prenunciar o futuro, porque nos prendemos a um passado. Passado de dor e sofrimento. De mágoas e ressentimentos. De feridas e dores. As pessoas nos fizeram mal e nós gostamos de remoer isso para não deixar a mágoa, o desejo de vingança, a tristeza se apagarem em nós. Nós realimentamos os nossos sentimentos. Nós promovemos o ressentimento.
Então nosso coração se comporta como um campo minado. E cada ferida se torna, em nós, uma potente e explosiva mina, que mais cedo ou mais tarde, terminamos detonando em nossa própria face. E a tragédia resultante da explosão destas minas de ressentimentos ainda produz um efeito mais devastador. Porque não é provocada por qualquer agente externo. Ninguém nos fere. Apenas ferimos a nós mesmos. Mas não tardaremos a culpar alguém e a replantar a mina do ressentimento em nosso peito. Ficar preso a essa obsessão da dor do passado é um caminho de destruição. Ciclo vicioso de eterno retorno, prisão dentro de uma serpente que morde o próprio rabo.
Mas não são só as coisas ruins que devemos superar. O Senhor diz: não continuem pensando nas coisas que fiz há muito tempo. Ninguém vive da bênção de ontem. Nostalgia também é sentimento fatal, porque trava os nossos passos em direção ao futuro. A saudade das coisas que Deus fez ontem nos impede de caminhar na direção daquelas que Ele quer fazer amanhã. A saudade do Deus de ontem nos empurra atrás de um tempo que não volta, quando, na verdade, Deus quer nos levar para vidas novas, lugares novos, realidades novas.
Eu costumava dizer que o melhor ano de minha vida com Deus tinha sido o ano 2000. E morria de saudade daqueles dias. Até que percebi que aquele ano não voltará, que minha vida com Deus precisa ser firmada aqui, hoje, 10 de maio de 2005. É hoje, é agora, que preciso quebrar meu coração na presença do Senhor, buscando a Sua face. É agora que preciso ter fome e sede do Senhor. É agora que preciso buscar e viver na Sua intimidade. E essa intimidade será completamente diferente daquela de cinco anos atrás, porque eu não sou mais o mesmo. Meus sonhos não voltarão a ser mais os mesmos, a ação de Deus não poderá ser a mesma. O tempo passou. O passado é, agora, realmente passado. As coisas ficaram para trás.
A Palavra viva de Deus quer fazer uma coisa nova na sua vida. Em Cristo. Quer fazer sua vida nova, quebrando os laços da nostalgia e da obsessão. A Palavra de Deus é vida que gera coisas novas na vida: Não fiquem lembrando o que aconteceu no passado, não continuem pensando nas coisas que fiz há muito tempo. Deixe o passado no passado, nas mãos de Deus. Caminhe para o futuro, lançando-se sempre nos braços de Jesus. Deixe Deus fazer tudo novo na sua vida, especialmente fazer nova a sua vida. Entregue-se à fé íntima e ao relacionamento pessoal com Aquele que morreu em uma Cruz por você, para fazer tudo novo. Quem está unido com Cristo é uma nova pessoa; acabou-se o que era velho, e já chegou o que é novo (2 Co. 5. 17).

9.5.05

Requisitos

Deus aceita as pessoas por meio da fé que elas têm em Jesus Cristo.
Romanos 3. 22

