20.6.05

Compaixão

Quando Jesus saiu do barco e viu aquela grande multidão, ficou com muita pena deles e curou os doentes que estavam ali.
Mateus 14. 14.

No último sábado comprei uma camiseta que sempre quis ter. Ela traz a mais famosa foto de Che Guevara e frases conhecidas dele: Viva la Revolucion! Hasta la victoria siempre! Ontem à noite fui à igreja com ela.
Depois fiquei pensando que aquela camisa podia ser mal-entendida pelos meus irmãos. Especialmente pelo fato de que ninguém entende bem as idéias que fundamentam qualquer ideal revolucionário. Então, a pergunta inevitável seria: Como pode um cristão andar com a foto de um revolucionário? Eu poderia responder com uma outra pergunta: Como pode um cristão não ser um revolucionário?
Quem assistiu Diários de Motocicleta, mesmo que faça todas as ressalvas devidas à construção romântica da figura de Che, pôde entender como nasce um ideal revolucionário. E, mais ainda, que o ideal de Guevara não se produziu em um contexto anti-cristão ou anti-bíblico. Sua execução pode ter sido contrária às Escrituras, mas o processo de nascimento é profundamente vinculado aos princípios do Evangelho de Jesus.
O filme narra a viagem de Che e de seu parceiro Alberto Granado, de moto, pelas terras latino-americanas, quando o futuro revolucionário ainda era um jovem estudante de medicina. O ponto final da viagem seria um leprosário na Amazônia peruana. No caminho, a dupla descobre, pouco a pouco, a miséria, a exploração e a injustiça no continente. Ao chegar no leprosário, eles revolucionam o atendimento preconceituoso e de isolamento que, até então, se dava aos doentes. Mesmo em tratamento e, por isso, sendo impossível o contágio, os doentes eram isolados em uma ilha. As religiosas não permitiam que se misturassem. Na noite de seu aniversário, o asmático Ernesto atravessa o rio a nado, apenas para poder celebrar com os seus amigos leprosos na colônia da outra margem.
O ideal revolucionário nasce da capacidade de se indignar com a injustiça e de ter compaixão pelos oprimidos. E, daí, ele conduz a uma ação em favor de mudança. Quando Jesus saiu do barco e viu aquela grande multidão, ficou com muita pena deles e curou os doentes que estavam ali.
Jesus era alguém que se compadecia e se indignava, e, conduzido pelo amor, agiu para transformar o mundo, sem nenhuma dúvida. Esse era o propósito de Sua vida, Seu ministério, Seu compromisso.
Quando Jesus se encontra com o jovem rico (Lc. 18. 18 – 27), o desafia a assumir um compromisso duplo, em resposta à sua pergunta sobre o que fazer para ser salvo: compromisso com o próprio Senhor, em primeiro lugar, e compromisso com os pobres. O rico rejeita a salvação porque é incapaz de se comprometer com os pobres.
Indignação com a injustiça, compaixão pelos oprimidos e compromisso com a transformação do mundo são coisas impressas em nosso coração pelo amor de Deus. Ser cristão, por isso, é ser revolucionário, mesmo que nunca necessitemos realizar uma revolução armada. A nossa revolução é conduzida pela força do Evangelho e pela luta por mudança.
Outro dia dizia a uma amiga que ela não podia perder a capacidade de se indignar com a injustiça, sob pena de perder, junto com isso, o seu compromisso com Deus.
Podemos, por fim, não aceitar as práticas de Che, mas não podemos deixar de constatar que seu ideal, nascido da compaixão e da indignação, não diverge tanto do compromisso de Jesus quanto gostariam alguns. Quando Jesus saiu do barco e viu aquela grande multidão, ficou com muita pena deles e curou os doentes que estavam ali.

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