30.12.06

Elias

Agora eu sei que o senhor é um homem de Deus e que Deus realmente fala por meio do Senhor!
1 Reis 17. 24

Queria ser reconhecido e viver em uma comunidade que fosse reconhecida por ser instrumento por meio de quem grandes libertações e milagres se operassem. Elias era um homem assim. Era um profeta cujo poder se funda em sua relação com o Senhor. Em sua intimidade e comunhão com o Pai ele é conduzido à casa de uma viúva em Sarepta. Ali, ela mora sozinha com seu filho e se prepara para cozinhar o último pãozinho e, então, morrer de fome ao seu lado naquela terrível seca.
Quando o profeta chega, Deus muda tudo por meio dele. Não se preocupe! Vá preparar a sua comida. Mas primeiro faça um pãozinho com a farinha que você tem e traga-o para mim. Depois prepare o resto para você e para o seu filho. Pois o Senhor, o Deus de Israel, diz isto: “Não acabará a farinha da sua tigela, nem faltará azeite no seu jarro até o dia em que eu, o Senhor, fizer cair chuva” (1 Rs. 13 – 14). Ninguém morrerá de fome. Deus suprirá as necessidades do Seu profeta e daquela viúva e seu filho. Enquanto a seca existir, a farinha e o azeite não se acabarão. Um grande milagre operado pela mão do Senhor naquele lugar.
Um outro grande milagre acontece quando o menino adoece e, finalmente, morre. Deus, atendendo a oração do profeta, o ressuscita. A presença de Deus na pessoa de Elias altera o quadro de maneira tremenda na casa daquela viúva. Reverte uma situação de fome e miséria de maneira miraculosa. Cura e ressuscita mortos por meio da vida do profeta. Queria ver essa realidade em minha vida e na da minha comunidade: a presença de Deus ser tão absolutamente perceptível que transforme situação de forma fantástica, ressuscitando mortos, curando enfermos, realizando milagres inauditos.
Além de sinais e maravilhas, a presença de Deus na vida do profeta expõe os segredos. A percepção da santidade de Deus envolvendo aquele homem provoca uma reação interessante na viúva. Ciente da santidade de Deus, ela teme e percebe o seu próprio pecado e sua sujeira pessoal. Homem de Deus, o que o senhor tem contra mim? Será que o senhor veio aqui para fazer com que Deus lembrasse dos meus pecados e assim provocar a morte do meu filho? (1 Rs. 17. 18). Ela vê o Deus santo no profeta e percebe-se como pecadora. Por isso, quando seu filho adoece ela acusa Elias de estar ali apenas para expor seu pecado diante de Deus.
Queria ser reconhecido e viver em uma comunidade que fosse reconhecida pela presença viva de Deus em seu meio. Presença que impactasse profundamente as vidas, que expusesse sua necessidade de perdão e de transformação, porque eu e minha comunidade estaríamos refletindo a presença santa e gloriosa do Senhor. Eu queria viver a experiência relatada em cada avivamento de que apenas pela presença de Deus na vida das pessoas, vidas eram salvas, corações se arrependiam, milagres aconteciam. A presença de Deus era tão perceptível na vida de Elias que a viúva foi impactada e transformada pelo sopro da santidade do Senhor.
Por fim, queria ser reconhecido e viver em uma comunidade que fosse reconhecida como sendo do Senhor e por meio de quem Deus fala aos homens. Agora eu sei que o senhor é um homem de Deus e que Deus realmente fala por meio do Senhor! Toda essa história serviu para que a consciência e o entendimento daquela mulher se estabelecesse. Ela, extasiada, conclui que aquele homem é especial: ele é de Deus e por meio dele o Senhor Santo do universo fala aos homens.
Não é apenas um desejo. Creio, muito mais, que seria a obrigação de todo aquele que foi resgatado pelo Senhor ser reconhecido dessa maneira que aponta o texto sobre Elias. Fomos resgatados pelo Senhor com o propósito de fazermos o Seu nome glorificado em toda a terra. Nesse propósito, existimos para torná-Lo conhecido e fazermos a Sua palavra anunciada entre todos os povos. Por isso, devemos viver, buscando com todas energias a presença de Deus, para que possamos ser instrumentos de Seus milagres – que O glorificam –, para que Sua presença em nós leve o Seu temor àqueles que precisam ainda conhecê-Lo e para que possamos ser reconhecidos como servos e servas de Deus, por meio de quem Ele dirige a Sua Palavra à humanidade.

28.12.06

Profecia

Um profeta chamado Elias, de Tisbé, na região de Gileade, disse ao rei Acabe: - Em nome do Senhor, o Deus vivo de Israel, de quem sou servo, digo ao senhor que não vai cair orvalho nem chuva durante os próximos anos, até que eu diga para cair orvalho e chuva de novo.

1 Reis 17. 1

Às vezes eu penso que algumas pessoas imaginam que o profetismo surge dentro de alguma forma de estrutura – carismática – que, de certa maneira, pode ser controlada e conhecida. Aliás, alguns imaginam um profetismo que se resume à “quiromancia” travestida de piedade. O que o texto bíblico nos fala sobre os profetas é que são homens e mulheres que se colocam diante da comunidade com uma Palavra de Deus especialmente dirigida a ela. Pode ser divinatória, mas a maior parte das vezes é simplesmente uma manifestação da vontade de Deus para uma situação específica que o povo enfrenta.

De onde vem a autoridade do profeta? Tenho a impressão que em muitas comunidades a autoridade do profeta vem de três estruturas que, na história de Elias, são confrontadas.

Em primeiro lugar, a autoridade de Elias não vem da sua família. Não é uma questão de berço, não é uma questão de nascimento. Ele não se tornou profeta porque seu pai era profeta. Aliás, a Bíblia não nos fala sobre sua família. Ele é simplesmente um profeta da cidade de Tisbé, que não tem genealogia conhecida. Até pode ser que seu pai tenha sido algum líder usado pelo Senhor, mas o que o texto nos diz é que essa não é a questão importante. Não é nesse fato que o profeta deve ancorar sua autoridade e o poder com o qual anuncia a mensagem que tem a dizer. O profeta deve esquecer a história familiar ou pessoal – sua capacidade, seu dinheiro, seu saber – se quer mesmo falar em nome do Senhor.

Em muitas comunidades de nossos dias as lideranças são transferidas de pais para filhos. Em muitas de nossas igrejas os problemas familiares se convertem em sérios problemas de liderança unicamente porque as estruturas familiares têm se transformado nas próprias estruturas das igrejas. Elias, o homem sem genealogia e sem família, nos ensina que a autoridade profética independe de sua história pessoal ou familiar.

A autoridade de Elias também não parece derivar de nenhuma escola profética. Não é a estrutura do profetismo de Israel, suas escolas e seus grupos que andavam juntos por toda a parte, que parece dar força à pregação de Elias. O texto não nos diz que Elias fazia parte de algum grupo como esse nem que tenha aprendido o ofício profético com outro. É de notar, no entanto, que, como líder, formava-se um grupo profético em torno de Elias, cuja figura principal vem a ser Eliseu. Mas, para começar seu ministério, Elias não depende de ter andado com qualquer grupo de profetas – pelo menos isso não é importante para validar seu poder e sua autoridade como profeta.

Nos nossos dias, em muitas igrejas, se o profeta não tem o aval formal do grupo de liderança teológica e religiosa, não será acreditado. O líder precisa ser ungido pelo Apóstolo, Presbitério, Convenção, Concílio. Se não houver o aval dessa escola, o profeta não tem ministério. Elias não parecia pensar nessa necessidade quando surgiu anunciando a seca do juízo de Deus.

Por fim, a autoridade profética de Elias não dependia de qualquer forma de poder. Aliás, ele se levanta para enfrentar o poder constituído de Israel – o poder religioso dos profetas de Baal e Jezabel, o poder político de Acabe. Ele é profeta especialmente contra o poder instituído. Sua autoridade profética não acontece em resultado do poder político validar sua ação. Ao contrário, ele é visto como inimigo por parte dos poderosos: Quando Acabe viu Elias, perguntou: - Você já me achou, meu inimigo? (1 Rs. 21. 20).

Essa é uma realidade muito viva nas nossas comunidades. É o poder secular do profeta quem lhe dá autoridade. Conheço uma igreja em que as lideranças só podem ser eleitas se tiverem nível superior de estudo. Essa é uma regra estabelecida. Mas conheço comunidades que possuem regras tácitas em que os mais humildes não podem subir ao púlpito para transmitir a Palavra de Deus. A autoridade profética nessas comunidades é diretamente proporcional ao poder econômico e político que o profeta detém.

A autoridade profética de Elias não deriva de nenhuma dessas estruturas. A nossa também não deve derivar. A autoridade do profeta é resultado de uma vida de compromisso e comunhão absoluta com o Senhor que o envia a falar. A mensagem que há de ser transmitida não é uma palavra qualquer, mas é a Palavra de Deus. É essa certeza que é Deus quem fala que impulsiona Elias a uma palavra tão dura e certa quanto essa: Em nome do Senhor, o Deus vivo de Israel, de quem sou servo, digo ao senhor que não vai cair orvalho nem chuva durante os próximos anos, até que eu diga para cair orvalho e chuva de novo.

Como cristãos e como Igreja do Senhor somos convocados a viver sob a dimensão do poder profético que deriva do compromisso, comunhão e vida com Deus. Ouvindo a Sua voz para falar a Sua Palavra dirigida às situações nas quais ela é necessária.