Parece que, independente de para onde nos viramos, sempre encontramos nas instituições sociais com as quais nos deparamos na vida a exigência de requisitos para aceitação. Quando eu passei na seleção do mestrado no ano passado uma das coisas que mais via como necessária era me qualificar para receber uma bolsa para estudo. Eu tinha decidido, independente de qualquer coisa, que iria apenas estudar, sem trabalhar, mesmo que no fim do mês minha renda fosse zero. Não via como fazer o mestrado e trabalhar ao mesmo tempo. Mas os requisitos para conseguir a bolsa eram muito severos. Não bastava apenas querer. Primeiro, era preciso haver bolsas disponíveis. Graças a Deus, havia. Mas eu precisava passar na seleção e passar bem colocado. O meu programa dispõe de poucas bolsas e o principal critério de seleção é a colocação na seleção. Fiquei em quinto lugar. Entre os demais candidatos que terminaram à minha frente, dois dispensaram as bolsas porque tinham emprego fixo e, por isso, não atendiam os requisitos. Ainda assim, só haviam duas bolsas. Isso significava que eu ia ficar sem. Só que, a um dia do prazo final para cadastro de bolsas, o departamento descobriu que havia uma bolsa da CAPES que não estava sendo usada e ia ser passada para outro programa de mestrado. Ligaram-me e em um dia providenciei tudo para ficar com aquela bolsa de estudos. Bênção de Deus que tem me dado a tranqüilidade para fazer o mestrado.
Eu consegui a bolsa, mas não bastou querer a bolsa. Eu tive que atender aos critérios, o principal deles relacionado com a minha posição na classificação. Além disso, não podia ter emprego fixo, com carteira assinada, já que a bolsa exige dedicação exclusiva. Como a maior parte das instituições em nossa sociedade, a concessão de bolsas de estudos requer o atendimento de requisitos fundamentais.
As coisas com Deus são mais simples. Não existem muitos requisitos para alguém ser aceito na presença de Deus, apesar do que parecem acreditar alguns movimentos religiosos por aí. Você não precisa de penitências, de uma cota de sofrimento, de sua freqüência nos cultos, de um número indefinido de reencarnações. Você não precisa pagar nada, você não precisa fazer coisa alguma. Não existem critérios difíceis e excludentes, como no caso de tentar conseguir bolsas de estudos.
Para estar na presença de Deus e ser aceito por Ele só há um requisito. Para poder ser aquele homem bem-aventurado que mora na casa do Senhor todos os dias da vida, quer dizer, que vive em Sua presença desde agora até a eternidade; para poder ser esse ser humano que, aceito por Deus, descobre o melhor e mais seguro lugar do mundo, o centro da Sua vontade, só é preciso uma coisa. Não é preciso grandes somas em dinheiro, grandes doses de sacrifício, ou grande ativismo religioso. O único requisito para darmos início ao nosso relacionamento íntimo com Deus é muito claro na Bíblia: Deus aceita as pessoas por meio da fé que elas têm em Jesus Cristo.
Deus não aceita as pessoas com base em sua conta bancária, em sua formação cultural, em sua inteligência, em seu sexo, em sua religiosidade. Deus não aceita as pessoas com base nas coisas que elas fazem, deixam de fazer, ou poderiam fazer. Não. O único critério, o único requisito, para a aceitação de Deus é a fé em Jesus. As instituições, mesmo as religiosas, podem estabelecer outros requisitos para aceitação das pessoas, mas o único requisito que pode fazer o ser humano se achegar à presença de Deus e dar início à sua caminhada pela eternidade no centro de e no aprendizado da Sua vontade é sua fé na pessoa, na vida, na morte e na ressurreição de Jesus. Esse requisito quebra toda barreira, destrói todo obstáculo e constrói nova dimensão de vida e compromisso com Deus.
Jesus nos convida sempre. O convite de Jesus é para que sejamos os bem-aventurados que caminham com Ele, aprendendo dEle, crescendo com Ele, no centro da Sua vontade, fundamentados no maior e mais importante de todos os critérios: Deus aceita as pessoas por meio da fé que elas têm em Jesus Cristo.

