21.1.17

Amar a Deus

Se alguém se vangloria, dizendo: “Eu amo a Deus” mas odeia e despreza seu irmão, é mentiroso. Se não ama a pessoa que vê, como pode amar a Deus, a quem não vê? O mandamento que temos da parte de Cristo é sem rodeios: amar a Deus se vê na prática de amar o próximo. Vocês precisam amar os dois.
1 João 4. 20-21


A religião sempre promoveu uma separação entre as relações verticais entre o fiel e seu deus e as relações horizontais do fiel com os outros. Essa separação por vezes tomou corpo como ação violenta e bárbara contra todo aquele que é ou era diferente.
E não é preciso pensar apenas em movimentos terríveis como os do Estado Islâmico. No mundo religioso cristão e ocidental vimos por diversas vezes tais práticas de ódio subsistirem: na Inquisição, nas Guerras Religiosas, nos conflitos entre católicos e protestantes na Grã-Bretanha, no Apartheid sul-africano, nas políticas de segregação nos Estados Unidos.
Sempre foi fácil fugir do texto de João a partir da elasticidade interpretativa que define quem é o próximo, quem é o irmão. O outro sempre foi visto nesses casos como qualquer coisa, menos o próximo que deve ser amado. A parábola do samaritano foi contada por Jesus como forma de responder a essa pergunta: “quem é o meu próximo?” (Lc. 10. 29).
Quando Jesus responde, mostra que o próximo não é o religioso, não é o ortodoxo, mas é o estrangeiro herege, o samaritano que não segue a Deus como os judeus seguem.
Esse é o meu próximo: não o que é igual a mim, mas o que é absolutamente outro.
O mais radical dessa verdade do evangelho é que eu só posso a amar a Deus se amar esse outro, esse próximo, essa pessoa completamente diferente de mim.

O mandamento que temos da parte de Cristo é sem rodeios: amar a Deus se vê na prática de amar o próximo.
Afinal, como eu poderia dizer que amo a Deus, a quem não vejo, se desejo a morte de alguém? Como eu posso falar do meu amor a Deus, se faço o mal ao próximo? Como posso amar a Deus, se não amo o outro?
João não mede palavras: “é mentiroso”.
É mentiroso porque Deus só se ama no amor ao próximo. O amor a Deus não pode ser platônico, sentimento emocionante que nos toca a alma.
O amor só é possível porque Deus nos amou primeiro - e quando nos amou, fez-se um de nós e morreu por nós.
O amor a Deus, portanto, só pode ser real se for posto em prática, em ação. E esse ação, essa prática, essa realidade, não se dirige a um mundo etéreo: só se ama de verdade a Deus amando-se as pessoas.
Fazendo o bem a elas.
Socorrendo-as, como fez o bom samaritano.
Deixando a religião em segundo plano, em favor do amor.
Por isso, a importância da exortação da 2 Pedro 1. 5-7, que põe em questão, inclusive, uma certa posição de importância:

Diante de tudo isso, esforcem-se ao máximo para corresponder a essas promessas. Acrescentem à fé a excelência moral; à excelência moral o conhecimento; ao conhecimento o domínio próprio; ao domínio próprio a perseverança; à perseverança a devoção a Deus; à devoção a Deus a fraternidade; e à fraternidade o amor. (NVT)

A fraternidade é mais importante que a devoção - e o amor é mais importante que tudo e a tudo une.
Que aprendamos que amar a Deus é amar o próximo.

20.1.17

À espera do socorro

Se você ficar calada numa situação como esta, do Céu virão socorro e ajuda para os judeus e eles serão salvos...
Ester 4. 14.