Uma coisa que sempre me causa admiração em Elias é o seu grau de compromisso. Ele é um homem que descobriu que a vida com Deus é a coisa mais importante que pode haver. Não importa se vai viver desconfortavelmente, no meio do deserto, sendo alimentado por corvos. Não importa se vai andar, vestido de peles, pelo interior do país, sem o menor conforto. Ele sabe que a coisa mais importante que existe é o Senhor. Diante do Senhor, todas as demais coisas se tornam secundárias, menores e desimportantes. É esse grau de compromisso que alimenta em Elias o seu espírito profético. É esse grau de comprometimento que eu quero descobrir em minha vida.

27.11.06

Conseqüências

Vamos nos separar!
Gênesis 13. 9

Como seres humanos que somos, somos passíveis de erros. E a maior parte dos nossos erros se deve ao fato de desprezarmos aquilo que Deus, explicitamente, define como Sua vontade. Erramos por não ouvir a voz de Deus, por não obedecê-la.
Ao chamar Abrão, em Gênesis 12, Deus foi muito claro e específico: Saia da sua terra, do meio dos seus parentes e da casa do seu pai e vá para uma terra que eu lhe mostrarei (Gn. 12. 1). A promessa de Deus se relacionava a Abrão deixar sua terra e sua família e ir para uma terra estranha, sozinho. Esse era o centro da vontade divina para o vocacionado Abrão: estar só, em terra desconhecida, longe de suas referências familiares.
Só que Abrão desobedece, fato que passa despercebido pela maioria de nós. E Ló foi com ele (Gn. 12. 4). Era para Abrão deixar a família, mas ele levou seu sobrinho. Ouvir a voz de Deus, na Bíblia, nunca demais lembrar, é obedecer. Ninguém duvida que Deus foi muito claro e especifico com o patriarca quando o chama para deixar sua casa e sua família. Abrão escutou isso, mas não ouviu. Não obedeceu.
Quando fazemos as coisas sem dar ouvidos ao conselho do Senhor, sofremos as danosas conseqüências. O exemplo mais clássico na história bíblica aparece em Josué 9. Ali os gibeonitas armam uma cena para fazer acordo com os israelitas e escaparem da destruição. Fingem ser viajantes de um país distante. Quando o acordo é fechado, o texto bíblico é claro sobre a atitude do povo de Deus: Os homens de Israel aceitaram a comida deles, porém não pediram conselho a Deus, o Senhor. Josué fez um acordo de paz com os gibeonitas, prometendo que não seriam mortos. E os líderes do povo de Israel juraram que cumpririam a sua palavra (Js. 9. 14 – 15).
Abrão desobedeceu levando seu sobrinho consigo na viagem. O que esse texto me ensina, porém, é que quando Deus tem um plano e revela a Sua vontade, Ele intervém em nossa vida, miraculosamente, para nos colocar no prumo de novo. Deus intervém para que Sua vontade prevaleça, apesar de nossa desobediência.
Abrão desobedeceu, mas logo logo surgiu uma briga entre os trabalhadores dele e de seu sobrinho, o que forçou uma separação. Vamos nos separar!
Essa história nos ensina algumas conseqüências de desobedecermos a vontade de Deus. Ele fará seu plano voltar ao centro, nem que para isso tenha que intervir da forma como interveio na vida de Abrão. Nunca é agradável ter de voltar ao centro da vontade do Senhor à força. É sempre melhor ter os ouvidos atentos e o coração disposto a obedecer. Mas precisamos saber que Deus vai fazer o Seu projeto se realizar em nossa vida, apesar de nós.

18.11.06

Prova de fé

O mundo não era digno deles!
Hebreus 11. 38

O que prova a fé de alguém? Se fizéssemos essa pergunta às igrejas de nossos dias teríamos, certamente, respostas as mais diversas. Na enorme diversidade das igrejas dos nossos dias, encontraríamos pessoas que, firmadas em suas diferentes crenças, definiram provas diferentes da fé dos cristãos.
A programação televisa cristã, especialmente forte aos sábados pela manhã, dá prova disso. São igrejas de matizes e teologias distintas defendendo conceitos absolutamente diferentes uns dos outros do que seja a fé e de como ela se prova.
Estava pensando nisso hoje ao refletir sobre o conhecido texto de Hebreus 11. Aquela galeria de homens dos quais o mundo não era digno. Ao ler essa lista de pessoas que descobriram que a fé é a certeza de que vamos receber as coisas que esperamos e a prova de que existem coisas que não podemos ver (Hb. 11. 1) e que, descobrindo essa fé, acharam a salvação, me perguntei que provas elas obtiveram de sua fé. E que resultados visíveis elas tiveram.
Comecei a me questionar isso porque, a julgar pelo que pregam alguns hoje em dia, a fé se traduz em resultados visíveis, sempre. É uma cura, uma libertação, a prosperidade material. A fé se manifesta quando eu deixo de ser o caso perdido que eu era e encontro uma saída. A fé, nessa teologia, precisa de prova.
Não precisamos olhar com atenção aprofundada o texto para descobrir que essas idéias não se sustentam. A fé diz respeito a saber da existência de coisas que não podem ser vistas ou tocadas. Fundamentalmente é isso. É viver como quem vê um Deus que é invisível, como quem vive uma salvação que é improvável, como quem experimenta uma qualidade de vida impossível.
Boa parte de nossa geração de cristãos busca sinais. Busca resultados. Busca uma prova de fé. Milagres acontecem em resposta a nossa fé, mas a fé não é uma chave automática para milagres. A vontade de Deus é. Sua Glória e Sua Majestade são. Os milagres acontecem para honrar a Deus e não a nossa fé.
E eles acontecem. É só olhar a primeira parte do capítulo 11 de Hebreus para ver isso com clareza. Ou olhar para a minha e a sua vida. Temos muitos milagres para partilhar. Pela fé eles lutaram contra nações inteiras e venceram. Fizeram o que era correto e receberam o que Deus lhes havia prometido. Fecharam a boca de leões, apagaram incêndios terríveis e escaparam de serem mortos à espada. Eram fracos, mas se tornaram fortes. Foram poderosos na guerra e venceram exércitos estrangeiros. Pela fé mulheres receberam de volta os seus mortos, que ressuscitaram (Hb. 11. 32 – 35).
O equívoco está em acreditar que milagres são as únicas conseqüências possíveis para a fé. O mesmo texto aponta o equívoco. Enquanto alguns foram libertados e viram tremendos milagres, outros foram torturados até a morte; eles recusaram ser postos em liberdade a fim de ressuscitar para uma vida melhor. Alguns foram insultados e surrados; e outros, acorrentados e jogados na cadeia. Outros foram mortos a pedradas; outros serrados pelo meio; e outros, mortos à espada. Andaram de um lado para outro vestidos de peles de ovelhas e de cabras; eram pobres, perseguidos e maltratados. Andaram como refugiados pelos desertos e montes, vivendo em cavernas e em buracos na terra. O mundo não era digno deles! (Hb. 11. 35 – 38). A história da igreja e do testemunho de Cristo nos diz que na maior parte das vezes a fidelidade ao Senhor teve como resultado, não o milagre e a libertação do crente, mas a tortura, o sofrimento, a perseguição e a morte.
Jesus venceu, não descendo da cruz, mas morrendo na cruz. Por isso, eu penso que é muito fácil para mim afirmar a minha fé quando eu estou com minhas dívidas pagas em dia ou quando eu passo em um concurso da Petrobras, ou quando recebo o milagre de uma cura e, por isso, agradeço, feliz, ao meu Deus. Mas sei que minha fé seria, de verdade, provada, se uma arma fosse posta em minha cabeça sob a ameaça de morte, caso não renegue a minha fé em Jesus. Ou quando eu fosse desafiado a crer, ainda que não tivesse um teto ou comida para comer. Enquanto estava no Rio vi uma fé dessas: um homem se preparava para dormir sob uma marquise da avenida Presidente Vargas, lendo sua Bíblia apoiado na luz de uma agência bancária. Essa é a verdadeira prova de fé, pela qual ainda não passei.

23.9.06

Relacionamento

Alguns de vocês não conhecem a Deus.
1 Coríntios 15. 34

Estou aqui no Rio desde o início de julho. De início, meu relacionamento com novos colegas se restringia àqueles que vieram comigo do Rio Grande do Norte. Éramos oito. Com o tempo, o círculo aumentou para os cearenses que vieram no mesmo vôo que nós. No primeiro mês, estávamos juntos cerca de trezentos novos empregados da Petrobras, das mais diversas formações. Era difícil estabelecer laços e formar amizades.
Apenas quando os profissionais de comunicação se separaram do grupo, nossos relacionamentos se estreitaram. E, ainda assim, com limitações: somos 123, divididos em duas turmas. Isso indica ser impossível um pleno relacionamento com todos eles. De alguns colegas da outra turma eu nem sei o nome.
Contei essa história porque essa semana percebi a repetição de um fenômeno comum na minha vida. Percebi que tenho intimidade hoje com especialmente dois colegas que, no início, jamais passaria pela minha cabeça a possibilidade de que se tornassem bons amigos. Tudo porque uma primeira experiência, um primeiro contato, uma primeira conversa não foi das melhores. Começamos com atritos, mas com o tempo, a convivência, a conversa e a intimidade percebemos muito mais coisa em comum e a amizade foi nascendo. O fenômeno de que a conversa e a intimidade me faz construir amizade e relacionamento com pessoas que jamais imaginei ser possível se deu novamente.
O que isso tem a ver com o texto? Alguns de vocês não conhecem a Deus. Tenho a impressão que nossas comunidades estão repletas de cristãos, sinceramente alcançados por Jesus, mas que, de verdade, não conhecem a Deus. Pessoas que querem servir a Jesus melhor, mas que não têm um relacionamento vivo e eficaz com Ele.
A experiência que eu relato é para mostrar que ninguém é capaz de realmente conhecer outra pessoa e desenvolver relacionamento com ela se não investir tempo e energia em intimidade, comunhão e diálogo. Isso vale muito no que diz respeito a nosso relacionamento com Jesus.
Existem muitos cristãos sinceros que, no entanto, não conseguem dispor tempo nem investir energia no relacionamento pessoal com Deus. Pessoas que até podem querer conhecer a Deus, mas não vão conseguir porque esquecem o fundamental.
Conhecer Jesus não é uma questão de seguir ritos religiosos nem regras eclesiásticas, sejam elas práticas ou morais. Conhecer Jesus é um processo que se dá na construção de um relacionamento efetivo com Ele, por meio da busca de intimidade, da comunhão e do diálogo.
Essas coisas vão acontecer a corações que efetivamente se rendam e caiam na presença de Deus. A presença se alcança não através de ritos religiosos, mas sim por meio de corações rendidos e quebrantados. É no lugar secreto – não no templo -, no coração – não no meio do povo -, que rendemos o coração e encontramos a doce e maravilhosa presença de Jesus. É um encontro em nossa privacidade e não um ritual coletivo.
E nesse privado, algumas ferramentas são fundamentais, ainda que digam mais respeito à atitude. Os corações sedentos se encontrarão com o Senhor à medida que se renderem em descobrir a Sua Palavra por meio da leitura bíblica, redimensionarem a sua vida por meio da reflexão e buscarem a intimidade do Senhor e Sua comunhão através do diálogo que é a oração. Nunca houve nem haverá outro caminho para se chegar à amizade e intimidade com o Senhor que não seja leitura e reflexão da Palavra e oração.
Talvez você se assuste porque conhecer a Jesus é conhecer a si mesmo, porque a Sua luz revela o nosso interior. Temos medo de nós mesmos e de nos vermos com clareza. Talvez isso seja assustador. Mas vale a pena romper o medo e buscar conhecer, verdadeira e intensamente, a maravilhosa pessoa do Deus Triúno.

