Esta é a árvore genealógica de Jesus Cristo, filho de Davi, filho de Abraão:
(…)
Judá foi pai de Perez e de Zerá (a mãe deles foi Tamar),
(…)
Salmom foi pai de Boaz (a mãe de Boaz foi Raabe),
Boaz foi pai de Obede (a mãe de Obede foi Rute),
(…)
Davi foi pai de Salomão (a mulher de Urias foi sua mãe),
(…)
Jacó foi pai de José, marido de Maria,
Maria que foi mãe de Jesus,
Jesus, que foi chamado o Cristo.
Mateus 1. 1, 3, 5, 6, 16
Nem todo mundo tem uma família perfeita. Talvez nenhum de nós tenha. Possivelmente, dentre os nossos antepassados podem haver nomes que não devem ser mencionados, pessoas cujas histórias não devam ser contados às crianças. As famílias têm seus excluídos, não apenas no tempo presente mas especialmente no passado, na história.
Há raízes em nossas famílias que, por vergonhosas ou sujas, foram esquecidas, apagadas. Anselm Grün diz em seu livro “Raízes" que podemos santificar nossas famílias porque Jesus fez isso com a sua própria árvore genealógica.
Acho que a árvore genealógica construída por Mateus no início de seu evangelho é capaz de nos ensinar mais que isso sobre a graça de Deus, nossas famílias e o evangelho.
Sempre me chamou atenção naquele texto o fato de que, em um ambiente extremamente centrado nos homens e com as mulheres encaradas de uma maneira tão subalterna, há cinco mulheres na genealogia de Jesus. E, o melhor, não são mulheres quaisquer - são pessoas que, naturalmente, seriam vítimas dos piores preconceitos sociais e familiares. Não eram, digamos, mulheres honoráveis do ponto de vista social. Eram personagens que, possivelmente, muitas famílias gostariam de excluir de seu passado.
A primeira é Tamar (Gn 38). Nora de Judá, Tamar ficou viúva de dois de seus filhos por causa da lei do levirato. Temendo perdendo outro filho, Judá esqueceu a nora. A nora não esqueceu o sogro. Fez-se passar por prostituta, fez sexo com o sogro e dele engravidou. Em suma, Tamar se prostituiu, seduziu e enganou o sogro, sendo mãe de dois filhos com ele.
A segunda mulher que aparece na genealogia de Jesus em Mateus é a prostituta Raabe, de Jericó (Js 6). Se Tamar se prostituiu uma vez, para enganar o sogro, Raabe tinha a prostituição como seu ganha-pão, talvez sendo dona de uma casa que oferecia tais serviços em Jericó, antes de sua tomada por Josué e os hebreus saídos do Egito. Raabe, a prostituta, seria excluída da genealogia de muitos dentre nós.
Outra mulher que surge na genealogia de Jesus é, segundo o livro que leva seu nome no Antigo Testamento, avó do rei Davi. É a moabita Rute. Por que Rute seria, provavelmente, excluída das raízes genealógicas de muitas famílias judaicas? Por sua origem étnica:
Nenhum amonita ou moabita poderá entrar na congregação do Eterno, até a décima geração, tampouco seus filhos. Deuteronômio 23.3
Os moabitas eram excluídos da religião e da vida social de Israel. Ainda assim, segundo Rute, uma moabita seria avó de Davi e uma daquelas mulheres na genealogia de Jesus.
Provavelmente a mulher mais famosa na genealogia de Jesus, antes de Maria, é a mãe do rei Salomão, Bate-seba, cujo nome não foi diretamente referido por Mateus. Adúltera, engravidou do rei Davi, que agiu para matar seu marido Urias (2 Sm 11:1-27; 12:1-18; 1 Rs 1:1-48). Mateus referiu-a, relacionando o homicídio (“a mulher de Urias”). Bate-seba, adúltera e, talvez, cúmplice do homicídio de seu marido, seria alguém que muitos dentre nós excluiríamos das nossas árvores familiares - mas ela faz parte da árvore de Jesus.
A última mulher, Maria, mãe de Jesus, também tem uma característica socialmente reprovável. Mãe solteira, Maria engravidou antes de casar-se com José.
Para mim, é muito significativa a presença dessas cinco mulheres na genealogia de Jesus segundo Mateus. Primeiro, por serem mulheres em uma sociedade que relegava as mulheres a uma situação ainda mais baixa que muitas da contemporaneidade. "Oh, Senhor muito obrigado por não ter nascido gentio, escravo e nem mulher”, oravam os judeus, o que, por si só, torna significante a citação a mulheres.
E não eram quaisquer mulheres - eram mulheres normalmente excluídas socialmente.
Tais elementos, para mim, significam duas faces da mesma moeda. Em primeiro lugar, que Jesus é para todos, especialmente os excluídos, os menos significativos, os mais perseguidos, para aqueles que muitas vezes preferiríamos esquecer. Por outro lado, significa também que qualquer história, seja pessoal, seja familiar, é importante e, assim, Deus pode se tornar conhecido e pode ser a salvação de qualquer um a partir de qualquer história de vida, inclusive e especialmente aquelas que a sociedade mais despreza.
Nenhuma história é insignificante ou impossível. Nem mesmo a sua.
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