No meio do ano de 2001, de férias em Natal, vi uma apresentação do grupo de dança de minha igreja que marcou profundamente. Ainda hoje me emociono ao ouvir a canção que dançaram naquela noite – “Elevo meus olhos”, na voz de Ana Paula Valadão e Paul Wilbur. A música tocou pelo ritmo e melodia, mas principalmente pelo impacto que aquela letra – bíblica – provocou naquele momento específico de minha vida. O texto do salmo era tudo o que eu precisava ouvir. Geralmente é assim mesmo: quando a gente menos espera, Deus traz a nós uma palavra apropriada que volta a nos dar a força e a esperança. Naquela noite, a conjunção de letra, melodia, ritmo e dança marcou a minha vida. Renovou a esperança de sair de uma situação intimamente difícil. E havia razão para isso: do Céu me viria o socorro!
É assim que muitas vezes as circunstâncias da vida nos deixam: a espera do socorro. Por isso, tantas vezes nos identificamos com personagens como Daniel e seus amigos. Jogados às feras para sermos devorados ou lançados em uma fornalha ardente, esperamos o milagre em nosso socorro. Aguardamos ansiosamente a intervenção do Céu para nos livrar. Sofremos, ansiamos, esperamos com fé. E sabemos que do Céu nos virá o socorro.
Às vezes, no entanto, nos vemos na situação de Mordecai. E essa é uma situação difícil porque nos fere. Estamos ameaçados. Porém, somos cientes que existem pessoas em posição de nos ajudar, de nos socorrer, de transformar as coisas. No entanto, tais pessoas escolhem não se envolver – por medo ou opção – deixam-nos sós com nossos problemas. E eu sei o quão duro é levar esse peso – o da dificuldade – somado à indiferença de quem pode nos ajudar.
Se você ficar calada numa situação como esta, do Céu virão socorro e ajuda para os judeus e eles serão salvos... Mordecai demonstrou uma fé que acho difícil de encontrar em mim mesmo, mas que é a mensagem de Deus para mim e para você. Se aquela pessoa que está em posição de socorrer – como a rainha Ester – não quiser se envolver, Deus proverá uma outra saída, um outro caminho, um socorro vindo de outra parte. Mas é preciso ter fé e esperar: ainda que quem possa nos ajudar não queira, Deus no Céu ouve o nosso clamor e desce para nos livrar.
Isso, para mim, é esperar contra a esperança. Quando não mais parece haver ajuda ou saída, ainda podemos esperar a ajuda do céu. Ainda que venha no último instante. Ainda que surja como um anjo andando conosco no meio da fornalha. Ainda que seja um anjo que fecha a boca do leão faminto diante de nós. Deus não nos desamparará, mesmo que o homem desampare. Do céu virá o socorro.

Observação: Em virtude da necessidade de lidar com questões particulares, hoje não foi possível elaborar uma reflexão inédita. Recupero, por isso, texto publicado em 20 de dezembro de 2005.

19.1.17

Conosco

Agora, que já sabemos o que temos — Jesus, esse grande Sacerdote Principal com acesso imediato a Deus —, não podemos perdê-lo jamais. Não temos um sacerdote que não conhece nossa realidade. Ele experimentou fraqueza e provações e experimentou tudo, menos o pecado. Portanto, vamos andar direito e receber o que ele tem para nos dar. Recebam a misericórdia, aceitem a ajuda.
Hebreus 4. 14-16


