1.4.05

Sobre morrer e viver

Ele foi pai de outros filhos e filhas, e morreu...

Gênesis 5. 4 e 5; 10 e 11; 13 e 14; etc.

A iminência da morte do Papa João Paulo II me remeteu a este capítulo fascinante do livro de Gênesis. Contando a história de personagens como Adão, Sete, Enos, Matusalém, o autor pontua o fim de cada biografia com a frase simples e profunda: e morreu.

A repetição dessa constatação parece servir para que o leitor fixe, com muita clareza e com muita certeza, que há uma coisa na vida que é inescapável: cada um desses patriarcas, mesmo tendo vivido centenas de anos, um dia, morreu. Nós morreremos também porque a morte é certa.

Mas a morte certa aponta para nós a importância da vida. De vivermos uma vida que faça toda diferença.

Morremos sós, diz a sabedoria popular. Mesmo tendo tido filhos e filhas incontáveis, cada um dos personagens dessa capítulo se distingue por duas coisas: longa vida e morte certa. Certa e solitária.

Todas biografias são iguais, à exceção de uma. Enoque é, dentre estes, quem viveu menos anos na terra. E é o único que não experimenta a morte. Enquanto Cainã, por exemplo, morre com novecentos e dez anos de idade, Enoque fica na terra até os trezentos e sessenta e cinco anos. E, ainda assim, não experimenta a morte.

O que é diferente na vida de Enoque? Enoque viveu em comunhão com Deus durante trezentos anos... Ele viveu sempre em comunhão com Deus e um dia desapareceu, pois Deus o levou (Gn. 5. 22 e 24). Ele viveu sempre em comunhão com Deus. A vida de intimidade com Deus fez toda a diferença.

A certeza da morte deve nos empurrar a uma vida que valha a pena e faça diferença. E essa vida só pode ter lugar a partir do instante em que o ser humano se dispõe a andar em comunhão com Deus.

O caminho para essa comunhão foi traçado por Jesus. O preço foi pago por Ele. Viver uma vida que valha a pena, uma vida intensa, por menor que seja, é caminhar na comunhão com Deus por meio de Jesus. É pôr o Senhor como prioridade mais absoluta de cada passo e de cada coisa na vida. Para que a morte, mesmo que venha (e virá) não nos apanhe de surpresa e não se torne um momento difícil, mas seja o cume de uma caminhada com Deus em que Ele fez diferença em nós e através de nós. A morte certa deve nos inspirar a viver com intensidade cada momento e vivê-lo sempre na presença do Deus vivo.

Isso me conduz a duas passagens biográficas dos escritos de Paulo. Primeiro, ele diz aos filipenses algo radical e tremendo. Que deveria estar nos umbrais de nossas portas, nos instigando e desafiando a cada dia. Ele diz: Para mim viver é Cristo, e morrer é lucro (Fp. 1. 21). Viver uma vida de comunhão com Deus, na intimidade, implica não ter a própria vida como prioridade, como coisa mais preciosa, mas entender que tudo de importante existe apenas em Cristo. Por isso, uma vida de comunhão com Deus vale a pena e nos leva a experimentar a morte como lucro.

Uma outra passagem biográfica de Paulo que nos deveria empurrar para uma vida diferente da que estamos vivendo – empurrar a uma vida a tal ponto diferente que Deus teria o desejo de nos levar ao Seu colo como fez com Enoque – está em sua carta a Timóteo: Quanto a mim, a hora já chegou de eu ser sacrificado, e já é tempo de deixar esta vida. Fiz o melhor que pude na corrida, cheguei até o fim, conservei a fé. E agora está me esperando o prêmio da vitória, que é dado para quem vive uma vida correta, o prêmio que o Senhor, o justo Juiz, me dará naquele dia, e não somente a mim, mas a todos os que esperam, com amor, a sua vinda (2 Tm. 4. 6 – 8).

A certeza da morte deve nos inspirar a uma vida de comunhão íntima com o Senhor, através de Jesus Cristo. Um dia, vamos morrer. Mas podemos fazer tudo valer a pena, como fez Enoque, priorizando as coisas mais importantes.

Um dia, vamos morrer. Mas se a nossa vida tiver feito diferença, se tivermos vivido com Deus, teremos a tranqüilidade e a paz daquele que chega ao fim da jornada com a alegria do dever cumprido: fiz o melhor que podia e sei que agora minha comunhão com Deus continua, porque o viver é Cristo e o morrer é lucro.

Daniel Dantas

Missionário da 1ª IPI do Natal

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