19.9.06

Meu povo

Sinto uma grande tristeza e uma dor sem fim no coração por causa do meu povo, que é minha raça e meu sangue. Para o bem desse povo, eu mesmo poderia desejar receber a maldição de Deus e ficar separado de Cristo.
Romanos 9. 2 – 3

Vez por outra, a cena urbana me toca fundo no coração. Fico profundamente sentido e cheio de compaixão por algumas coisas que acontecem em nossas ruas. Já tive diversas vezes de escrever sobre isso.
Hoje, no fim de tarde, eu voltava aqui para o hotel pela avenida Rio Branco. Um senhor, aparentemente com mais de 50 anos, vinha pela rua, qual burro de carga, arrastando uma carroça de som que divulgava um dos candidatos a governador do Rio de Janeiro. Os cabelos brancos e a cara cansada daquele senhor que carregava um peso que judia até de animais calou fundo na minha alma. E mais uma vez fui levado a refletir sobre que povo é o nosso que coloca seus velhos e seus infantes em situações como essas? Quantas crianças sem futuro e quantos idosos sem reconhecimento por suas vidas?
De maneira quase óbvia o pensamento que sempre me domina nessas horas é a certeza de que preciso, de alguma maneira, contribuir para que essa desigualdade diminua. Trabalhar pela salvação dessa gente. Ainda que eu não saiba ainda direito como agir, estou certo de que a vivência do evangelho pela igreja brasileira passa pela transformação dessas questões tão prementes.
Sinto uma grande tristeza e uma dor sem fim no coração por causa do meu povo, que é minha raça e meu sangue. Para o bem desse povo, eu mesmo poderia desejar receber a maldição de Deus e ficar separado de Cristo. Esta paixão pelo seu próprio povo chega a ser emocionante nos textos de Paulo. Pela salvação de sua gente ele chega a dizer que estaria disposto a se perder. Em um mundo tão individualista quanto o nosso, acho difícil que exista alguém que esteja plenamente disposto a repetir essa oração paulina.
Mas o exemplo de Paulo deveria nos impulsionar. Existe um povo aí fora, que é o nosso povo, que anda cabisbaixo pelas ruas, sem muita perspectiva e muito futuro. Existe um povo cansado e sobrecarregado, a quem Deus quer nos enviar para fazer diferença.
O evangelho não é uma coisa que se esgote em nós. Ao contrário: seguir Jesus e o Seu evangelho é ser empurrado pela mensagem da graça e da vida de Deus para fora dos limites da igreja. É, também, ter a consciência paulina de que pouco vale a nossa boa vida sem que o nosso povo possa usufruir aquilo que já experimentamos. Transformar o mundo começa em viver o evangelho no mundo e no meio do povo em que estamos. Manifestar graça e amor nos conduz à luta pela mudança.
Neste início de noite, não houve melhor tradução do que era meu pensamento nem o desejo de meu coração do que a fala paulina na carta aos Romanos. Eu quero amar o meu povo e quero que ele possa conhecer a vida de verdade que só Jesus dá. Eu quero amar o meu povo e quero vê-lo mudando a forma como lida com suas crianças e seus velhos. Eu quero amar o meu povo e quero vê-lo rendido aos pés do Senhor, mas também quero vê-lo vivendo de forma digna desde já.
Em tempos difíceis como os nossos, quando nuvens de escuridão parecem querer surgir no horizonte de nossa história, o nosso povo precisa do amor da igreja de Cristo manifestando o amor e a graça de Deus no seu cotidiano. No mínimo, o povo precisa de nossa oração. Mas precisa muito mais de nossa presença, levando a luz, o poder e a graça de Jesus – a transformação de suas vidas.

17.9.06

Contra a esperança

Finalmente perdemos toda a esperança de nos salvarmos.
Atos 27. 20
Abraão teve fé e esperança, mesmo quando não havia motivo para ter esperança...
Romanos 4. 18


Lembro do testemunho de um pastor, missionário em país latino-americano em Guerra Civil, anos atrás. Capturados por guerrilheiros, ele e o grupo missionário, após alguns dias, estavam prontos para serem executados. Os guerrilheiros se prepararam para matá-los, enquanto os missionários oravam. De repente, do nada, a explosão de uma bomba em local próximo assustou o grupo. Imediatamente, os homens armados abandonaram o local, sem tocar nos reféns, deixando-os para trás. O incrível e miraculoso é que não houve outras explosões, fora aquela. Não houve bombardeios. Na hora limite, Deus providenciara o livramento ao grupo.
Lucas narra a viagem de Paulo, prisioneiro, até Roma. O navio, açoitado pelos ventos e pelo mar, com mais de duzentas pessoas a bordo, vai à deriva. Depois de vários dias de sofrimento e luta, a morte é certa, segundo Lucas: Finalmente perdemos toda a esperança de nos salvarmos. Mas, miraculosamente, por amor a Paulo, Deus preserva e salva a todos naquele navio: Paulo, não tenha medo! Você precisa ir até a presença do Imperador. E Deus, na sua bondade, já lhe deu a vida de todos os que estão viajando com você (At. 27. 24).
Nunca tinha me apercebido claramente do valor da fala do narrador Lucas nessa passagem. A situação era limite e toda a esperança tinha se esvaído. O que estava acontecendo era grave demais e não havia qualquer possibilidade de salvação. Fé e esperança não existiam mais.
Nem preciso lembrar que, não só nessas duas histórias, mas em muitos momentos limites de nossas vidas, vemos a esperança se acabar. Olhamos em volta e percebemos que nos encontramos sem qualquer possibilidade de saída. Seja uma arma apontada contra nós, seja um navio indo a pique, seja um diagnóstico médico que nos condena, seja uma situação que, complicada, fecha as possibilidades de caminho à nossa frente. Vez por outra enfrentamos situações limites que nos colocam diante da perda da esperança.
Ter fé nessas horas é uma loucura maior ainda. Porque a fé na salvação em uma situação assim é esperar contra todas as circunstâncias e possibilidades. O desenho de todo o quadro e as circunstâncias que nos envolvem só nos fazem ter certeza do desfecho contrário. Mas a fé é capaz de esperar contra toda a esperança.
Paulo é o esperançoso naquele barco. Ele é o homem de fé e é por causa da sua fé que todos são salvos por Deus. Ele é o mesmo que, anos antes, escrevendo para a igreja em Roma sobre Abraão, define o porquê de ele ter sido o pai de muitas nações: Abraão teve fé e esperança, mesmo quando não havia motivo para ter esperança... Naquele navio, como em outros momentos de sua vida, Paulo teve a chance de provar sua coerência. Se ele era capaz de falar sobre a fé de Abraão como aquela que faz o homem esperar, mesmo quando não nenhum motivo para se ter esperança, era preciso ser coerente e honesto para vivenciar isso na prática.
Muitas vezes nos encontramos em uma situação limite que nos desespera. Como era a situação naquele navio no Mediterrâneo que levava Paulo ou como era a situação daquele grupo missionário em mãos guerrilheiras. Situação que nos deixa sem qualquer perspectiva de esperança. Essa é a hora da fé. Contra o fim certo, contra a condenação do diagnóstico, contra a fatalidade das circunstâncias, é hora da fé que nos coloca a esperar contra toda a esperança e aguardar o socorro e o livramento do Senhor.

