18.6.05

Martas e Marias

Marta, Marta, você está agitada e preocupada com muitas coisas, mas apenas uma é necessária! Maria escolheu a melhor de todas, e esta ninguém vai tomar dela.
Lucas 10. 41 – 42

Uma só tem sido a temática que tenho pensado nos últimos dias: o chamado à intimidade e comunhão com Deus. Tenho sido repetitivo, constante no falar sobre isso, porque acredito que não existe nada mais profundo e necessário para cada um de nós. Muitas vezes tenho me incomodado com a nossa facilidade em colocarmos outras coisas como mais essenciais ou fundamentais em nossa vida. Uma só coisa importa de verdade e fará muita diferença para a maneira como vivemos e encaramos a vida, caso a assumamos de fato. O mais precioso é sentar-se aos pés de Jesus, ouvir e aprender dEle, curtir a Sua comunhão e intimidade. Essa é a parte que permanece e que nunca nos será tirada.
Jesus chega à casa de Marta e Maria, onde se hospeda. E começou a ensinar. Maria, sedenta por ouvir a Palavra de Deus em Jesus, não perde tempo e se senta aos pés do Mestre. E fica ali, curtindo o momento na presença do Senhor. Marta, pensando nas necessidades que o Mestre e os Seus seguidores possivelmente teriam, não sai da cozinha por coisa alguma. Pouco a pouco, a atitude de sua irmã vai lhe consumindo por dentro, vai lhe incomodando. Não é justo só ela trabalhar, enquanto a irmã fica ali, aproveitando a comunhão com Jesus. Não podendo mais se controlar, Marta estoura: O Senhor não se importa que a minha irmã me deixe sozinha com todo este trabalho? Mande que ela venha me ajudar (Lc. 10. 40).
Parecia bastante lógico. Havia muito trabalho na casa, trabalho, diga-se de passagem, para o serviço de Jesus. Ele era hospede daquele lar, era preciso arrumar tudo, fazer comida. Tudo para Ele. Todas as coisas, toda a ação, era para Ele. Mas tudo estava concentrado em Marta, já que Maria estava sentando, ouvindo o ensino de Jesus. Parecia lógico que Marta suplicasse ao Mestre que mandasse Maria lhe ajudar.
Pareceria lógico, se o embate aqui não fosse entre a comunhão com Jesus, de um lado, e o ativismo, de outro. O que seria mais importante: trabalhar para Jesus ou usufruir a Sua comunhão e intimidade? Maria escolheu a melhor parte, porque do que adianta servir a Jesus se não gozarmos a Sua intimidade?
Marta, Marta, você está agitada e preocupada com muitas coisas, mas apenas uma é necessária! Maria escolheu a melhor de todas, e esta ninguém vai tomar dela. A melhor coisa de todas é desfrutar da companhia do Senhor, de Sua intimidade, de Seu ensino em comunhão. Essa é a única coisa necessária: andar com Jesus! Nenhuma atividade pode substituí-la. Não adianta viver tão ativamente sem que, primeiro e necessariamente, invistamos a nossa vida inteira no sentar-se na presença de Jesus e gozá-la.
O problema é que, na maior parte do tempo, somos Martas quando deveríamos ser Marias. A única coisa necessária foi a parte que Maria escolheu e não lhe será tirada. Somos Martas que nos preocupamos com diversas coisas distintas e importantes, deixando de lado a única que é fundamental e necessária em nossa vida com Deus: comunhão e relacionamento íntimo. Essa é a única coisa que pode permanecer.
Martas, no seu ativismo, esquecem que a verdadeira vida cristã nasce na dimensão do andar com Deus. Do andar com Jesus. Sem isso, corremos o risco de vivermos vidas cristãs aparentes, porque, sem comunhão com Deus, não o conheceremos de verdade. Na aparência, seremos bons cristãos. No coração, nem conheceremos a Deus. Eles dizem que conhecem a Deus, mas o que eles fazem mostra que isso não é verdade. Estão cheios de ódio, são rebeldes e não são capazes de fazem nenhuma coisa boa (Tt. 1. 16).
Lutero era alguém consciente dessa realidade. Ele registrou em seus diários que, nos momentos em que ele tinha mais coisas a fazer e que as necessidades de ação eram mais prementes, ele necessitava orar mais. Nos dias mais atarefados, Lutero dizia que era incapaz de trabalhar sem que passasse pelo menos três horas em oração. Na vida dele, quanto mais atividades fosse preciso realizar, mais tempo era preciso passar usufruindo a companhia e a intimidade de Jesus. Se não fosse assim, o ativismo tornaria sua vida cristã pura aparência. A fonte da vida com Cristo é a necessidade de andar com Cristo intimamente.
Comunhão e intimidade. As coisas necessárias para a vida cristã. As únicas. Por isso, são os desejos que mais tomam a minha mente e o meu coração nos últimos dias. O Senhor nos deseja aprofundando a nossa vida cristã a partir do aprofundamento de nossa vida na comunhão com o Senhor. Se não andarmos com Jesus, nossa vida será aparência. Mesmo que digamos que conhecemos a Jesus, nossos atos vão provar que mentimos.
Por isso, o desafio do Senhor é que deixemos de ser Martas e passemos a ser Marias. Escolhendo a melhor parte, sentar com o Senhor, aprender com Ele, gozar da Sua intimidade e fluir na Sua vida. Esta é a única coisa que nos é necessária.

