10.10.05

Não consigo

Quando Deus julgar, não terá misericórdia das pessoas que não tiveram misericórdia dos outros.
Tiago 2. 13

Não consigo me compreender servindo ao mesmo Deus de tantas pessoas que, mais ou menos disfarçadamente, são capazes de comemorar milhares de mortes no sul da Ásia, porque encaram a tragédia como um sinal dos tempos ou por apenas verem ali uma ação do juízo de Deus.
Não consigo me compreender servindo ao mesmo Deus de tantas pessoas que somente são capazes de olhar para si mesmas e seu futuro no céu, lançando sua mente e coração ao “celeste porvir”, sem se comprometerem com a transformação do mundo e a manifestação do Reino de Deus no nosso dia a dia. Pessoas que, diante da crise no mundo envolvendo as pessoas à nossa volta, optam por fugir para um mundo místico, trancado em si mesmo. Pessoas assim defendem que não adianta agir porque a vontade de Deus é que todas as coisas piorem mais todos os dias. Para eles é assim que o Deus da Bíblia se revela. Não são apenas pessimistas, são cruéis.
Não consigo me compreender servindo ao mesmo Deus de pessoas que defendem e acreditam na doutrina do quanto pior, melhor. Provavelmente foram pessoas assim que fundaram as igrejas do bairro natalense de Felipe Camarão, o mais violento da cidade e, paradoxalmente, um dos que tem o maior número de igrejas. Igrejas que, possivelmente, por muito tempo se fechavam em si mesmos e se fecharam às comunidades.
Não consigo me compreender servindo ao mesmo Deus de pessoas que comemoram, mesmo que disfarçadamente, o juízo sem misericórdia. Quando Deus julgar, não terá misericórdia das pessoas que não tiveram misericórdia dos outros.
O Deus a quem sirvo chorou diante de uma Jerusalém condenada. Quando Jesus chegou perto de Jerusalém e viu a cidade, chorou com pena dela e disse: - Ah! Jerusalém! Se hoje mesmo você soubesse o que é preciso para conseguir a paz! Mas agora você não pode ver isso. Pois chegarão os dias em que os inimigos vão cercá-la com rampas de ataque, e vão rodeá-la, e apertá-la de todos os lados. Eles destruirão completamente você e todos os seus moradores. Não ficará uma pedra em cima da outra, porque você não reconheceu o tempo em que Deus veio para salvá-la (Lc. 19. 41 – 44). Jesus, o Deus que me salvou, é um Deus que anuncia o juízo em lágrimas: não tem prazer em destruir o pecador.
O Deus a quem sirvo e quero conhecer mais é o Amor que sempre nos traz novas chances. Então Jesus contou esta parábola: - Certo homem tinha uma figueira na sua plantação de uvas. E, quando foi procurar figos, não encontrou nenhum. Aí disse ao homem que tomava conta da plantação: “Olhe! Já faz três anos seguidos que venho buscar figos nesta figueira e não encontro nenhum. Corte esta figueira! Por que deixá-la continuar tirando a força da terra sem produzir nada? Mas o empregado respondeu: “Patrão, deixe a figueira ficar mais este ano. Eu vou afofar a terra em volta dela e pôr bastante adubo. Se no ano que vem ela der figos, muito bem. Se não der, então mande cortá-la” (Lc. 13. 6 – 9). O Deus que nos salva em Cristo é Aquele que está sempre disposto a nos dar mais este ano antes de desistir de nós. Ele não desiste, mesmo quando julga.
E o Deus a quem eu amo é Aquele que começa o julgamento a partir de mim. Que me conduz a pensar primeiro na minha própria situação de pecado antes de imaginar qualquer ação de juízo sobre outras pessoas. É nisso que somos instigados a pensar quando Jesus nos desafia a deixar de ser hipócritas: Por que é que você vê o cisco que está no olho do seu irmão e não repara na trave de madeira que está no seu próprio olho? (Mt. 7. 3). É por isso que Ele nos faz pensar na Lei de Talião primeiro contra nós mesmos, nos convocando a sermos muito mais intransigentes conosco mesmos: Se uma das suas mãos ou um dos seus pés faz com que você peque, corte-o e jogue fora! Pois é melhor você entrar na vida eterna sem uma das mãos ou sem um dos pés do que ter as duas mãos e os dois pés e ser jogado no fogo eterno. Se um dos seus olhos faz com que você peque, arranque-o e jogue fora! Pois é melhor você entrar na vida eterna com um olho só do que ter os dois e ser jogado no fogo do inferno (Mt. 18. 8 – 9).
O Deus a quem amo me exige intransigência contra o pecado, não no juízo dos outros, mas principalmente contra o pecado em mim mesmo. Para que eu entenda que o Deus a quem sirvo é o Senhor pleno de misericórdia: Dêem graças a Deus, o Senhor, porque Ele é bom; o Seu amor dura para sempre (Sl. 136. 1). E é por isso que Ele me diz que quando julgar, não terá misericórdia das pessoas que não tiveram misericórdia dos outros.

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