12.9.06

Partida

Saia da sua terra, do meio dos seus parentes e da casa do seu pai e vá a uma terra que eu lhe mostrarei.
Gênesis 12. 1

Por uma série de fatores, a maior parte de nós concorda com a fala da Dorothy do Mágico de Oz de que não existe lugar como o nosso lar. O nosso lar é um ninho de abrigo e proteção com o qual nos acostumamos ao longo de toda uma vida. Ali, temos o calor do amor, a proteção contra os perigos. Desde a mais tenra infância, sob as asas dos pais e dos parentes que nos amam, somos protegidos quando nos arriscamos em desafios. Mesmo quando os enfrentamos, sabemos que voltaremos ao lar no fim do dia.
Por fatores assim, é muito difícil para a maioria de nós abrir mão do cuidado e da proteção do lar. Deve ter passado isso na cabeça de Abrão, quando Deus lhe fez esse desafio. Era hora de largar tudo e enfrentar nova vida e novos desafios. O desconhecido estava à sua frente. Deus o chamava para abrir mão da segurança de toda uma vida e aceitar o imponderável à sua frente.
Por isso Abrão é o pai da fé. A atitude de largar tudo, deixar uma vida para trás e aceitar o desafio divino é a manifestação mais perfeita da fé naquele que falava. Somente a crença em algo muito poderoso pode nos impulsionar a largar tudo em busca de uma visão que, afinal de contas, nem está tão definida assim. O desafio de Abrão era complexo: deixar a vida segura que levava, abandonar aqueles a quem amava, o lugar de sua infância que afetivamente ainda o impressionava e ir para um lugar desconhecido – cujo caminho até lá era uma incógnita. Somente um jogo de fé profunda em Deus poderia suportar essa sua decisão. Somente lançando-se em um relacionamento profundo e real com o Criador Abrão poderia decidir-se e se realizar em sua decisão.
Às vezes nós estamos na mesma encruzilhada que Abrão – que afinal mudou de nome para Abraão. Somos desafiados a mudar de vida, a deixar para trás uma velha vida. Os nossos adolescentes, em torno dos 18 anos, passam por isso quando se vêem obrigados a deixar a velha escola e ingressar numa faculdade que, imaginam, decidirá o futuro de sua vida. Ao saírem, experiências semelhantes. Coisas assim acontecem em diversos momentos da vida da gente.
Tive um professor quando estudava missões que costumava dizer que precisamos ser desinstalados. Esse, para mim, é o segredo da realização da vida de fé com Deus. Isso significa fazer do coração o lar, local de encontro com o Deus vivo e pessoal por meio de Jesus Cristo. Assim, isso é estar disposto a deixar tudo e seguir a vocação de Deus, como Abrão.
Saia da sua terra, do meio dos seus parentes e da casa do seu pai e vá a uma terra que eu lhe mostrarei. Esta semana estive visitando minha terra, minha família. A partida é dolorosa. Somente a fé e o relacionamento com o Pai podem nos suportar nisso. Literalmente, Deus me fez o desafio de Abrão: deixar a terra, os parentes, a casa da família e ir para uma terra que eu não conhecia. Essa primeira etapa já tem dois meses, mas esse fim de semana percebi fortemente a grandeza da decisão de não mais voltar ao antigo lar.
Algumas coisas devem estar firmes no coração para nos motivar em horas assim. Primeiro, a certeza de que é o Senhor quem faz essas coisas. Se sou servo dEle, devo obedecer a Sua vontade – mesmo que isso signifique abandonar tudo o que mais amo na vida. Isso é fé.
Depois, movido por essa fé, devo estar certo de que vou para uma terra que Ele me mostrará. Ou seja, estou indo para o lugar e a situação que Ele planejou para mim. Ir, nesse caso, é permanecer no melhor lugar do mundo: o centro da vontade de Deus. Mesmo que o futuro seja invisível a olhos humanos e humanamente incerto, Deus estando à frente de tudo e guiando nossos passos nessa caminhada – pela fé – é motivo de segurança e realização.
O texto da vocação de Abrão continua dizendo algumas coisas, das quais quero destacar duas idéias: Os seus descendentes vão formar uma grande nação. Eu o abençoarei, o seu nome será famoso, e você será uma bênção para os outros (Gn. 12. 2). Ficar quieto no nosso cantinho, o lar que amamos e ao qual estamos acostumados, implica não receber as bênçãos que Deus tem reservado para nós, caso saíamos com fé de onde estamos. Ficar no nosso canto, acomodados, é abrir mão da novidade de vida que Jesus tem para nós.
Ficar é perder a bênção de receber da graça de Jesus o que Ele tem reservado. Mas ficar é, especialmente, perder a bênção de ser bênção para pessoas que ainda nem conhecemos. Não atender à vocação do Senhor de deixar tudo significa não permitir que muitos recebam bênçãos do Senhor que viriam por nosso intermédio.
Estou desinstalado e em trânsito. Por enquanto no Rio, em novembro em Salvador. Estou me sentindo realizado por saber que o caminho está sendo mostrado pelo Senhor. Estou feliz por estar atendendo à vocação dEle, por saber que Ele tem uma vida nova para mim – para a Sua glória – onde eu vá ou esteja. E estou plenamente satisfeito com isso porque sei que Deus me tirou do meu ninho não só para me abençoar ricamente, como tem feito, mas para me fazer ser bênção na vida de pessoas que nem imagino que existam, de maneiras que nunca passaram pela minha cabeça.
Na hora de decidir por deixar o ninho, atendendo uma vocação divina, lembre que Ele guiará você para o melhor lugar: o centro da Sua vontade. E você será plenamente realizado com as Suas bênçãos e por ser bênção também para pessoas que você ainda vai encontrar, sob as asas do Pai.

2.9.06

Sobre Anjos, sóis e fé

Tudo o que é meu é teu, e tudo o que é teu é meu; e a minha natureza divina se revela por meio daqueles que me deste. (...) Que eles sejam teus por meio da verdade; a tua mensagem é a verdade. Assim como tu me enviaste ao mundo, eu também os enviei. (...) E peço que todos sejam um. E assim como tu, meu Pai, estás unido comigo, e eu estou unido contigo, que todos os que crerem também estejam unidos a nós para que o mundo creia que tu me enviaste.
João 17. 10, 17, 21

Esta tarde eu assisti um filme que me incomodou profundamente. Anjos do sol me fez sair do cinema e correr para o banheiro, segurando as lágrimas, engolindo em seco. Um verdadeiro e direto soco no estomago. Crueza e dureza realística de um cotidiano do país.
Já aqui, no quarto do hotel, comecei a refleti sobre a dura realidade representada naquela hora e vinte de filme (acho que se o filme fosse maior, eu morreria de impotência). E comecei a me questionar sobre onde estamos, nós, que nos afirmamos cristãos? Onde estamos, aqueles que se dizem discípulos de Jesus? Como podemos querer ser aqueles que refletem a natureza divina se não temos feito diferença para transformar essas histórias contadas no filme – tão duras e tão reais.
O nome de Jesus aparece em alguns momentos. Quando o personagem de Chico Diaz está transportando mais uma leva de garotas compradas para exploração sexual, o caminhão que faz o transporte leva à frente o nome de Jesus pregado no pára-brisa. Acho que não é um papel muito diferente que temos feito nesse país. No máximo somos pára-brisas.
Nessa manhã via um dos muitos programas evangélicos que a tevê exibe aos sábados de manhã. Nele se relatava a “grande vitória” que foi para a igreja a revogação das mudanças que o código civil impunham aos estatutos eclesiásticos, no fim de 2004. Isso é um absurdo. As vitórias que as igrejas comemoram são aquelas que dizem respeito aos seus próprios umbigos. Convencer uma bancada evangélica que, a partir do seu presidente, agora é conhecida como sanguessuga, a lutar por uma mudança legal para preservar a igreja é o máximo que as igrejas estão fazendo de luta. Enquanto isso, crianças são vendidas pelos próprios pais para exploração sexual.
Algumas igrejas se contentam em alimentar e vestir os mendigos e moradores das ruas. Eu não quero me contentar com isso. O Rio de Janeiro não é só violência, nem é só beleza natural. É mendicância também. Hoje faz dois meses que estou hospedado em um hotel aqui no Centro da cidade. Meus vizinhos de calçada são dezenas de moradores de rua. Um senhor dorme, cercado por suas caixas e coberto de seus panos, a poucos metros da porta do hotel. Outra senhora dorme na esquina da Rio Branco. Até planta em jarro ela tem em seu canto. E quando eu penso no que a nossa sociedade é capaz de fazer aos seus velhos e no tamanho da desigualdade que impera nessas ruas, vejo que o evangelho não tem que ser pregado nessas ruas: ele tem que ser vivido em ações concretas de transformação social. Eu hoje tenho mais orgulho de ser parte da Petrobras do que de ser parte da Igreja Cristã no que diz respeito transformação e mudança da realidade dos que sofrem neste mundo, neste país.
Até em coisas aparentemente mais fáceis, estamos sofrendo para que alguém acredite que somos de Cristo. Uma dessas coisas é a comunhão interna das comunidades. Quem não conhece uma história como essa, que voltou a se repetir com uma pessoa de minha família: o irmão está gravemente enfermo, tendo que se submeter a uma cirurgia extremamente delicada e de risco de morte. Fica, depois, uma semana no hospital. Depois, mais três semanas com uma sonda. Por fim, quando a sonda é retirada, mais uma semana no hospital. Visitado por alguns líderes, sua falta não é sequer sentida pelo resto da comunidade. Que nem sequer é informada da doença do irmão.
E peço que todos sejam um. E assim como tu, meu Pai, estás unido comigo, e eu estou unido contigo, que todos os que crerem também estejam unidos a nós para que o mundo creia que tu me enviaste. Como o mundo crerá, se não conseguir nos comportar como verdadeiros discípulos? Às vezes penso que as comunidades, inclusive a que estou, não tem a menor vontade de que o mundo creia. Não se move nessa direção e vive de maneira que impede que isso aconteça.
Onde vamos parar? Como e quando seremos discípulos verdadeiros do Mestre Jesus? Do Cordeiro, Filho de Deus, Raiz de Davi? Ou será que vamos esperar que Deus nos tire da Videira e enxerte alguém que possa dar fruto?