17.6.05

Sobre bênçãos

Eu afirmo a vocês que isto é verdade: vocês estão me procurando porque comeram os pães e ficaram satisfeitos e não porque entenderam os meus milagres.
João 6. 26.

O que você está procurando em sua relação com Deus? O que fundamenta seu compromisso com Jesus? O capítulo 6 do evangelho de João é muito interessante. Pouco depois de ter efetuado o milagre de multiplicar pães e peixes para alimentar uma multidão, Jesus é procurado ansiosamente por essa mesma multidão. Os discípulos atravessaram mais cedo o lago, Jesus foi mais tarde, andando por sobre as águas. No outro dia, pela manhã, o povo não consegue entender como Jesus chegou ali, já que só havia um barco e todos viram que Jesus não embarcara nele. Eu afirmo a vocês que isto é verdade: vocês estão me procurando porque comeram os pães e ficaram satisfeitos e não porque entenderam os meus milagres.
Nos cultos de minha igreja, tradicionalmente, temos um momento de oração por problemas pessoais. Convidamos os irmãos para virem à frente, a fim de que se façam orações em favor das causas que estão sendo postas nas mãos do Senhor. Muitos irmãos têm pedido e alcançado milagres de Deus. Muitos irmãos têm buscado ansiosamente milagres. Mas o que será que nos motiva nessa busca?
Nossa igreja, também, possui um culto de segunda a sexta, ao meio dia, chamado Culto do Refrigério. A igreja é bem localizada no centro de Natal e a idéia deste culto é abrir um espaço para alcançar as pessoas que trabalham e se deslocam pelo centro da cidade. Nesse culto, muitos são os que procuram, ansiosos, um milagre de Deus.
Querer milagres não é problema. O problema é reduzir a vida com Cristo aos milagres que desejamos e que Cristo nos dá. Somos, muitas vezes, como aquela da multidão que não buscava Jesus, mas sim os milagres que o Senhor era capaz de produzir. Eu afirmo a vocês que isto é verdade: vocês estão me procurando porque comeram os pães e ficaram satisfeitos e não porque entenderam os meus milagres. O sentido dos milagres sempre foi e sempre será revelar a glória de Deus e conduzir o homem a uma relação mais íntima e pessoal com o Senhor Vivo. Estamos nos esquecendo e desconhecendo este sentido. Olhamos as mãos que nos abençoam e os bens que nos são dados, enquanto temos esquecido o Abençoador. Esquecemos que Deus é, realmente, galardoador, mas é galardoador dos que O buscam. O fundamental é buscar o Senhor e o entendimento da Sua comunhão e intimidade.
É disso que fala o restante do capítulo 6. Não trabalhem a fim de conseguir a comida que se estraga, mas a fim de conseguir a comida que dura para a vida eterna. Não devemos nos esforçar pelas bênçãos fugazes e passageiras em primeiro lugar, como se essas bênçãos fossem capazes de fundamentar nossa relação com Deus. O que Jesus requer é que creiamos nEle, que é o Pão do Céu, que dá vida ao mundo. Nossa relação com Jesus há de se fundamentar em acreditarmos que Ele é Quem alega ser: Aqui está o Pão do Céu; e quem comer desse Pão nunca morrerá (...) se vocês não comerem a carne do Filho do homem e não beberem o seu sangue, vocês não terão vida (Jo. 6. 50 e 53).
Comer e beber de Jesus é manifestação da comunhão mais íntima inimaginável com Ele. É parte de uma entrega absoluta a um relacionamento profundo e transformador com o Deus Triúno. É tomar parte do ser e da natureza de Deus, através dessa relação de profunda intimidade.
Quem participa do ser e da natureza de Jesus é quem pode ter vida plena e abundante. É quem entende que a vida com Deus é mais que os milagres que Ele é capaz de fazer para Sua glória. A vida abundante é resultado da imersão total na presença amorosa dos rios do Espírito Santo e do próprio Jesus. A vida plena é partilhar a natureza de Jesus, partilhar a vida dEle.
Esse chamado radical à profunda e intensa comunhão com Jesus assusta. Nem todos conseguem permanecer quando compreendem a dimensão de tanta radicalidade. O que Ele ensina é muito difícil! Quem pode aceitar esses ensinamentos? (Jo. 6. 60). É um chamado a entendermos o que tem fundamentado a nossa relação com Jesus e, diante disso, percebermos se isto está de acordo com aquilo que o próprio Senhor requer de nós. Nós estamos procurando por Jesus ou por Seus milagres? João diz que muitos seguidores de Jesus O abandonaram depois desses acontecimentos. Jesus, então, se voltou para o grupo dos doze e lhes perguntou se não iriam embora. Quem é que vamos seguir? O Senhor tem as palavras que dão vida eterna! E nós cremos e sabemos que o Senhor é o Santo que Deus enviou (Jo. 6. 68).
O que você está procurando em sua relação com Deus? O que fundamenta seu compromisso com Jesus? O desejo de meu coração é que cada um de nós possa, com convicção, assumir para si a resposta de Pedro. E possamos compreender que nossa busca e nosso anseio precisam ser por Jesus e não por aquilo que Ele pode nos fazer. Ele é a Fonte de Nossa Vida. O Pão do Céu, de Quem devemos comer a carne e beber o sangue, em comunhão preciosa, todos os dias.