8.5.05

Um violinista

Bem-aventurado o homem cuja força está em Ti, em cujo coração se encontram os caminhos aplanados, o qual, passando pelo vale árido, faz dele um manancial; de bênçãos o cobre a primeira chuva.
Salmo 84. 5 – 6

Adoro cinema. No dia das mães resolvi homenagear todas as mães de minha casa promovendo uma sessão de cinema com aquele que é, provavelmente, o filme mais fantástico que já assisti na vida. Um violinista no telhado, musical de 1971. Existem muitos coisas que poderiam ser ditas acerca desse filme mas, logicamente, o que mais me toca e chama a atenção é a metáfora do violinista no telhado. Na primeira seqüência, que também é o primeiro número musical, o protagonista Tevye apresenta-nos o violinista no telhado. Tevye é um pobre leiteiro de um pequeno vilarejo na Rússia Czarista. Membro de uma comunidade judaica, Tevye nos explica que o fundamento da existência de sua comunidade são as tradições. As tradições põem tudo nos seus lugares. As tradições explicam os papéis que cada um deve assumir na comunidade: o mendigo, a casamenteira, o açougueiro, o rabino e, claro, o pobre leiteiro e sua família. Ele pode até não poder explicar o sentido de cada tradição, como acontece ao fato de que todos os homens usam chapéu sempre (Tevye diz: Você deve estar querendo saber porque usamos chapéu. Eu vou contar... eu não sei), mas a comunidade sabe que sem as tradições a vida seria tão instável quanto o violinista que tenta se equilibrar nos telhados das casas, enquanto executa um número musical.
O violinista, como se fosse uma parte da consciência de Tevye, está sempre presente em todo o filme. E o violinista, o próprio Tevye, começa a abrir espaço para a quebra de muitas tradições no meio da comunidade. As quebras começam quando cada um começa a questionar os motivos e as razões de suas ações. A conscientização do seu próprio ser desafia as estruturas fossilizadas que sustentam, um tanto superficialmente, a comunidade judaica naquele pequeno vilarejo. Em um determinado ponto do filme, Tevye conclui que o que agora é tradicional um dia foi novidade. Quer dizer, descobrir que toda tradição tem um início abre espaço para que venha o novo.
Quando assisto este filme penso que nosso papel no mundo é ser como o violinista no telhado. Porque o nosso Deus é Aquele que faz novas todas as coisas, sempre, em todo tempo, cada manhã. Precisamos ser violinistas que não se permitam assumir tradições que sejam sem significado para nós, tradições que se fossilizam, não permitindo a emergência do novo. Como violinistas, tocando sobre os telhados, tomamos consciência de nossas ações, de nossos compromissos, de nossa vida, abrindo o coração sempre para que todas as coisas possam se renovar. Aprendemos a instabilidade de ser do Espírito, aquele vento que sopra onde quer, como quer, na direção que quer. Não dá para formalizar, para estabilizar, para transformar em tradição o livre fluir do Espírito de Deus. Não dá para controlar a ação de Deus.
Bem-aventurado o homem cuja força está em Ti, em cujo coração se encontram os caminhos aplanados, o qual, passando pelo vale árido, faz dele um manancial; de bênçãos o cobre a primeira chuva. Bem-aventurado o violinista no telhado. Aquele que em intimidade com Deus recebe dEle vida para levá-la aonde for. Que transforma as estruturas fossilizadas por tradições mortas em manancial. Aquele que tem sua força no Senhor e leva a bênção do Senhor a todo deserto onde chega. Bem-aventurado aquele que, andando com o Senhor, descobre que a vida realmente só vale a pena quando se vive pelos telhados, tocando o seu violino. Quem se dá bem na aventura da vida, quer dizer, o bem-aventurado, é aquele que descobre o Deus que abençoa, enche de vida no Espírito, não sem propósito, mas para que cada um, como um tocador que leva sua música ao mundo, vá até lá para fazer diferença, para levar vida, para ser canal do renovo, da graça, para levar alegria, para transformar. O violinista no telhado aquele que descobre que Deus nos abençoa unicamente para que sejamos bênção e, assim, levemos a Sua bênção a mais e mais pessoas. E, desse modo, ajudar a matar as tradições de morte e abre espaço para que venha o novo da vida. Por isso, o violinista no telhado, passando pelo vale árido, faz dele um manancial; de bênçãos o cobre a primeira chuva.