28.8.06

Fazendo pecar

Sempre vão acontecer coisas que fazem com que as pessoas caiam em pecado, mas ai do culpado! Seria melhor para essa pessoa que ela fosse jogada no mar com uma grande pedra de moinho amarrada no pescoço do que fazer com que um destes pequeninos peque.
Lucas 17. 1 – 2

Essa mensagem é um alerta, até mesmo contra mim mesmo. Eu não me vejo como muito apropriado porta-voz de uma palavra assim. Não me sinto muito são ou santo para falar coisas tão duras. Por isso sei que, mais do que qualquer coisa, essa é uma palavra que se dirige contra mim, pecador e mentiroso como sou.
Diante da santidade gloriosa do Senhor, não podemos ter muitas ilusões. Não podemos ter muitas ilusões de bondade ou boas ações. Temos que ter consciência de que somos, antes de tudo, pecadores que merecem nada menos que a mesma condenação da parte do Senhor. E rasgando o coração e confessando a culpa, somente podemos nos lançar aos pés do Senhor, dependendo de Sua graça e Seu perdão.
Depois de uma introdução em que confesso meu incômodo em falar algo como o que vou falar, devo confessar também que Deus me conduziu a falar isso. Sem dúvida.
No início do ano passado, vivi uma experiência bem interessante, que devo ter partilhado nesse espaço. Era o responsável pelo estudo junto aos adultos no retiro de carnaval. Tentando levar algo que me dissesse respeito – daquelas coisas que Deus estava fazendo comigo – resolvi estudar com o grupo capítulos específicos de Celebração da Disciplina, de Richard Foster. Queria estudar oração e meditação, tentando dar à temática o caráter prático que Foster aplica no seu livro.
Para resumir o relato, a reação de alguns líderes da igreja me assustou quando propus exercícios de meditação. Como se fossem criações do próprio demônio. O que quero destacar aqui é que o argumento usado para me impedir de fazer o exercício naquela manhã, pelo líder em questão, é que tínhamos no grupo um jovem casado com pouco tempo de igreja. Ele seria imaturo para vivenciar aquela experiência. A desculpa era preservá-lo.
O efeito, no entanto, foi o oposto. Aquele rapaz por pouco, naquele dia, não deixou a igreja. Ele ficou decepcionado com a maneira grosseira e prepotente como eu fui interrompido pelo referido líder da minha antiga igreja. Foi pouco, foi uma ação da graça de Deus, que permitiu que aquele rapaz e sua família permanecessem na igreja naquele momento.
Recentemente, fiquei sabendo, tendo sido informado pelo próprio, que ele agora era Testemunha de Jeová. Procurando saber o que acontecera, descobri que aquela ação maligna que tentou afastá-lo de Jesus no ano passado, finalmente obteve sucesso. Levado por boatos infundados, um outro líder daquela igreja deixou de falar com o jovem – ambos eram colegas de trabalho. O resultado é que o salão do Reino o recebeu bem. E hoje ele diz que encontrou a verdade.
Sempre vão acontecer coisas que fazem com que as pessoas caiam em pecado, mas ai do culpado! Seria melhor para essa pessoa que ela fosse jogada no mar com uma grande pedra de moinho amarrada no pescoço do que fazer com que um destes pequeninos peque. Nada impede que eu e você nos ponhamos no lugar desses líderes que foram responsáveis pelo pecado e desvio daquele jovem. Eu morro de medo disso, devo falar com clareza. Eu morro de medo de ser o responsável por alguém que se perca, como essa família. Porque as palavras de Jesus contra esses são duríssimas. Eu temo por mim, caso caia nesse pecado, mas temo muito mais pelo resultado das ações de líderes e igrejas que se tornam responsáveis pelo afastamento e pecado destes pequeninos. Se os que se desviam são culpados de se afastarem, mais culpados me parecem ser aqueles que os lançam nessa situação: seria melhor para essa pessoa que ela fosse jogada no mar com uma grande pedra de moinho amarrada no pescoço.
Eu falei que uma mensagem dessa é desconfortável para um pecador como eu. Eu sei do risco que corro de ser, eu mesmo, alguém como esses líderes. Eu sei que posso me pôr, facilmente, sob o juízo do Deus vivo. Mas você também pode. Pode, inclusive, já ter agido assim antes. É tempo ainda de se arrepender e de se reconhecer o pecador que é. É o momento de ter a postura daquele publicano, que nem levantava o rosto para o céu. Batia no peito e dizia: “Ó Deus, tem pena de mim, pois sou pecador!” (Lc. 18. 13), não a postura dos fariseus que faziam discípulos e, depois, os tornam duas vezes mais merecedores do inferno do que eles mesmos (Mt. 23. 15). É hora de buscar a graça e o perdão de Deus. É o momento de se chegar a Ele. Antes que não seja mais possível.

27.8.06

Sobre Jonas

Assim como o profeta Jonas foi um sinal para os moradores da cidade de Nínive, assim também o Filho do Homem será um sinal para a gente de hoje.
Lucas 11. 30

Quando eu leio esse trecho do evangelho, um detalhe me chama muita atenção. Apesar de ser Jonas o profeta do povo de Deus e ser anunciado que é um sinal dele que Jesus dará, é o povo de Nínive quem se levantará para julgar aquela geração de judeus (Lc. 11. 32), porque se converteu diante da pregação do profeta.
A história do profeta Jonas reproduz o grande conflito da fé que perpassa toda a história da revelação: o conflito entre religiosidade e fé. No Antigo Testamento, a história de alguns livros nos remetem a esse conflito entre os religiosos legalistas e aqueles que entenderam o valor da graça e da fé em Deus. Um exemplo disso é pensar no livro de Jó. Enquanto os legalistas judeus defenderiam em diversos momentos que o ser judeu e o cumprir a Lei seriam condições únicas para a salvação e a vida com Deus – enquanto o sofrimento somente poderia ser entendido como castigo contra os ímpios –, Jó é um reconhecido servo fiel ao Senhor, mesmo não sendo judeu e sofrendo terríveis coisas ao longo de seu livro. Ser servo de Deus não é, então, exclusividade de um povo que se conhece como Seu povo, nem cumprir a Sua Lei pode ser entendido como garantia de vida boa.
Jonas, como Jó, fala-nos dessa dimensão de conflito entre a vida de fé e a religião. Jonas é o profeta do povo de Deus que tem a ilusão de que pode determinar quem pode ou não pode servir a Deus, tal qual todos os legalistas da história. Ele se recusa a ir pregar a Palavra de Deus aos ninivitas porque os considera indignos de ouvir a mensagem do Senhor – muito mais de se converterem. Ele é tão impregnado dessa mentalidade que pede a morte quando constata a conversão do povo inimigo, no fim do livro (Jn. 4. 2 – 3).
Muitos, no seio da igreja, têm se comportado como verdadeiros profetas no espírito de Jonas. Talvez não sejam capazes de admitir publicamente, mas definem em seus corações e em suas práticas que determinados tipos de pessoas não podem nem nunca farão parte do povo de Deus. Nem que para isso a alternativa seja deixá-los fora do círculo de evangelização da igreja.
Lembro de uma ocasião em que estava na Escola Dominical de uma igreja onde os jovens definiam que determinados pecadores de dentro e de fora da igreja jamais fariam parte daquela comunidade. Arvorados no espírito do profetismo legalista, o grupo de jovens determinavam quem podia e quem não podia ser alvo da graça de Deus.
No livro de Jonas a grande lição é a nós mesmos, para que não nos sintamos mais especiais, por sermos parte de um povo que leva o nome de Deus. Porque as grandes lições de fé vêm daqueles que são externos a esse povo. Primeiro, Jonas, o santo profeta do povo de Deus, é um grande desobediente, quando, em vez de abrir mão dos preconceitos, prefere fugir a obedecer à ordem do Senhor.
Em seguida, ainda no barco, ele dorme enquanto todos pedem pelas suas vidas diante da tempestade que abate a embarcação. Ele dorme, enquanto os que não são parte do povo de Deus oram. Depois, para descobrir a causa do castigo, ele se confessa ao grupo e diz que o jeito é jogá-lo ao mar, como um sacrifício para saciar a ira de Deus. Mais uma vez, a reação daqueles homens que não conheciam a esse Deus e não eram parte do Seu povo – ao contrário de Jonas – parece mais adequada. Eles relutam em fazer um sacrifício humano. Somente cedem quando constatam que Jonas era o profeta do Deus vivo, filho do Seu povo. Ou seja, era mais provável que ele, não os demais, soubesse o que era preciso para saciar a ira de Deus naquele momento. Ainda assim, não o jogam do barco sem uma oração de clemência: Ó Senhor Deus, não nos castigues com a morte por tirarmos a vida deste homem. Pois és tu, ó Senhor, quem está fazendo isso, e o que está acontecendo é da tua vontade (Jn. 1. 14).
Jonas foi incapaz de orar pelo bem coletivo quando dormia no barco, mas ao ser tragado pelo grande peixe, ora pela própria vida. Depois de três dias, o peixe o cospe na praia e ele se vê obrigado a ir pregar em Nínive. Não demonstra qualquer arrependimento nem quanto aos preconceitos que o levaram a essa situação, nem quanto à fuga em desobediência. Ao contrário, o povo de Nínive se arrepende de sua condição pecadora, se converte e Deus os perdoa. O profeta do povo de Deus não se arrepende nem muda de atitude, enquanto um povo inteiro, que não leva o nome do Senhor, nos ensina mais em sua atitude de arrependimento e conversão.
O sinal de Jonas, segundo o que fala Jesus, é o arrependimento dos ninivitas. Essa é uma palavra contra os Jonas dos dias de Jesus, os fariseus legalistas, que não admitiam que pecadores, publicanos e prostitutas pudessem ser alvo do amor de Deus. São esses, junto com os ninivitas, que se levantaram para julgar fariseus e legalistas de toda espécie. Às vezes, ser povo de Deus não garante outra coisa, senão o juízo. Às vezes, as atitudes de adorador podem ser encontrados em gente que muitas vezes não queremos no nosso meio, em nossas igrejas.
O sinal de Jonas é a conversão dos ninivitas. Mais do que isso, é mostrar aos judeus legalistas – e aos muitos cristãos legalistas entre nós – que a salvação não é propriedade exclusiva de ninguém. Ela está disponível, gratuitamente, em Jesus, a quem se achegar para beber a Água Viva que só Ele dá.