16.6.05

Vida

Homem mortal, profetize para o vento. Diga que o Senhor Deus está mandando que ele venha de todas as direções para soprar sobre esses corpos mortos a fim de que vivam de novo.
Ezequiel 37. 9.

Um cadáver pode ser um corpo humano perfeito. Todos os órgãos inteiros. O organismo, perfeitamente funcional. Você pode olhar um corpo em um caixão e se perguntar como pode estar sem vida se é tão perfeito.
Ezequiel foi levado a mais de uma de suas visões. Viu um vale repleto de ossos sequíssimos. O Senhor lhe perguntou se acreditava que aqueles ossos poderiam reviver, ao que o profeta respondeu que somente Deus seria capaz de responder a essa questão. Então, Deus lhe mandou profetizar àqueles ossos para que voltassem à vida.
Ossos se juntaram a ossos, neles cresceram carne, nervos, pele, cabelos. Enfim, os corpos se reconstruíram. Eram, novamente, corpos humanos perfeitos e perfeitamente funcionais. Mas continuavam mortos. Faltava-lhes alguma coisa essencial para que voltassem à vida. Homem mortal, profetize para o vento. Diga que o Senhor Deus está mandando que ele venha de todas as direções para soprar sobre esses corpos mortos a fim de que vivam de novo. Faltava que soprasse sobre eles o Vento.
É imediata a relação dessa história com a criação do homem. Deus tomou a terra, montou o corpo de Adão, o fez perfeito. Mas Adão estava morto até que o Senhor lhe deu o Seu Vento, o Seu Sopro: Então, do pó da terra, o Senhor formou o ser humano. O Senhor soprou no nariz dele uma respiração de vida, e assim ele se tornou um ser vivo (Gn. 2. 7).
Essas duas histórias nos mostram que é bem possível que o formalmente perfeito não possua qualquer vida de verdade. As estruturas de nossa vida, ou mesmo a própria vida, podem parecer perfeitas à nossa vista, como era perfeito o corpo de Adão ou aqueles corpos reconstruídos no vale, mas, ainda assim, estarem mortos. A forma perfeita não é garantia de vida real. Só o Vento do Espírito pode infundir a vida verdadeira.
Muitas vezes, vivemos boas vidas. Formalmente perfeitas. Na casca, está tudo muito bem. Mas são vidas vazias de conteúdo porque lhes faltam a respiração de vida que somente o Vento de Deus pode trazer. As vidas e as coisas em nossas vidas têm tudo para serem perfeitas, mas falta-lhes algo essencial para que suas estruturas funcionem em plenitude. Tudo pode parecer funcional, mas não funcionar. Porque é preciso experimentar o sopro do Vento do Espírito. É preciso nascer, renascer no Espírito e na água. Nascer o nascimento que Deus nos dá, do alto, pela ação do Vento.
Esse é um duplo desafio. Alguns de nós jamais experimentaram qualquer nascimento do Espírito, fundamental para um relacionamento com Deus. Andam por aí, de lá para cá, sem conhecer, de verdade, o Deus vivo que se revelou em Jesus Cristo. Sem salvação, sem coração, sem vida de verdade. Esses são como Adão, corpo morto sem a vida de Deus.
Outros, no entanto, já experimentaram algo desse novo nascimento, mas deixaram a vida ir embora. Assemelham-se ao vale de ossos secos, reconstituídos mas ainda mortos até que recebam o Sopro de Vida do Espírito.
Para ambos os grupos, o futuro que Deus deseja é o mesmo. É a vida no Espírito, em profunda comunhão com o Pai. O desejo do Senhor é o novo nascimento no Espírito, é o renascimento para a vida conduzida pelo Vento. É render-se ao Poder do Senhor, à obra de Jesus, a vida plena que Ele quer nos trazer. É abrir o coração para aquilo que Deus quer fazer.
Essa nova dimensão de vida é de uma vida no Espírito. Vida incerta, porque é vida levada pelo Vento. O Vento sopra onde quer, e ouve-se o barulho que Ele faz, mas não se sabe de onde Ele vem, nem para onde vai. A mesma coisa acontece com todos os que nascem do Espírito (Jo. 3. 8). A vida no Espírito é vida de incerteza porque é vida inteiramente conduzida por Deus. E porque os caminhos e os propósitos do Senhor são inalcançáveis para nossas mentes e para os nossos corações. Não sabemos de onde vem, nem para onde vai. Já que o Senhor diz: “Os meus pensamentos não são como os seus pensamentos, e eu não ajo como vocês. Assim como o céu está muito acima da terra assim os meus pensamentos e as minhas ações estão muito acima dos seus” (Is. 55. 8 – 9).
É uma decisão, mas uma decisão simples. A escolha é toda nossa se permanecemos mortos, ainda que perfeitamente funcionais, ou se vamos clamar que o Espírito venha sobre nós, como Vento, como Sopro, para nos fazer reviver e viver a vida na dimensão da Sua Vontade. Rendido a Ele, em comunhão plena com Ele.

15.6.05

Consagrado

Pois, quanto à lei, estou morto, morto pela própria lei, a fim de viver para Deus. Eu fui morto com Cristo na cruz. Assim já não sou eu quem vive, mas Cristo é quem vive em mim. E esta vida que vivo agora, eu a vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e se deu a si mesmo por mim.
Gálatas 2. 19 – 20

