Salmo 31.1
As cenas de guerra e seus respectivos refugiados sempre nos impressionam. Milhões de pessoas que fogem, fogem, por vezes, sem destino, caminhadas sem um sentido claro, orientam-se unicamente pelo desejo ardente de escapar, de sobreviver.
São os sírios cruzando o Mediterrâneo em barcos que também colocam em risco suas vidas. São corredores humanitários para remover civis devastados de cidades como Aleppo.
Foram judeus fugindo de áreas ocupadas pelas tropas alemãs na segunda guerra. São os palestinos, vítimas de Israel, cercados e subjugados em Gaza e na Cisjordânia.
Sempre desejamos fugir para salvar a nossa vida quando uma ameaça assim nos visita. É instinto.
O instinto só consegue ser subjugado quando nossa vitalidade ou nossa energia já não estão mais lá. Quando cansamos de fugir ou quando o sofrimento nos devastou tanto ou quando a dor nos fez desistir. Queremos só ficar para trás e morrer.
Estou lendo “Em busca de sentido”, de Viktor Frankl, que conta sua experiência nos campos de concentração nazista, especialmente Auschwitz. Em determinado momento ele explica o que são os cupons-prêmio que prisioneiros recebiam em função de realizarem algum trabalho mais perigoso, que lhes expunha a vida em risco. Cada um valia 50 centavos e podia ser trocado por seis cigarros. Certa vez, ele recebeu dois cupons - tinha, portanto, o equivalente a 12 cigarros. Só que 12 cigarros podiam ser trocados por 12 sopas. Ele explica:
(…) [os prisioneiros comuns] costumavam trocar por gêneros alimentícios aqueles cigarros que recebiam através de cupons-prêmios (…) a não ser que tivessem desistido de continuar vivendo, por terem perdido as esperanças, resolvendo ‘gozar’ os últimos dias de vida que ainda tinham pela frente. Quando um colega começava a fumar seus poucos cigarros, já sabíamos que havia perdido a esperança de poder continuar - e, de fato, então não aguentava mais.
Podemos desistir. É uma possibilidade que sempre está no nosso horizonte. Eu mesmo, você deve saber, desisti. Por mais de uma vez. Diante de uma situação impossível, de uma dor imensurável, de um vazio intransponível, eu desisti. Tentei fumar os meus cigarros, sem esperança.
Mas, ainda assim, não era o fim.
Por pior que a situação pareça, não é o fim.
Eu corro para ti, ó Eterno; corro por minha própria vida.
Voltar-me ao Eterno não foi uma opção por aumentar o prazer na vida, por ver as orações e súplicas (as mais difíceis) atendidas, por ver os desejos do coração, finalmente, realizados pela mão do Senhor.
Voltar-me ao Eterno foi tão-somente a única opção que eu tinha pela vida. Um dia, percebi que não aguentava mais tal sofrimento e me coloquei a correr para o Senhor.
Correr para o Senhor não é qualquer corrida. Para mim, era correr por minha própria vida.
Sua história pode não incluir os momentos duros e dolorosos que a minha incluiu. Pode não chegar nem perto do nível de desesperança de um prisioneiro de Auschwitz que decidiu fumar seus cigarros. Independente do que signifique e do que traduza, vale para mim, para você ou para qualquer outra pessoa em sofrimento: correr para o Eterno é correr por sua vida. Estar nas mãos dele, diante dele, é reestruturar a vida em um novo centro, é construir na vida uma saída, uma nova esperança. É estar vivo e viver verdadeiramente sua vida.
Eu corro para ti, ó Eterno; corro por minha própria vida
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