23.8.06

Esquecimentos

Senhor, afaste-se de mim, pois eu sou um pecador!
Lucas 5. 8

Hoje eu estive pensando sobre como costumamos ser ingratos com Deus, em grandes e pequenas coisas que Ele faz por nós. Somos ingratos com Deus porque esquecemos as tantas maravilhas que Ele nos faz, os milagres que todos os dias nos alcançam da Sua parte. Sejam pequenos ou sejam grandes.
Somos ingratos com Deus porque não agradecemos a vida, dom perfeito do Criador, pelo menos não como devíamos. Imaginar que o Senhor me deu a vida dentro de um universo infinito faz faltarem palavras! O dom da vida é uma maravilha do Deus majestoso que criou o universo. Dentro desse universo criado, Ele decidiu que haveria vida, inteligente. E Ele escolheu dar a vida a mim e a você. Eu tenho sido ingrato porque não tenho vivido a vida de maneira plenamente digna nem tenho dado as graças devidas ao nome do Senhor.
Somos ingratos a Deus porque não agradecemos quem Ele é em nossas vidas. Quantas vezes temos nos esquecido de agradecer ao Senhor simplesmente por Sua graça? Se não perecemos na Sua presença, se podemos estar em Sua presença, se O conhecemos de alguma maneira, tudo se dá porque o nosso Deus é cheio de graça. E minha ingratidão é também deixar de agradecer ao Senhor por Sua imensa graça. E louvá-Lo por ainda outras coisas devia ser coisa mais comum em minha vida: por Sua perfeição, beleza, poder, majestade.
Somos ingratos quando o Senhor nos dá pequenos e maravilhosos presentes. Somos ingratos quando não agradecemos ao Pai as pessoas que Ele deu às nossas vidas e que nos fazem pessoas melhores. Somos ingratos quando não agradecemos a Deus as pequenas coisas que podemos fazer por eles e as pequenas coisas que eles têm feito por nós. Somos ingratos por não olharmos para as grandes e não olharmos para as pequenas coisas.
Comecei a pensar coisas assim porque sou imenso grato hoje por tantos pequenos e grandes presentes e milagres que o Senhor me tem dado. Sou grato por alguns privilégios que Deus me deu e estou certo de que nunca encontrarei palavras suficientes para agradecer dignamente o fato de eu estar trabalhando onde trabalho, de ter nascido onde nasci, na família que nasci. Ainda assim, sei que tenho sido ingrato e tenho esquecido constantemente de agradecer ao Pai essas coisas.
Na manhã de hoje recebi um desses privilégios que foi conversar com um colega de trabalho que já foi missionário da Jocum. É um privilégio conhecer e trabalhar ao lado de um jovem que já andou fazendo a vontade de Deus em lugares que eu só conheço por orar, como a China. Não quero ser ingrato de deixar de agradecer a Deus de verdade pelo privilégio de conhecer este rapaz.
Senhor, afaste-se de mim, pois eu sou um pecador! Mas quando tomo consciência de que, na verdade, sou ingrato e pecador, tenho a reação de Pedro. Sei que não mereço o privilégio de ser servo do Senhor, nem de receber qualquer bênção que venha dEle, nem de ser alvo de Seus milagres e de Sua graça. E sei que sou pecador e que não entendo a dimensão do que Deus faz por mim quando me preserva e abençoa, o que me faz agir de forma mais ingrata – e isso tudo me faz ter ainda mais certeza do pecador que eu sou. Pecador que teme perecer e, por isso, clama pelo afastamento do Senhor. Senhor, afaste-se de mim, pois eu sou um pecador!
Eu e você ainda podemos aprender a viver na dimensão da graça de Deus que é a dimensão da gratidão eterna e constante do homem. Vivendo sob a graça perdoadora do Senhor, eu quero aprender a ser grato e ciente de que – pecador que sou – meus pecados são levados por Jesus. Eu quero ser grato por cada coisa que o Deus de graça tem me dado e vai me dar. Eu quero aprender a deixar de lado a ingratidão. Quero, desse modo, mergulhar na intimidade e no relacionamento com Jesus, vivendo o Seu amor e permitindo que seja lançado fora todo o medo. Lançando-se, assim, nos braços do Senhor.

19.8.06

Incredulidade

Então Pedro disse: - Se é o Senhor mesmo, mande que eu vá andando em cima da água até onde o Senhor está. – Venha! – respondeu Jesus. Pedro saiu do barco e começou a anda em cima da água, em direção a Jesus. Porém, quando sentiu a força do vento, ficou com medo e começou a afundar. Então gritou: - Socorro, Senhor! Imediatamente Jesus estendeu a mão, segurou Pedro e disse: - Como é pequena a sua fé! Por que você duvidou?
Mateus 14. 29 – 31

Você já deve conhecer uma outra ilustração que nos fala sobre fé e confiança em Deus. Possivelmente, ao ler a história acima que envolve Pedro e Jesus, você se lembra daquela cena emblemática de Indiana Jones e a última cruzada em que o herói precisa atravessar um abismo e, ao dar o primeiro passo, descobre haver uma ponte oculta em uma ilusão de ótica. Você já pensou, como eu, tantas vezes, que a incredulidade nos paralisa e nos faz perder aquilo que Deus tem reservado para nós. Já imaginou se, lá no Êxodo, na hora em que Deus desse a ordem para o povo marchar, Moisés duvidasse? Nós não teríamos o relato de tão espantoso milagre: o mar se abriu.
Se você, como eu, conhece e lembra de tantas histórias semelhantes, deve conhecer também uma outra que relato a seguir. Conta-se que um alpinista, ao se ver dependurado em um pico sem nenhuma visibilidade após ter escorregado, pediu a ajuda de Deus e disse: Deus socorre-me! Deus respondeu:- Você realmente crê que eu possa salva você? O alpinista respondeu: - Sim, eu creio. Deus, então, mandou que ele cortasse a corda. O alpinista pensou muito e segurou ainda mais forte a corda. Morreu, congelado, a dois metros do chão.
Eu e você já tivemos vitórias e bênçãos trazidas pelo Senhor que nos foram conquistadas porque em algum momento de prova não duvidamos e nem perdemos a fé. Mas tenho a impressão que os nossos momentos “Pedro” devem ter sido mais numerosos.
Talvez o principal tipo de problema que nos acomete dia a dia são os problemas com falta de fé; é a incredulidade. Duvidamos da presença de Deus em nossa vida, da graça de Jesus, do amor do Pai, do perdão e da vida que nos vêm do Senhor. Tememos o desconhecido e nos afligimos no meio de lutas reais, mas essas coisas só são multiplicadas em seus efeitos porque duvidamos da grandeza, da existência e da magnitude da obra do Senhor é nossa vida.
São os momentos “Pedro”. Assustado em descobrir que Jesus vinha até eles no barco, andando por sobre as águas, Pedro desafia o Senhor a provar que é Ele: - Se é o Senhor mesmo, mande que eu vá andando em cima da água até onde o Senhor está. Jesus permite. Pedro começa a andar sobre a água. Até que pára de olhar para a grandeza do Senhor que deu a ordem e pensa nas dificuldades e problemas à sua volta. Quando sua atenção recai sobre o mundo à sua volta, Pedro duvida e afunda.
Assim é conosco. O mundo à nossa volta não é muito favorável. Todas as coisas assustam: violência, guerras, fome, inseguranças e incertezas em geral. Olhamos em volta e parece que tudo está se desfazendo. Até a nossa fé se desfaz nesse contexto. É fácil perdermos a fé e os seus efeitos em um mundo como o nosso.
Contra o problema da falta de fé precisamos de um toque das mãos do Senhor. Precisamos da presença do Senhor. Porém, precisamos, na verdade, de algo diferente. O Senhor, o Seu toque e a Sua presença já estão aqui, como Jesus estava naquele lago, em pé, diante do barco e de Pedro. Precisamos ter olhos para vê-Lo ali, diante de nós, nos chamando para o Seu lado, nos fazendo andar por sobre os nossos problemas. Precisamos de uma visão além do alcance das coisas que nos cercam. Precisamos de olhos que vejam o Deus real e invisível que nos ama e nos chamou a seguí-Lo, com fé e pela graça.