Conta-se que Dwight Moody, grande evangelista do século XIX, certa vez ouviu um pregador dizer que ninguém pode imaginar o que Deus pode fazer através de um homem totalmente consagrado a Ele. Incomodado com aquele desafio, Moody recolheu-se em oração, dedicando-se inteiramente ao Senhor: Eu quero ser esse homem, disse. A partir dali, cerca de meio milhão de pessoas tomaram decisões pessoais para seguir a Jesus através da pregação e do ministério de Moody.
Falando aos Gálatas, Paulo nos ensina sobre esse nível de consagração ao qual Moody sentiu-se desafiado a se entregar. Pois, quanto à lei, estou morto, morto pela própria lei, a fim de viver para Deus. Eu fui morto com Cristo na cruz. Consagrar-se a Deus, entregar-Lhe a vida, é morrer. Consagração é morte. Essa é a imagem que o Antigo Testamento traz acerca do holocausto. No holocausto, o animal era morto e inteiramente queimado no altar de Deus. O holocausto representava a consagração total do adorador ao Deus vivo a quem cultuava. Holocausto é a entrega absoluta e total da vida, sem questionamentos e sem ponderações, ao Deus vivo. Holocausto era morte. E aquele que está inteiramente consagrado à vontade de Deus, não tem vontade ou vida própria. Está morto, para si, para a Lei, para os pecados, para o mundo. Consagração é, pois, a morte da vida sem Deus.
E por ser morte, por se estar morto ao se entregar inteiramente a Jesus, passa-se a viver uma vida em que não há mais condenação e em que o pecado não pode dominar mais. Vive-se para Deus.
Ainda assim, no entanto, o homem consagrado continua pecador. Ainda peca, mas caminha em uma nova dimensão. Consagrado, ama cada vez mais a santidade do Senhor e odeia cada vez mais o próprio pecado. E nesse processo, vai sendo, na intimidade do Senhor, transformado de glória em glória pelo Espírito. Vai se tornando mais semelhante àquela santidade que ama, ao mesmo tempo que vai se tornando mais consciente da sujeira e do quanto necessita de graça e de perdão de Deus. Ama ainda mais a santidade. Odeia ainda mais o pecado.
Nessa consagração, que conduz à santidade, a vida se confunde. Assim já não sou eu quem vive, mas Cristo é quem vive em mim. E esta vida que vivo agora, eu a vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e se deu a si mesmo por mim. Agora, é Cristo Quem vive em nele. Está morto. A única vida que pode, então, viver é a vida que Cristo passa a viver através dele.
Este homem consagrado não é mais que puramente instrumento, vaso, canal. É um escravo sem vontade, sem sonho, sem planos pessoais. É um escravo, sujeito à vontade de Deus, cujo único anseio e única vontade é servir a Cristo. O único desejo é ser canal do fluir, da graça, da bênção e da presença gloriosa de Deus por meio do Espírito Santo. O seu prazer é usufruir a presença do Senhor. Ele não escolhe com tristeza e com dor fazer a vontade de Deus. Antes, é o seu prazer. Sonhos, planos e desejos pessoais, mortos pela consagração, não podem se comparar com o prazer de viver na presença do Deus santo e de ver a Sua Vontade se cumprindo na própria vida.
Deus ainda está buscando homens e mulheres que estejam dispostos a morrer, se entregando a uma consagração absoluta a Ele. Consagração que é morte de uma velha vida e entrega total ao prazer de ser apenas um canal para que Cristo viva através de nós. E para que se realize o plano dEle em nossas vidas e no mundo em que vivemos. Ainda não somos capazes de imaginar o que Deus pode fazer por meio de alguém inteiramente consagrado a Ele.

14.6.05

Misticismo

Pois em Cristo, como ser humano, está presente toda a natureza de Deus, e, por estarem unidos com Cristo, vocês também têm essa natureza.
Colossenses 2. 9 – 10

