9.6.05

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Portanto, todos nós, com o rosto descoberto, refletimos a glória que vem do Senhor. Essa glória vai ficando cada vez mais brilhante e vai nos tornando cada vez mais parecidos com o Senhor, que é o Espírito.
2 Coríntios 3 . 18

Quando morei em Fortaleza, para fazer seminário, descobri uma coisa que até então não sabia a meu respeito: minha facilidade para assumir o sotaque dos outros. Logo que cheguei à capital cearense, estranhei aquela maneira de falar, suas expressões mais comuns. Mas, pouco a pouco, fui percebendo que cada uma daquelas coisas que, antes me eram estranhas, foram entrando no meu linguajar e fui assumindo um pouco daquele sotaque. O que contrabalançava e me impedia de ir mais fundo nesse processo era o fato de que os meus companheiros de moradia provinham de toda parte do país. Desse modo, havia uma pluralidade de sotaques distintos no seminário que impedia que qualquer um de nós mantivesse um deles marcadamente.
O momento em que meu sotaque “cearense” mais se desenvolveu foi quando namorei uma menina cearense. O fato de que passava a maior parte de meu tempo livre conversando com ela foi decisivo para isso. Como se fosse por osmose, a forma cearense de falar, inclusive com todos os seus chiados típicos, foi se impregnando em mim. Tamanha imersão conduziu-me a – o cúmulo – passar a estranhar, não mais o sotaque de Fortaleza, como no início, mas o sotaque de minha própria terra. Isso se deu de forma mais marcada a partir do instante em que desenvolvi uma relação mais íntima e constante, o namoro, com uma cearense.
Mas houve outras coisas interessantes no tempo de seminário. Cada um de nós vinha de famílias, criações e culturas completamente diversas umas das outras. Desse jeito, os primeiros meses de convívio forçado na mesma casa e no mesmo quarto provocou uma série de tensões. Rapidamente, porém, fomos nos adaptando uns aos outros. Mas o mais engraçado é que com o tempo passamos a aprender muitos hábitos uns com os outros. Assim, os nordestinos aprenderam a gostar de tomar tereré com os sul-matogrossenses. Além disso, fomos nos influenciando mutuamente e mudando nosso próprio caráter pelo convívio mais íntimo.
Toda essa história me faz lembrar do que Paulo fala acerca de nosso processo de santificação, de nos tornamos mais semelhantes a Jesus cada dia: Portanto, todos nós, com o rosto descoberto, refletimos a glória que vem do Senhor. Essa glória vai ficando cada vez mais brilhante e vai nos tornando cada vez mais parecidos com o Senhor, que é o Espírito. O que para mim fica claro desse texto e se constitui em um grande desafio para a vida cristã é que santidade e transformação de vida surgem como resultado de uma cada vez mais íntima relação pessoal com Deus. Do mesmo modo que eu fui assumindo o sotaque “cearense” a partir do convívio íntimo com os cearenses – imersão total no ambiente em que se fala assim – a santidade e pureza de vida é assumida a partir da relação de profundidade com o Senhor. O Senhor vai refletindo a Sua Glória em nós, Glória que vai se tornando cada vez mais intensa enquanto nos torna cada vez mais semelhantes ao próprio Deus. Santidade é resultado da comunhão íntima com o Senhor.
De maneira semelhante, nossos hábitos, tantas vezes marcados pelo pecado, vão sendo alterados e vamos assumindo novos hábitos a partir da convivência com o Deus que é santo. Diante desse Deus Santo somos impactados pela Glória de Sua Santidade que vai nos limpando, nos moldando, nos transformando. Na relação, vamos aprendendo a viver uma nova vida.
De um lado, deparando-nos com a Face do Senhor como num espelho em nossa alma, na vida de comunhão com Ele, temos o nosso caráter transformado pelo Espírito. De outro, andando com Jesus de maneira cada vez mais próxima, adquirimos novos hábitos, condizentes com o novo caráter santo que Deus está imprimindo em nós.
Mudança de vida parte, necessariamente, de conhecer o Senhor face a face e andar na intimidade dEle a todo instante. Santificação é transformação de caráter resultante da intimidade do Senhor. Santidade é, também, aquisição de hábitos santos, aprendidos na relação com Deus. O caminho é esse e é o único possível porque sem santidade ninguém verá o Senhor (Hb. 12. 14).

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