18.8.06

Fantasmas

Quando os discípulos viram Jesus andando em cima da água, ficaram apavorados e exclamaram: - É um fantasma! E gritaram de medo.
Mateus 14. 26

Alguns anos atrás, quando estava no seminário, o professor de hebraico, fatalmente doente, estava internado e necessitado de receber doações de sangue. Eu nunca havia doado sangue, especialmente pelo verdadeiro e descontrolado pavor de agulhar. Por mais que racionalmente eu possa compreender que aquele ato não me causará problema algum, o medo irracional me impedia de agir.
Na doença do professor eu percebi a estupidez do meu medo. Eu temia algo que não existia: algum risco de vida ou dor com uma agulha em meu braço ou com a coleta de sangue. Resolvi enfrentar meu medo. Fui fazer a doação e preveni ao médico do posto de coleta que, devido ao meu medo, era provável que passasse mal ou desmaiasse. Mesmo que eu e o médico estivéssemos racionalmente certos de que meu medo se fundamentava em algo que não existia, por pouco não desmaiei naquele dia.
Meu medo de agulhas é tão grande que me lembro de uma ocasião, início da adolescência, em que um médico me solicitou um exame de sangue para descartar a possibilidade de que as dores enormes que vinha sentindo nos pés fossem causados por febre reumática. Fui até o laboratório para coletar o sangue e voltei para casa sem fazê-lo. Meu medo do que não existia de verdade me paralisou naquela manhã.
Meu medo irracional se dirigia a algo que, de real, não existia. Hoje eu ainda temo um tanto agulhas, mas já sou capaz de enfrentar o medo e coletar sangue e tomar anestesias. Mas ainda não tive coragem de doar sangue de novo.
Naquele barco açoitado pelo vento e pelas ondas – um problema bem real enfrentado pelos discípulos – surge um problema imaginário: os discípulos gritam de medo porque viram um fantasma!
Muitas vezes os problemas que nos afligem não têm base concreta – e nós sabemos disso. Muitas vezes começamos a perceber que eles são criados por nossa cabeça e nosso coração. Com medo, vemos coisas que não existem, ouvimos vozes irreais, tememos o que deveríamos louvar. O tal fantasma que tanto assombrou os discípulos era o Mestre que vinha em socorro, andando sobre as águas!
As vezes a atmosfera de temor e medo nos sufoca tanto que tememos – vemos fantasmas – quando o próprio Deus intervém em nosso favor, como no caso dos discípulos. Nós sabemos ou vivemos histórias como as de Gideão, assustado com o tamanho da responsabilidade que Deus coloca em suas costas, temeroso do fracasso da missão. Nós já tivemos medo de enfrentar as soluções que foram trazidas por Deus para os problemas de nossa vida, como se víssemos fantasmas – medo de onde não deveríamos tirar medo.
Algo assim aconteceu comigo recentemente quando a Petrobras me convocou e eu soube que deveria vir para o Rio de Janeiro. Mesmo ciente que aquilo era resposta da oração e era ação milagrosa do Senhor, eu tive os meus fantasmas. Afinal, sair de perto da família, morar em uma terra estranha, eram desafios assustadores – mesmo que hoje saiba que não se firmavam em nada de concreto.
O medo do desconhecido se enfrenta com fé. Como teve fé o nômade Abrão ao atender o chamado divino para deixar tudo para trás e seguir uma voz que lhe guiava a uma terra que nunca vira – e que, dizia a voz, seria dele e de sua descendência.
O medo do desconhecido se enfrenta lançando-se ao cuidado do Deus amoroso que nos chamou a uma vida verdadeira e real – fé em Jesus e comunhão com o Deus Triúno. Assim, poderemos não correr o risco de ver fantasmas onde, na verdade, está a presença amorosa e cuidadosa do Senhor.

17.8.06

Problemas

Naquele momento o barco estava no meio do lago. E as ondas batiam com força no barco porque o vento soprava contra ele.
Mateus 14. 24

No início do ano de 2004 eu editava um jornal evangélico em Natal, o Jornal União. Era um prazer levar aquele empreendimento, mas era problemático saber que, muitas vezes, eu me via pagando para trabalhar. Trabalhava por idealismo, mas me sentia perdendo chances preciosas na vida.
Eu já estava fazendo disciplinas no mestrado como aluno especial desde o ano anterior. Em março, fui aprovado na seleção para aluno regular. Antes mesmo de saber se conseguiria bolsa para o curso, havia decidido deixar o jornal. Havia, mais precisamente, me dedicar exclusivamente ao mestrado mesmo que não houvesse recurso para financiar meus estudos.
Tinha noção de que isso ia ser complicado. Mas minha noção não se comparava com o que comecei a viver nas primeiras semanas de aula. Era muito dinheiro que precisava ser investido em xerox e livros. E eu não tinha um centavo. Preocupei-me verdadeiramente. Ali estava um grande problema real para os próximos anos de minha vida.
Mas o Senhor Jesus é Alguém que sempre está conosco, ao nosso lado, mesmo que duvidemos e mesmo que sejam sérios os nossos problemas. Era uma noite de quarta-feira. Enquanto orava no meu quarto, pedi a Deus que, por amor de Seu Nome, pudesse me conseguir uma bolsa para meus estudos. Disse-Lhe que Ele sabia, melhor do que eu, o quanto ela seria útil e necessária. Na manhã seguinte, a secretaria do mestrado ligou para mim e me perguntou se eu ainda queria aquela bolsa. Glória a Deus! O dia seguinte, a sexta-feira, era o último prazo para que a bolsa fosse distribuída. E ela era uma bolsa que o programa não sabia que estava livre até que uma pró-reitoria da universidade informou que seria distribuída para outro curso.
Contei esse exemplo porque me lembrei dessa história quando pensei no problema que os discípulos enfrentavam nesse tão conhecido relato bíblico. No barco, no meio da noite, atravessando o lago, os discípulos temeram pela vida porque o vento e as ondas ameaçam pôr a pique a embarcação.
Esse era um problema real demais. Como muitos problemas enormes e reais que enfrentamos no nosso dia a dia. Mesmo que não saibamos que problemas cada um enfrenta, podemos afirmar com certa margem de segurança que todo mundo enfrenta um ou outro problema. Alguns, como eu naquele dia, enfrentam graves problemas financeiros. Outros, problemas sérios de saúde. Pessoas entre nós passam por dificuldades familiares. Não importa. O que é certo é que cada um enfrenta palpáveis e reais problemas. Não são coisas de nossa cabeça. Não são ilusões, nem são dificuldades fáceis de superar.
Jesus foi até lá, andando em cima das águas (Mt. 14. 25). Essa história me mostra com clareza que a Bíblia não nos diz que andando com Jesus não teremos problemas. Muito menos somos autorizados a não chamar problemas de problemas. O que podemos crer é que, ainda que Ele tenha de vir andando sobre as águas, Jesus estará ao nosso lado, nos ajudando a passar pelas dificuldades e cumprindo a Sua vontade – trazendo a Sua solução – a cada uma de nossas lutas.
Então os dois subiram no barco, e o vento se acalmou (Mt. 14. 32). A nossa fé e certeza é que o nosso Senhor é poderoso para nos amparar no meio de nossas lutas – que as vezes parecem ser insuportáveis – e para trazer o milagre que acalma o mar e o vento e nos faz navegar, mais uma vez, com paz e tranqüilidade na vida.

16.8.06

Encontrando

Imagine a cena. Você deseja encontrar-se com um amigo ou um parente bem próximo – quem sabe seu pai. O assunto que você tem a tratar é delicado, mas, ainda mais importante que isso, você deseja matar saudades, manifestar carinho e amor, experimentar uma companhia que você não vivencia há algum tempo. Você, então, liga para o seu amado e marca o encontro. Algumas horas depois, a alegria de revê-lo e de viver aquele momento invadem o seu coração.
Pense essa cena. Ela por acaso aconteceria se você duvidasse ou não soubesse da existência de seu amado? É inconcebível que a gente possa desejar relação com alguém de quem duvidamos a existência. Mais que isso, é inconcebível imaginar que alguém possa duvidar da existência de um pai, irmão ou amigo que amamos.
Eu fiquei pensando essas coisas hoje ao meditar sobre um texto bem conhecido da carta aos Hebreus: Sem fé ninguém pode agradar a Deus, porque quem vai a Ele precisa crer que Ele existe e que recompensa os que procuram conhecê-Lo melhor (Hb. 11. 6). Encontrar-se com Deus e viver em fé precisa seguir a lógica do encontro com o pai. Você precisa entrar em contato com Ele e realizar o encontro na premissa fundamental de que Ele existe. Não é possível se aproximar de alguém para uma conversa ou uma relação duvidando de sua existência. Ainda mais se esse Alguém é invisível aos olhos físicos.
Esses pensamentos, simples, me inquietaram porque percebo que não raras vezes me flagro em dúvida. Uma dúvida inquietante. Imagino que, sendo eu mais ou menos normal, não devo ser o único cristão no mundo que tenha passado por alguma crise de fé em que a própria fé na existência de Deus tenha sido questionada no interior do coração. Não devo ter sido o único cristão do mundo que tenha se dado conta do desespero que é viver sem fé neste mundo.
Por isso, a fé é o mais fundamental dom de Deus. Pois pela graça de Deus vocês são salvos por meio da fé. Isso não vem de vocês, mas é um presente dado por Deus (Ef. 2. 8). A fé é um fruto da graça de Deus, é presente dado por Deus. Isso significa que para que um homem possa acreditar que o Deus que quer encontrar existe, ele precisa, primeiro, ser alvo da graça infinda do Senhor gerando em seu coração a fé. A certeza de que Deus é e tudo o de bom que existe, toda a beleza do universo e toda a grandeza da vida é dádiva gerada e cedida em Deus. A graça de Deus na forma da fé nos faz ter certeza de que não foi o acaso que nos formou aqui, no terceiro planeta deste sistema solar.
Tendo essa certeza, podemos marcar o encontro. Nossa vida passa a girar em função desse encontro feliz. E girando assim em torno da órbita certa, a felicidade e a realização na vida serão uma constante garantia. Nossa vida será encontro com o Deus que presenteia todo aquele que decide investir sua vida em conhecer melhor o Seu Amado.
Pensar essas coisas me faz ter confiança de esperar na graça de Deus para que tenha a fé renovada e restaurada quando a dúvida quiser se aninhar no meu coração. Estou certo de que a presença dEle em minha vida – mesmo que a fé fraqueje – foi a melhor coisa que eu descobri e tenho descoberto.