Há uma idéia constante em toda a carta de Paulo aos Colossenses. Trata-se da noção de que toda a plenitude de Deus está em Cristo Jesus. Em outras palavras, Paulo afirma e reafirma à igreja em Colossos que Jesus é o próprio Deus, plenamente poderoso, agindo em favor deles e em seu meio.
O mais fantástico, no entanto, para mim, é que em toda carta também Paulo está chamando os cristãos a disporem seus corações para uma vida de real intimidade com Jesus. E a dimensão dessa comunhão é tão intensa que dificilmente não notaremos que, para Paulo, Cristo e o cristão, estando em relação, fundem-se como se fossem uma só pessoa. Pois em Cristo, como ser humano, está presente toda a natureza de Deus, e, por estarem unidos com Cristo, vocês também têm essa natureza.
Esta idéia é o fundamento de qualquer tipo de misticismo cristão firmado nas Escrituras. A noção de que Deus está nos chamando para partilhar, em Cristo, de Sua vida, de Seu poder, de Sua natureza, de Sua glória. E este chamado não se reserva a alguns poucos privilegiados e iniciados, mas é a vocação de todo e qualquer cristão. Somos chamados para uma relação de tão profunda intimidade que podemos nos fundir e nos encontrar verdadeiramente ao sermos lançados às profundidades do relacionamento com Deus. Somos a noiva que anseia pela consumação das bodas do Cordeiro. Podemos viver a dimensão desse amor de Jesus por nós.
Paulo instrui acerca de como construir uma relação assim tão pessoal com o Senhor. E essa relação terá quatro pilares. Em primeiro lugar, diz o apóstolo, estejam enraizados nele (Cl. 2. 7). Uma vida mística é um risco constante de engano, engodo e desvio. Podemos ser iludidos e arrastados para muito longe do Senhor, se não tivermos cuidado. Tal coisa tem acontecido e podemos ver todos os dias, em cada cidade brasileira, irmãos e irmãs que, levados por um misticismo cego, vêm se afastando do Deus vivo que se revela nas Escrituras. A nossa única chance de nos mantermos firmes é enraizados em Jesus. Precisamos dedicar nosso coração à leitura, à meditação e ao estudo sério da Bíblia. Precisamos colocar nossa alma na busca pelo entendimento nas Escrituras. Enraizamo-nos em Jesus, tendo nosso prazer na Lei do Senhor e na Sua Lei meditando dia e noite.
Também é fundamental nesse processo não abandonar a comunhão de nossos companheiros de discipulado. Admoestando-nos uns aos outros a permanecermos ligados à Videira Verdadeira, preservaremos nossas almas de tão fatal desvio. É preciso, pois, que estejamos enraizados em Jesus.
