Conhecerão a verdade, e a verdade os libertará.
João 8. 32
Duas noites atrás tive um sonho inquietante. Vocês já devem ter visto um instrumento de tortura masoquista no qual a “vítima” de pendura através de ganchos presos à pele. Essa imagem é bastante vívida em mim através do filme A cela, com Angelina Jolie. Naquela noite sonhei que estava preso um instrumento assim.
Pendurado há alguns anos, músculos atrofiados, dor imensa em cada ponto de meu corpo que se prendia por aqueles ferros. Em alguns locais, como pelas minhas costas, passavam correntes interligando vários ganchos. Preso ali, no sonho, fazia anos que não conseguia agir de forma alguma. Apenas sofria com aquela dor cruel que lacerava a alma.
Em um determinado momento em meu sonho, alguém vinha me resgatar. Ao que me parece, era minha família. Começaram a me soltar dos ganchos que me prendiam. Quando fui libertar do último ponto de prisão, a corrente que passava por minhas costas, pedi que me dessem o alicate porque tinha medo da dor que viesse a sentir. Eu mesmo cortei a corrente e a puxei do meu corpo. Seguro por meus resgatadores, a última coisa que me lembro é de, musculatura da perna atrofiada pelos anos de prisão, tinha de ser carregado: não tinha forças para andar. Ao acordar desse sonho angustiante, tive rápida percepção de que ele tinha sentido. Mesmo que naquele momento, meio da madrugada, não pudesse entender. Precisava buscar entendê-lo no dia seguinte.
Ontem à noite conversava com uma amiga de Fortaleza pela Internet. Falávamos sobre tantas coisas que nos fazem sentir presos na vida e eu me lembrei do sonho. E comecei a entendê-lo. Sinto-me preso, como muitos outros com quem tenho partilhado nos últimos tempos. Estamos presos por circunstâncias sociais praticamente intransponíveis. Estamos presos por visões parciais de mundo presente em nossos contextos. Estamos presos, imobilizados, pelos formalismos e estreitamentos de nossas comunidades religiosas.
Duas coisas me chamaram mais atenção no meu sonho. Dois recados que pude compreender distintamente. Primeiro: eu estava preso em um instrumento de masoquismo. Isso significa que eu estava preso – inicialmente, pelo menos – por vontade própria. Eu quis subi ali e sofrer ali. Mesmo que viesse a me arrepender quando nada mais pudesse ser feito. A segunda coisa que para mim se destaca é que estava preso há tanto tempo que já não podia andar mais sozinho. Não tinha forças para a vida em liberdade.
Conhecerão a verdade, e a verdade os libertará. Quando Jesus fala isso aos judeus, estes não conseguem compreender o que o Mestre diz pelo simples fato de que não conseguem se ver como escravos do que quer que seja: Nós somos descendentes de Abraão e nunca fomos escravos de ninguém. Como é que você diz que ficaremos livres? (Jo. 8. 33). Este é um de nossos grandes problemas. Estamos presos, imobilizados, por uma série de coisas que nos cercam e fazem de nós como que pequenos marionetes de circunstâncias que julgamos maiores que nós. Mas não somos capazes de nos vermos assim. Estamos satisfeitos com tudo, mesmo que doa muito estar preso por ganchos que nos rasgam a pele. E se estamos satisfeitos, se não vemos a prisão em que estamos, como poderemos ser libertos? Como poderemos desejar ser libertos?
Jesus veio ao mundo para nos libertar de todas as nossas prisões. De todos os poços escuros em que fomos enfiados. De todos os lugares difíceis dos quais queremos sair. E daqueles dos quais não queremos sair. Ele veio nos libertar do império das trevas. Ele veio nos transportar para o Seu Reino de Amor Eterno. Pela graça.
Talvez seja preciso que antes Ele nos abra os olhos. Na seqüência do evangelho de João (9), o evangelista narra a cura de um cego de nascença e todas as conseqüentes confusões provocadas por essa cura. No meio da narrativa, Jesus discute com os fariseus: Eu vim a este mundo para julgar as pessoas, a fim de que os cegos vejam e que fiquem cegos os que vêem. Alguns fariseus que estavam com ele ouviram isso e perguntaram: - Será que isso quer dizer que nós também somos cegos? – Se vocês fossem cegos, não teriam culpa! – respondeu Jesus. – Mas, como dizem que podem ver, então continuam tendo culpa (Jo. 9. 39 – 41). Jesus, o Libertador, liberta-nos primeiro de nossa cegueira. Cegueira a respeito de nossa própria situação de escravidão. Os fariseus não se viam como escravos de coisa alguma, muito menos do pecado. Jesus lhes abriu os olhos. Agora não tinham mais desculpas. Se querem permanecer na vida que levavam até então e no sofrimento de sua escravidão, a responsabilidade agora era completamente deles. O Libertador está ali, diante deles, para trazer-lhes nova vida. Basta crer.
Do mesmo modo, conosco. Muitas vezes, nos colocamos em prisões que nos maltratam dia após dia. Somos, nessas prisões, muitas vezes, como simples marionetes. Jesus, o Libertador, está diante de nós para nos livrar. Conhecerão a verdade, e a verdade os libertará. É preciso que queiramos mudar o que precisa ser mudado em nossas vidas. Não temos desculpas para aceitar que a situação continue como está. E se não temos forças para caminhar com nossas próprias pernas, caso deixemos os ganchos e correntes que nos prendem, ainda bem. Porque poderemos aprender a ser conduzidos pelo Senhor dos Exércitos. Tu, ó Senhor Deus, és tudo o que tenho. O meu futuro está nas Tuas mãos; Tu diriges a minha vida (Sl. 16. 5).
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