Imagine qualquer problema.
Pense em qualquer situação à qual você está enfrentando.
Projete o tamanho de qualquer sofrimento que aflija você - menor ou mais, mais simples ou mais grave.
Quaisquer dessas circunstâncias se tornam mais facilmente suportáveis quando temos a ajuda adequada.
E não falo aqui sobre ajudas técnicas ou profissionais - que são imprescindíveis. Mas falo de uma ajuda à alma que é capaz de fazer novas todas as energias, abrir os caminhos para as restauração, construir os passos para a paz.
Falo que qualquer problema é mais facilmente suportável se experimentamos a misericórdia e a ajuda de Deus, que é dada de graça em Jesus.
A melhor posição que temos para enfrentar as lutas é ao lado e protegido por Jesus. É sob suas mãos, debaixo do seu olhar, mergulhado em sua graça e misericórdia. É estarmos no Santo dos Santos do tabernáculo dos céus, como diz o autor da carta aos Hebreus - esse é o melhor lugar e o mais apropriado para enfrentarmos a luta do dia a dia.
Você pode estar enfrentando uma doença, incurável - pode ter certeza de que será mais fácil lidar com ela e com as circunstâncias da vida sob o cuidado de Jesus.
Você pode estar passando por problemas familiares incrivelmente dolorosos - Jesus pode não diminuir sua dor ou resolver seu problema, mas debaixo de sua atenção graça e misericórdia lhe darão forças para enfrentar tudo isso.
Seu problema pode ser desemprego - ainda que Jesus não lhe dê um emprego, você pode saber que sua graça é suficiente para que você possa suportar a situação: o Seu poder se aperfeiçoa na fraqueza (2 Co 12. 9).
Não importa o seu problema: o melhor modo de enfrentá-lo é recebendo misericórdia de Jesus, sua ajuda.

Agora, que já sabemos o que temos — Jesus, esse grande Sacerdote Principal com acesso imediato a Deus —, não podemos perdê-lo jamais. Não temos um sacerdote que não conhece nossa realidade. Ele experimentou fraqueza e provações e experimentou tudo, menos o pecado. Portanto, vamos andar direito e receber o que ele tem para nos dar. Recebam a misericórdia, aceitem a ajuda.

Ele pode nos ajudar a enfrentar a dor, segundo o autor de Hebreus, porque ele experimentou na pele todo o sofrimento possível. Não podemos jamais perder um sacerdote que conhece a nossa realidade, "experimentou fraqueza e provações e experimentou tudo”.
Ele nos ajuda porque se fez um de nós - até mesmo na dor e no sofrimento. Seu esvaziamento e sua empatia são perfeitos.
Ele está conosco quando dói. Ele sustenta nossos braços quando falta força. Ele segura nossa mão quando temos medo. Ele nos estimula quando falta coragem. Ele nos consola quando choramos.
Ele está conosco até o fim. Emanuel.

18.1.17

Humildade

Aqui está uma palavra que você pode levar no coração e confiar nela: Jesus Cristo veio ao mundo para salvar os pecadores. Eu sou a prova — o “pecador público número um” — de alguém que jamais conseguiria nada a não ser por pura misericórdia.
1 Timóteo 1. 15-16


Há três coisas relacionadas entre si a se falar a partir desse texto. A primeira, e talvez mais óbvia, é a afirmação de Jesus como salvador.
Jesus Cristo veio ao mundo para salvar os pecadores. Não veio para os sãos, os santos, os justos, os fiéis. Ele veio salvar os pecadores - veio para aqueles que têm perfeita consciência do que são e que, com essa consciência, sabem exatamente que não teriam nenhuma chance se não houvesse uma intervenção misericordiosa e graciosa. Jesus veio salvar quem sabe que não merece, não podia ou não devia ser salvo.

Jesus escutou a crítica e reagiu: “Quem precisa de médico: quem é saudável ou quem é doente?"
Mateus 9.12


Quem não se reconhece como pecador em dívida se coloca de fora da salvação trazida por Jesus.
E isso aponta para a segunda questão: experimentar a salvação trazida por Jesus nos leva a reconhecermo-nos como “o 'pecador público número um' — de alguém que jamais conseguiria nada a não ser por pura misericórdia.”.
Ou seja: a graça e salvação de Jesus nos faz humildes, sem falsas modéstias ou ilusões. Ser salvo de graça por Jesus é como um espelho que mostra a cada um de nós o tamanho de nossas faltas, nossos erros e dívidas e, por isso mesmo, nos mostra o nosso real tamanho. Não podemos querer ser mais que o “pecador público número um”.
Por isso Jesus fala sobre a pecadora na casa de Simão (Lucas 7. 44-47):

“Vê essa mulher? Eu vim à sua casa, e você não me trouxe água para os pés; ela, porém, derramou lágrimas nos meus pés e os enxugou com os cabelos. Você nem me cumprimentou direito, mas, desde a hora em que cheguei aqui, ela não se cansa de beijar meus pés. Você não me recebeu como é nosso costume, derramando azeite em minha cabeça, mas ela perfumou meus pés. Não foi assim mesmo? A razão de tudo é que ela foi perdoada de muitos pecados, por isso está tão agradecida. Quem recebe pouco perdão mostra pequena gratidão”.