A partir disso, podemos obedecer a Palavra que nos instiga: construam sua vida sobre ele (Cl. 2. 7). A lembrança imediata, ao ler esse trecho, é da fala de Jesus: Quem ouve esses meus ensinamentos e vive de acordo com eles é como um homem sábio que construiu a sua casa na rocha. Caiu a chuva, vieram as enchentes, e o vento soprou com força contra aquela casa. Porém ela não caiu porque havia sido construída na rocha (Mt. 7. 24 – 25). Alicerçados em Jesus, podemos construir uma vida que não seja destruída pelas intempéries que abatem e abalam nossa existência. E essa construção se dá quando aprendemos a obedecer os mandamentos de Deus. Nossa vida será firme quando ouvirmos os ensinamentos de Jesus e vivermos de acordo com eles.
A vida cristã é vida prática. Ela se estrutura e se estabelece na ação prática que realiza aquilo que é vontade de Deus. Muitas vezes, temos tido nossas emoções religiosas, temos mantido nosso conhecimento bíblico e acerca de Deus para nós mesmos. Mantemos essas coisas extremamente subjetivas. Elas existem em nós e se perdem em nós. Uma vida assim não está firme. A construção de nossa vida sobre Cristo se dá através da ação prática. Estaremos firmes à medida que transformarmos as tantas coisas que nos marcam subjetivamente na nossa relação com Deus em obras de obediência a Ele, de justiça em favor dos outros e no cumprimento de Seu plano no mundo.
Uma vida firme na Rocha supera e suporta toda luta, toda tribulação, toda angústia e toda dor porque olha para o invisível. Esta vida construída sobre Jesus se segura no barco contra todas as esperanças porque sabe que Deus, por fim, lhe conduzirá a porto seguro. E se tornem mais firmes na fé (Cl. 2. 7). Uma casa estável se sustenta diante de todo terremoto, de toda enchente, de todo abalo. E se mantém firme. Uma vida assim se fortalece na fé. E fortalecida na fé, traduz tudo em gratidão ao Deus que guia a vida: E dêem graças a Deus (Cl. 2. 7).
O chamado à comunhão com Jesus, à intimidade mística com Ele, corre o risco de nos conduzir para bem longe dAquele em Quem encontramos a inteireza da natureza de Deus. Deus nos quer em profunda, íntima e mística comunhão com Jesus. Uma comunhão que nos transforma, que nos impacta e que pode transformar o mundo. Comunhão com Aquele em quem está toda a plenitude de Deus e em Quem podemos gozar essa plenitude e essa presença gloriosa. Mas precisamos estar alertas. Precisamos estar enraizados em Jesus, construir nossa vida sobre Ele, permanecendo firmes na fé e louvando pelo Seu cuidado, Sua direção e Sua bênção em nossas vidas. Sob pena de nos desviarmos para bem longe dAquele que é o prazer de nossas almas.

