Jeremias, ponha esses trapos debaixo dos braços para que as cordas não machuquem você.
Jeremias 38. 12
Jeremias era um incômodo para a liderança de Israel. Sua palavra, vinda do Senhor, denunciava os pecados e a injustiça cometidas especialmente por aqueles que deveriam ser responsáveis pela vida espiritual do povo. Durante o cerco de Jerusalém, Jeremias incomodou tanto que terminou sendo preso. No pátio da guarda. Mas ninguém poderia calar sua voz e ele continuou profetizando. Até que um grupo chefiado por Safatias procurou o rei Zedequias afirmando que o profeta devia morrer. O rei, impotente, permitiu que o grupo lançasse Jeremias em poço. Não havia água no poço, mas apenas uma lama, imagino, fedida. Jeremias estava condenado. Se não morresse devido a alguma doença adquirida naquela lama, morreria de fome. Pelas mãos dos líderes de seu próprio povo.
Só que existia um eunuco etíope, Ebede-Meleque, temente a Deus. Procurou o indeciso rei, intercedeu pelo profeta e recebeu autorização para resgatá-lo da morte certa. Junto com um grupo de trinta homens, o etíope arma o esquema para resgatar Jeremias. Pegou trapos e roupas usadas, desceu cordas, mandou Jeremias proteger as axilas com as roupas e ergueu o fragilizado corpo do profeta com cordas. Ajudaram Jeremias a sair do poço.
Hoje eu queria extrapolar um pouco esta história. Meu desejo é usar alguns elementos desse relato como metáfora para algumas situações que acometem nossas vidas, vez por outra. Diversas situações podem nos lançar em poços fedidos como aquele em que se encontrava Jeremias. Ali, estaremos condenados à morte certa, ainda que não seja uma morte física. Podemos nos sufocar na lama e na sujeira. Podemos nos infectar com algum vírus mortal. Quem sabe a mágoa. Quem sabe o ressentimento. Quem sabe a tristeza. Quem sabe os desejos de vingança. Quem sabe qualquer desses pesos que podem nos arrastar para um destruição ainda maior. No fundo do poço, cercado por essa fedentina que nos sufoca, não encontramos, não contemplamos qualquer chance de escapatória. Sentimo-nos e vemo-nos como realmente estamos: condenados. Sozinhos somos impotentes para sair dali.
O profeta não caiu no poço por si só. Foi lançado ali por líderes que desejavam silenciar a sua voz. Se tivessem a chance, aqueles homens ainda afundariam ainda mais Jeremias na lama. Se pudessem, eles não titubeariam em jogar ainda mais lama, sujeira e podridão sobre ele. Sufocá-lo mais rápido, roubar-lhe as chances de escapar. Às vezes não temos inimigos assim a nossa volta. Às vezes são os amigos que fazem isso, mesmo repletos de boas intenções. Estamos mergulhados em um poço profundo de tristeza, mágoa, dor e ressentimento. E, nessas horas, nos cercam amigos que, ainda que queiram nos ajudar, não sabem muito o que fazem. Alimentam, assim, ainda mais a lama de nossas piores emoções. Fomos feridos por terceiros e os nossos amigos nos sufocam, estimulando os desejos de vingança. Fomos marcados por ações de outros, os conselhos que ouvimos nos conduzem a alimentar a mágoa e o ressentimento. Mesmo que nosso maior desejo seja escapar do poço, como se estivéssemos na areia movediça, nos afundamos ainda mais cada vez que nos esforçamos por sair. Além disso, as vozes que optamos por ouvir jogam mais lama ainda em nossa cabeça. Quando olhamos para o alto, vemos a luz da saída. Sabemos que podemos sair. Mas todo nosso esforço, todo o apoio que recebemos tem sido vão. Afundamos mais. Mais tristeza. Mais mágoa. Mais dor. Afundamos mais. Estamos cercados pelas pessoas erradas que nos afundam, mesmo sem perceber.
O que precisamos para sair? Precisamos de um eunuco etíope. Alguém que tenha a visão do alto. Alguém que tenha o coração quebrantado na presença do Senhor. Alguém que venha e possa interceder junto ao rei porque sabe que Jeremias é um profeta de Deus. Precisamos de alguém que interceda por nós. Precisamos de alguém que lance as cordas para nos puxar do fundo do poço. Precisamos de alguém que esteja lá em cima, na boca do poço, não de alguém que esteja do nosso lado e nem perceba que lança ainda mais lama para nos afundar. Alguém que se deixe levar mais perto por Deus. Alguém que tenha o seu coração em Jesus. Precisamos de alguém que nos apóie, não estimulando nossos desejos de vingança, mas nos ajudando a ver além de toda dor, toda mágoa, todo ressentimento.
Cada um pode enfrentar uma situação como a que descrevo. Eu já enfrentei, por isso sou capaz de afirmar que passamos por algo assim pelo menos uma vez na vida. É nessas horas que devemos escolher com quem vamos andar. E restam apenas duas alternativas. Felizes são aqueles que não se deixam levar pelos conselhos dos maus, que não seguem o exemplo dos que não querem saber de Deus e que não se juntam com os que zombam de tudo o que é sagrado! Pelo contrário, o prazer deles está na lei do Senhor, e nessa lei eles meditam dia e noite (Sl. 1. 1 – 2).
Toda a dor pela qual passamos, toda tristeza, são oportunidades que Deus nos dá para andarmos mais junto a Ele. São ações de Deus para moldar o nosso caráter. Depende de nós escolher que efeito essas coisas terão em nossa vida. Podem nos trazer mais perto de Deus, podem nos afundar em um poço de morte. A escolha das pessoas a quem pediremos ajuda pode ser decisiva nessas horas. A quem buscaremos? Ao que tem prazer no Senhor ou àquele cujo prazer é sentar e escarnecer, alimentando as dores, as mágoas e o pecado?
Nenhum comentário:
Postar um comentário