Quanto mais conscientes de quão pecadores somos, mais gratos podemos ser por reconhecer o tamanho da obra de Jesus, o Salvador.
Sempre me lembro de uma mensagem pregada por um primo muitos anos atrás em que ele dizia que essa era uma questão chave para a relação pastoral de discipulado e de aconselhamento: se eu sei que sou o pior dos pecadores não há nada que o outro me conte que deva me espantar ou mudar relação. Por pior que seja o pecado do outro, eu - e não ele - sou o “pecador público número um”. Uma questão fundamental de humildade - e só assim, seremos capazes de apoiar o outro, porque, no momento em que o julgarmos moralmente como inferiores estabelecesse uma relação que não será sadia, uma relação que tenderá a se fundamentar em um jogo de créditos e débitos diante de Deus.
Esse é a terceira coisa que se destaca: o único jeito de termos relações saudáveis uns com os outros, relações que não sejam fundamentas em um jogo de contas de créditos e débitos, é se reconhecermos o tamanho real de quem somos.
É preciso humildade. É preciso saber a verdade sobre nós. É preciso abrir mão de estar certo na relação com o próximo: é preciso deixar a posição confortável de credor.
Paulo disse isso aos Filipenses e aos Coríntios:

O amor se preocupa mais com os outros que consigo mesmo.
1 Coríntios 13. 5

Ponham o interesse próprio de lado e ajudem os outros em sua jornada. Não fiquem obcecados em tirar vantagem. Esqueçam-se de vocês o suficiente para estender a mão e ajudar.
Filipenses 2. 3-4


Se nossas relações se baseiam em um jogo contábil de crédito e débito, seremos os mais infelizes dos sujeitos - ainda que a posição de credor seja sempre egoisticamente confortável, por mais que seja irreal. Além de incoerentes, uma vez que a base de reconhecer Jesus como Salvador e Sua Salvação é entender que tudo isso é fruto da Graça. De Graça.
Era uma conta impagável.
Nossa relação com Deus só é possível porque Ele não faz contabilidade de nossas dívidas e créditos.
Por que sua relação com o próximo poderia se fundamentar nesse tipo de contabilidade?

17.1.17

Problemas

Não que os problemas devam surpreendê-los. Vocês sabem que estamos sujeitos a essas situações, que fazem parte do nosso chamado.
(…)
Em qualquer situação, acordados com os vivos ou dormindo com os mortos, estamos vivos com ele!
1 Tessalonicenses 3. 3; 5. 10