13.6.05

Sonhos

Só eu conheço os planos que tenho para vocês...
Jeremias 29. 11

Em dezembro do ano passado, fui a Fortaleza acompanhar o culto de formatura daquela que tinha sido minha turma no seminário. Aquele evento foi como uma pá de cal sobre a vida que tinha vivido até o ano de 2002. Aquele culto sepultava em meu coração alguns dos sonhos mais acalentados que eu tinha carregado. Pelo menos os sepultava na forma como eu os via até então. Tinha consciência de que, a partir daquele instante, minha vida seguiria em rumo muito diverso do que havia sonhado antes.
Sonhos humanos podem ser desfeitos ou destruídos. Podem ser enterrados. Podem nunca vir à luz. Porque são frágeis. Porque são parciais. Porque nossas emoções, nossos sentimentos e nossos desejos tendem a ser passageiros. Sonhos humanos podem morrer.
É por isso que gosto tanto deste trecho da carta que Jeremias escreve para os exilados na Babilônia. Jeremias está falando a um povo que viu seus sonhos ruírem, sua vida ser desfeita, seus projetos morrerem. E está dizendo que o seu Deus ainda tem sonhos para eles. O profeta está dizendo que os sonhos humanos podem se desfazer, mas os sonhos de Deus para o Seu Povo permanecem e se cumprem no tempo certo. Só eu conheço os planos que tenho para vocês...
Os sonhos que não morrem são aqueles que se firmam na relação de amor com o Deus vivo. Por isso, é necessário, e realmente a única coisa que importa, que busquemos a comunhão e a intimidade do Senhor. É preciso que disponhamos o nosso coração a buscar a Sua face, inteiramente rendidos diante dEle. Então vocês vão me chamar e orar a mim, e eu responderei. Vocês vão me procurar e me achar, pois vão me procurar de todo coração (Jr. 29. 12 – 13).
Nessa nova relação com nossos sonhos e com nosso Deus, aprendemos a colocar as coisas em seus lugares. O fundamental não é ter sonhos, pois sonhos são fugazes. O fundamental é querer, ansiar, desejar, buscar ardentemente a comunhão e uma vida de intimidade com Deus. Buscar Sua face, ouvir a Sua voz, viver em Sua presença. Diante dessa experiência, vamos perceber que nossos sonhos, mesmos os que se desfazem em nossas mãos, não são tão importantes nem tão fundamentais quanto acreditávamos até agora. O fundamental é mergulhar na intimidade do Senhor, gozá-la, ter nosso prazer na vida com Deus. E, assim, render-se inteiramente para que o próprio Deus possa cumprir em nós os Seus sonhos, eternos e melhores. Podemos experimentar uma nova dimensão de vida a partir da comunhão com Deus, descobrindo no dia a dia as coisas que realmente valem a pena. E descobrindo a alegria de ver os sonhos de Deus se cumprindo em nós.
Eu não sonho mais. Meu único desejo tem sido mergulhar na intimidade do Senhor e esperar que os sonhos dEle para a minha vida encontrem lugar em meu coração e se cumpram de uma maneira maravilhosa. Porque, diz o Senhor, só eu conheço os planos que tenho para vocês...

12.6.05

De verdade

Meus filhinhos, o nosso amor não deve ser somente de palavras e de conversa. Deve ser um amor verdadeiro que se mostra por meio de ações.
1 João 3. 18.

Há um pensamento atribuído aos puritanos dos séculos XVII e XVIII que eu gosto de citar: Grite mais alto porque o que você faz não me deixa ouvir o que você diz. Essa frase traduz um grande problema em nossa cultura ocidental: nós criamos uma separação entre nossos pensamentos e nossas ações. Somos platônicos ao ponto de não termos problema em pensarmos coisas inteiramente opostas às nossas ações.
Isso é extremamente preocupante, especialmente quando nos voltamos para pensar acerca dos elementos distintivos da vida cristã. O maior deles, o amor. Nós somos platônicos em nossa relação de amor. Mantemos nosso amor no âmbito do mundo das idéias e não sabemos, ou não queremos, manifestá-lo em ações práticas. É muito cômodo sermos capazes de apenas dizer que amamos, sem que nossas palavras nos conduzam a nada de muito real e concreto. Falamos, e nossas palavras se limitam a ser apenas palavras.
Na nossa relação com Jesus não podemos nos limitar a isso. Seremos reconhecidos como Seus discípulos pelo amor que nos une. Mas esse amor, do ponto de vista da revelação da Palavra de Deus, não se restringe a frases de efeito, a pensamentos sem maiores conseqüências de ação.
É acerca disso que fala o apóstolo: Meus filhinhos, o nosso amor não deve ser somente de palavras e de conversa. Deve ser um amor verdadeiro que se mostra por meio de ações. Impressiona-me perceber que todas as coisas mais fundamentais reveladas pela Palavra de Deus nos impulsionam à ação. Nada que Deus requer para uma viva relação com Ele fica no mundo das idéias. Todas as coisas, necessariamente, precisam se tornar ação prática. Não se ama de palavras ou conversa bonita. É preciso manifestar o amor na prática.
Para mim, então, é impossível não lembrar da parábola do bom samaritano. Não exatamente da parábola, mas do diálogo que a antecede. Um escriba quer testar Jesus e lhe pergunta como se salvar. Jesus devolve com uma pergunta sobre como o próprio escriba entende isso à luz das Escrituras. O homem responde, citando os dois mandamentos que resumem toda a Lei: Ame o Senhor, seu Deus, com todo o coração, com toda a alma, com todas as forças e com toda a mente. E ame o seu próximo como você ama a você mesmo (Lc. 10. 27). Jesus confirma que ele está certo e o desafia a viver agindo assim. Constrangido, o escriba pergunta quem é o próximo. E, então, Jesus conta a parábola.
A parábola mostra que o amor não é coisa de palavras, nem se manifesta como qualquer sentimento religioso. O sacerdote e o levita deixaram o homem espancado no lugar onde estava. O samaritano, alguém fora do círculo da religião tradicional, sem dizer uma palavra, o conduz até uma hospedaria, trata de seus ferimentos. Enfim, o ama. Porque amor é ação.
E o próprio João diz, mais à frente em sua carta, que o amor a Deus só é possível e se manifesta mais concretamente quando agimos em amor pelos nossos irmãos, pelo próximo: Se alguém diz: “Eu amo a Deus”, mas odeia o seu irmão, é mentiroso. Pois ninguém pode amar a Deus, a quem não vê, se não amar o seu irmão, a quem vê (1 Jo. 4. 20).
Se dizemos que amamos, a Deus e ao próximo, mas esse amor reside apenas nas nossas idéias, sem se traduzir em ações práticas em favor daqueles que afirmamos amar, somos mentirosos e não amamos de verdade ninguém. Nem Deus nem qualquer ser humano. E se não amamos, não somos discípulos de Cristo e até agora nos encontramos nas trevas, sob a maldição e a condenação de Deus.
Encontrar-se com a graça indescritível de Deus é ser impactado pelo mais puro e real amor. Amor que se manifestou, sem palavras, se entregando em nosso lugar na Cruz do Calvário. É ser tomado por ele. É se permitir ser conduzido e afogado nos rios desse amor. É ser empurrado por esse rio às ações mais práticas em favor do próximo.
Somos desafiados a viver na dimensão do verdadeiro amor. Amor que se traduz em ações e se manifesta sem palavras. Meus filhinhos, o nosso amor não deve ser somente de palavras e de conversa. Deve ser um amor verdadeiro que se mostra por meio de ações.