Você já deve ter visto por aí inúmeros televangelistas, igrejas e religiões prometendo uma vida sem dor e sem sofrimento. Basta seguir determinado ritual, certas regras, realizar certo sacrifício e, pronto, a vida a partir dali será de tranquilidade.
Se não deu certo para você, o problema é seu. Algum pecado escondido, a falta de fé, não realizou o ritual corretamente - não importa: o culpado pelo seu sofrimento é você mesmo e mais ninguém.
A ideia de que realizar certas práticas seria suficiente para garantir uma bênção sem fim da Divindade e uma vida sem sofrimentos não é nova e, infelizmente, aparece em muitos contextos do Antigo Testamento - que são, aliás, a base do discurso religioso que explora tais ideias hoje em dia.
Claro que há textos, como o livro de Jó, em que não restam dúvidas de que o sofrimento, a dor, os problemas não derivam de nada que o fiel fez. São contingências da vida que atacam, inclusive, um homem dito como justo por Deus duas vezes no início de seu livro.
Para nós é mais fácil acreditar que há uma fórmula mágica de se enfrentar a dor e o sofrimento. Tantas orações, quantos sacrifícios, tais palavras mágicas e, por um milagre, a dor e o sofrimento se foi.
Para mim, o pior efeito da dor, do sofrimento e dos problemas é a sensação de transitoriedade que termina por fazer com que nada na vida seja encarado como real. Como sabemos que nenhuma dor, sofrimento ou problema dura para sempre, podemos ter a tendência de suspender a vida pelo tempo de sua duração. E aí deixamos de viver todos os momentos de verdade - somente como uma etapa, passageira e provisória, na direção do mundo sem dor.
A dor, o sofrimento e os problemas não são alienígenas de nossa existência e, ainda não durem para sempre, não justificam que vivamos a vida como provisória.


Não que os problemas devam surpreendê-los. Vocês sabem que estamos sujeitos a essas situações, que fazem parte do nosso chamado.
1 Tessalonicenses 3. 3



São parte da vida. Não uma parte fácil, não uma parte que seja natural saber lidar. Nada disso. A dor é parte da vida, mas não é fácil. Às vezes, vai nos sugar toda energia. Às vezes, vai nos deixar perdidos, sem saber como agir. Os problemas podem, inclusive, nos submergir. O sofrimento pode levar você ao fundo do poço.
Eles fazem parte da vida e Paulo nos informa que devemos estar prontos para quando eles acontecerem para não sermos surpreendidos.
Mas como é possível lidar com cada um deles?
Não vejo como ser possível afirmar que há somente um jeito de lidar com o sofrimento, mas podemos lidar com a dor a partir do momento que entendemos que ela faz parte da vida - não é uma intrusa que qualquer ritual vá fazer desaparecer e, nem sempre, ela emerge por culpa nossa.
Mas a fé em Jesus oferece um ponto de apoio fundamental para lidarmos com a dor, o sofrimento e com qualquer problema que nos sufoque:


Em qualquer situação, acordados com os vivos ou dormindo com os mortos, estamos vivos com ele!
1 Tessalonicenses 5. 10



Em qualquer situação, estamos vivos com Ele. A vida dEle vive em nós. A eternidade dentro de nosso ser.
Por pior que seja a dor, por maior que seja o problema, por incontrolável que seja o sofrimento, Ele está conosco. Nossa vida está nEle. É nEle que vivemos.


Mesmo que a estrada atravesse
o vale da Morte,
Não vou sentir medo de nada,
porque caminhas do meu lado.
Teu cajado fiel
me transmite segurança.
Salmo 23. 4






16.1.17

Mais importante que tudo

Sim, todas as coisas que um dia considerei importantes nada mais valem na minha vida. Comparado com o alto privilégio de conhecer Cristo Jesus, meu Senhor, em primeira mão, tudo o mais é insignificante — esterco. Joguei tudo no lixo para abraçar Cristo e ser abraçado por ele.
Filipenses 3.8-9

Em setembro de 1996, aos 17 anos, eu enfrentava uma crise existencial, talvez típica da adolescência. A morte de um colega de escola em um acidente de carro fez a crise aprofundar. Tudo estava em crise para mim, a partir da fé e do modo de ver a vida. Ali eu era um adolescente espírita que colocava em xeque sua própria concepção de Deus.
No feriado de 7 de setembro, fui para um acampamento evangélico. Aquela foi a experiência arrebatadora e transformadora da minha vida - aquilo que costumamos chamar de conversão.
Lembro que na noite do sábado, 7, eu fui dormir me sentindo incomodado porque havia uma doce alegria no ar, ela me envolvia, eu me via alegre, mas parecia que ela não era capaz de entrar no meu coração. Todas aquelas experiências me faziam cantar, quando sozinho no acampamento, uma canção que aprendi na escola: “Meu Deus é bom para mim/ comigo vai/ tão forte brilha o sol e a chuva cai/ amor tão grande assim/ só Cristo tem por mim/ direi até o fim:/ Meu Deus é bom para mim”.
Na manhã do domingo, minha cabeça girava em mil ideias - mas todas elas me impulsionando a um desejo e uma vontade cada vez mais incontrolável: deixar tudo de lado para abraçar e seguir Cristo. Queria sentir aquela alegria entrar em mim e em meu coração!
Foi a primeira vez que tive em mim o mesmo sentimento que Paulo expressa aos Filipenses:

Sim, todas as coisas que um dia considerei importantes nada mais valem na minha vida. Comparado com o alto privilégio de conhecer Cristo Jesus, meu Senhor, em primeira mão, tudo o mais é insignificante — esterco. Joguei tudo no lixo para abraçar Cristo e ser abraçado por ele.

Deparar-se com Jesus, com o Deus bom e amoroso, muda as prioridades de nossa vida. Experimentar o Deus vivo brilhando, vibrando, amando dentro de nós é um impulso incontrolável para que nos rendamos e mudemos as prioridades do nosso viver. Viver é Cristo e somente Cristo! Tudo o mais é esterco.
Falei que em 1996 aquela foi a minha primeira experiência. Houve outras. Isso para mim significou sempre que a decisão de "abraçar Cristo e ser abraçado por ele” não é única e de uma vez por todas.
Somos lembrados todos os dias para deixar a alegria entrar no coração, considerar Jesus como mais importante que tudo e, todos os dias, mais uma vez abraçá-lo e deixar-se abraçar por ele.
Além disso, há aqueles momentos em que diversas circunstâncias da vida nos afastam desse abraço. Eu tive alguns desses momentos na vida - seguidos de novas descobertas do amor sem fim de Jesus e do seu abraço carinhoso.
Um desses momentos ocorreu em 2013, na cidade de Fortaleza. No fundo de uma rede, eu me perguntava sobre o sentido da vida. A partir dali, comecei um novo processo de conversão. Converti-me novamente ao Senhor - entreguei meu coração a ele de novo. Pouco a pouco, voltei a entender que tudo o mais é esterco diante do amor de Jesus.
Esse é o meu momento de novo - após passar pela pior das crises pessoais, juntando os pedaços, redescobrindo que Jesus é mais importante do quaisquer outras coisas. Abraçá-lo e deixar-se abraçar por ele.
Quando estiver em pedaços, relembre que cada pedaço é esterco diante de Jesus, de seu amor, de sua vida em nós. Essa ressurreição está disponível para todos nós.

Sim, todas as coisas que um dia considerei importantes nada mais valem na minha vida. Comparado com o alto privilégio de conhecer Cristo Jesus, meu Senhor, em primeira mão, tudo o mais é insignificante — esterco. Joguei tudo no lixo para abraçar Cristo e ser abraçado por ele.

15.1.17

Glória, pecado, perdão

E proclamavam uns aos outros:
“Santo, Santo, Santo é o Senhor dos Exércitos de Anjos.
Sua glória deslumbrante enche toda a terra”.
Isaías 6. 3



O ser humano finito que se depara com a Santidade de Deus, a Realidade Última da Existência, a Sua ação poderosa e amorosa, sofre um impacto imensurável.

Foi assim, por exemplo, no episódio da pesca maravilhosa conforme contada por Lucas. Após testemunhar o milagre, Pedro ficou atônito (Lc. 5. 8):


Assim que presenciou aquilo, Simão Pedro ajoelhou-se diante de Jesus e pediu: “Senhor, afaste-se de mim. Sou um pecador e o senhor é santo demais para mim. Deixe-me sozinho”.


Deparar-se com Deus sempre representou um pavor de morte: como pode viver um pecador diante do Deus vivo e santo?

No relato de Juízes sobre Gideão (6), o mesmo sentimento de pavor se faz sentir quando o futuro juiz de Israel compreende que está diante do Senhor (Jz 6. 21-23):


O anjo do Eterno estendeu a ponta do cajado que carregava e tocou a carne e o pão. Na mesma hora, saíram chamas da pedra, e elas queimaram a carne e o pão, enquanto o anjo do Eterno sumia de vista. Gideão finalmente entendeu que aquele era o anjo do Eterno!
Gideão disse: “Ah! Senhor, Eterno! Eu vi teu anjo face a face!”.
Mas o Eterno o tranquilizou: “Não se preocupe. Não se apavore. Você não morrerá”.



Estar diante do Santo é perceber-se pecador. A luz que brilha na santidade, revela os recônditos da alma, faz parecer que os nossos piores e mais sujos segredos estão revelados, expostos em braça pública. A sensação é de que morreremos diante do Santo.

No livro de Êxodo (33), Moisés pede a Deus para ver a sua face, mas não era possível que isso se desse (Ex 33. 18-20):


Moisés, então, disse: “Por favor, permita que eu veja a tua glória”.
O Eterno respondeu: “Farei passar minha bondade diante de você. Pronunciarei o nome, o Eterno, bem na sua frente. Tratarei bem os que eu quiser tratar bem e serei bom com quem eu quiser ser bom”.
O Eterno continuou: “Mas você não poderá ver meu rosto. Ninguém pode me ver e continuar vivo”.



Estar na presença de Deus foi, para esses homens, temível. Prostraram-se aterrorizados. Isaías ainda afirma (Is. 6. 5):


Eu disse:
“Juízo! É o dia do juízo!
Estou perdido!
Cada palavra que falei na vida era podridão,
soou como blasfêmia!
E o povo com que vivo fala da mesma maneira,
são palavras que corrompem e profanam.
E agora olhei diretamente para Deus!
O Rei! O Senhor dos Exércitos de Anjos!”



A maravilha desse Deus cuja glória resplandece em toda a terra, que revela à sua luz os nossos piores segredos, que nos mostra diante dEle a nossa limitação e fragilidade, é que Ele estende a mão, perdoando (Is. 6. 6):


Então, um dos serafins voou até mim. Ele segurava na mão uma brasa que havia tirado do altar com uma tenaz. Tocou minha boca com ela e disse:
“Esta brasa tocou seus lábios.
Sua culpa se foi,
seus pecados foram apagados”.



O toque do perdão é o mesmo toque que nos impulsiona ao serviço - “Eu irei. Envia-me!” (Is. 6. 8).

Esse é o pano de fundo ideal para entendermos a riqueza da glória de Deus que se manifesta inteira e unicamente em Jesus Cristo. Nele reconhecemos a sua glória. Ele expõe os nossos segredos sujos - aos seus olhos, tudo está revelado. Ele é a face de Deus que podemos olhar sem temer a morte porque assumiu a nossa humanidade para que isso se tornasse possível.

A face visível de Deus é amor, perdão, restauração. É o toque nos lábios que apaga a culpa, faz esquecer o pecado, santifica a vida, enche o coração e, na dimensão do toque amoroso, nos leva ao serviço em amor.

Em Jesus, o temor e o pavor de morte que impactam os mortais pecadores em sua relação com Deus não têm mais sentido. Em Jesus, o que tem sentido é encontrar um Deus que ama, perdoa e acolhe, mesmo o pior dentre todos nós.


Mas Cristo nos uniu por meio de sua morte na cruz. A cruz nos leva a abraçar uns aos outros, e faz cessar a hostilidade. Cristo veio e pregou a paz a estrangeiros como vocês, que não são judeus, e também aos judeus, que já conheciam Deus. Ele nos tratou como iguais e nos fez iguais. Por meio dele, compartilhamos do mesmo Espírito e temos igual acesso ao Pai.
Efésios 2. 16-18