13.8.06

A pergunta

Quem vocês dizem que eu sou?
Mateus 16. 15

Como o Novo Testamento se constrói em cima da fundamental questão acerca de quem é Jesus na história humana e na história dos homens, acho provável já ter escrito antes sobre esse assunto. Mas fui motivado a pensar mais uma vez sobre a questão a partir de uma pregação que ouvi esta manhã na Igreja Batista da Esperança, aqui no Rio.
A resposta existencial mais importante que alguém tem a dar é a essa pergunta. O que pensamos ou sabemos de Jesus define por inteiro o tipo de vida que levamos diante dEle e o tipo de relacionamento que podemos manter ou não com Ele. A Bíblia deixa isso claro, particularmente neste texto.
Antes de ouvir dos discípulos o que eles pensam acerca de Si mesmo, Jesus interroga-os sobre as opiniões correntes entre o povo, nas ruas, casas e sinagogas. As imagens de Jesus que aparecem nessas respostas não são muito diferentes das imagens que as pessoas de nossos dias ainda têm de Jesus. Mais do que pensar se as pessoas consideravam Jesus como ressurreição de algum dos antigos e eminentes judeus, suponho que seja interessante pensar no que cada figura citada representa.
Alguns dizem que o senhor é João Batista; outros, que é Elias; e outros, que é Jeremias ou algum outro profeta (Mt. 16: 14). Ainda que apareçam quatro respostas distintas, enxergo aí três imagens de Jesus. A primeira mostra que as pessoas viam Jesus como alguém que trazia uma dura mensagem de juízo. Jesus era visto como um pregador da calamidade, um pregador da culpa e do castigo do povo, mais ou menos como o era João Batista. Como se Jesus estivesse exercendo um ministério que apenas fosse a continuidade do ministério do Batista. O povo tinha motivos para pensar isso: Jesus começou pregando basicamente a mesma mensagem de João e só começou Sua vida pública após o batismo, como se precisasse da unção e da autoridade de João.
Lamentavelmente eu vejo esse pensamento sobre Jesus especialmente vivo em meios religiosos. Ambientes que, independente se da tradição protestante ou católica, não enxergam a presença da graça, viva e renovadora do Cristo vivo. Entendem-no como um preceituador moralista de bons costumes e de regras de vida, mesmo que consigam revestir isso de uma aura de profunda e dedicada espiritualidade.
A segunda imagem, que aparece na referência a Elias, é a do operador de sinais. O ministério de Elias é marcado por sinais e milagres a todo tempo. As pessoas viam Jesus também como um fazedor de sinais: iam atrás dele para terem suas enfermidades curadas, para verem demônos sendo expulsos, para ouvirem mudos falarem e se maravilharem com cegos que vêem e surdos que ouvem. Ainda mais: seguem Jesus porque sabem que Ele multiplica pães e peixes para alimentar multidões (Jo. 6).
Se haviam pessoas assim no meio do povo enquanto Jesus andava na terra, muito mais existem agora. Pior: existem ministérios que se constroem unicamente na afirmação de que Jesus é um fazedor de milagres. Ele realmente faz milagres, mas seguí-Lo por esse motivo se assemelha a construir a casa sobre a areia - ou desconsiderar Seu ensino e a inteireza de Seu ministério.
Conheço pessoas que circulam entre círculos de oração e trabalhos nas mais diferentes casas e nas mais diversas igrejas unicamente porque seguem um Jesus que faz milagres. Esquecem de viver com Ele, Amigo e Companheiro, com o Consolador Espírito e na comunhão do Pai no dia a dia e a cada instante. Vivem pelos milagres. E só por eles.
Por fim, a terceira imagem é a do reformador. Jesus era comparado a Jeremias e aos demais profetas. Quando vejo o nome de Jeremias aqui penso em um reformador da religião. Os judeus acreditavam que Jesus podia ser o tão esperado Messias guerreiro que restauraria todas as coisas - inclusive o reino - em Israel.
Hoje em dia, muitos são capazes de exaltar a ética de Jesus, expressa especialmente no Sermão da Montanha, sem assumirem compromisso mais profundo com Ele. Não querem se tornar discípulos ou então consideram-se discípulos porque procuram viver as práticas dessa ética. Vêem Jesus como um Mestre de ética, como um reformador. É assim que O vêem os judeus hoje, mas também muitos outros, inclusive dentro de nossas comunidades.
O que muda tudo é o entendimento da questão que só pode ser trazido por revelação do Espírito. Reconhecer a identidade real de Jesus só pode ser obra de Deus na vida do homem. O Senhor é o Messias, o Filho do Deus Vivo (Mt. 16. 16). Jesus diz a Pedro que essa revelação lhe foi dada diretamente pelo Pai, porque de si o homem não pode alcançar e reconhecer quem é Jesus. E entender quem é Jesus muda tudo. Muda nossas relações, nosso modo de ver o mundo, nossos planos, nossos desejos. Muda nossa relação com Ele porque quando O vemos como Ele realmente é - o Filho de Deus, o Deus Filho -, descobrimos que tudo o que precisamos e tudo o que queremos é conhecer a Jesus profunda e intimamente. Tudo o que buscamos, a partir de então, é o Senhor. Conhecê-Lo. Investir no relacionamento pessoal com Ele. E permitir-se viver na realidade e concretude da Sua vida em nós.

28.6.06

Caos

Por que é que vocês são assim tão medrosos? Vocês ainda não têm fé?
Marcos 4. 40.

Em muitos momentos de minha vida, talvez o atual, minha resposta têm sido: Eu tenho medo porque não tenho fé! Não conheço muitas pessoas que confessem isso com muita tranqüilidade. Não conheço muitas pessoas que tenham muita facilidade em admitir que estão apavoradas, tementes e que, sem entender muito bem porque, enfrentam crises de fé. De dúvida. De incerteza. E se nada disso fosse verdade?
Esse sentimento, para mim, me joga em um mundo caótico. A sensação é de pleno caos. Caos à minha volta. Caos dentro de mim. Caos insolucionável, a não ser por meio de uma interferência premente do Senhor Jesus. O caos do medo só se dissipa por meio da ação direta de Deus, o Criador da fé.
O caos pode estar à nossa volta. Jesus e os discípulos atravessavam o lago da Galiléia. De repente, o vento sopra forte contra o barco, o mar se revolta. Os discípulos temem enquanto Jesus dorme. Assustados e irritados, os discípulos acordam Jesus: Mestre! Nós vamos morrer! O senhor não se importa com isso? (Mc. 4. 38).
O caos à volta faz os discípulos temerem pelas próprias vidas. E o Senhor, dormindo, parece distante demais dos seus problemas. Parece não se importa com aqueles que devotam suas vidas em seguí-Lo. O caos à volta os faz desesperar.
Até que Jesus se levanta e, falando contra o vento e o mar, restabelece a ordem e a paz: Silêncio! Fique quieto! (Mc. 4. 39). O vento e o mar param. O caos se dissipa. Por uma ação direta do Senhor que, de uma forma ou de outra, também restabelece a fé dos discípulos, a certeza de que eles estão diante do Divino naquele barco: Que homem é este que manda até no vento e nas ondas?! (Mc. 4. 41).
O texto diz que os discípulos ainda temiam, mas agora o temor era de outra ordem. Era o temor de um coração que se depara com o Santo! A presença do Deus Santo, o Senhor Jesus, dissipou o caos, restabeleceu a ordem da Graça e do Senhorio no ambiente.
Mas o caos pode estar dentro de nós. O evangelho continua dizendo que, ao chegar na outra margem, Jesus encontrou um homem que vivia em um lugar bem tranqüilo – ou um cemitério não é lugar tranqüilo? Mas esse homem vivia o caos dentro de si. Pelo menos dois mil demônios – uma legião – dominava aquela pessoa. Forte, quebrava tudo. Dentro de si, o mundo vivia em erupção. Nada estava certo. Eram no mínimo duas mil personalidades diferentes que tentavam ter ali o controle. Situação caótica dentro daquele homem.
O caos às vezes está dentro de nós. Mesmo esse caos precisa de uma intervenção do Deus da Criação. É a presença de Jesus naquele encontro quem liberta o homem do seu caos interior. É Jesus quem o livra daquela possessão que o tornava um caos. E ele, agora, estava sentado, vestido e no seu perfeito juízo (Mc. 5. 15), para espanto das testemunhas do milagre de pôr fim ao caos.
O caos está à minha volta mas o caos está principalmente dentro de mim porque me falta fé e, desse modo, eu temo. Temo as coisas que me aparecem no futuro. Temo o fim de todas as coisas. Temo que esteja andando sem Jesus. Tudo o que preciso é restaurar a minha fé por meio de um encontro pessoal com o Filho de Deus, Jesus, que com uma palavra nos cura e dissipa todo o caos, à volta ou de nós. Ora, vem, Senhor Jesus!

14.6.06

Liberdade

Alguns dizem assim: "Podemos fazer tudo o que queremos". Sim, mas nem tudo é bom. "Podemos fazer tudo o que queremos", mas nem tudo é útil.
1 Coríntios 10. 23

Liberdade exige responsabilidade. É por isso que muitos de nós preferem ser prisioneiros. O prisioneiro não tem liberdade mas também não tem qualquer responsabilidade por suas ações e sua vida. Ela, a vida, é condicionada pelas regras e paredes que constituem sua prisão. Sua vida tem limites claros definidos por aquilo que o prende.
Se está em uma prisão física, não tem muito o que fazer. Logo, não precisa responder muita coisa – responsabilidade significa a capacidade de dar resposta pelos seus atos. Preso, encarcerado entre quatro paredes, não age muito para precisar responder. E, ainda que aja, na maioria das vezes segue ordens, obedece e faz o que outros mandam. São os outros – os que o prendem – os responsáveis pelos seus atos.
Ser prisioneiro – no que pese o fato de não ter liberdade – não é tão difícil quanto queremos crer. A gente prefere ser prisioneiro a ter liberdade. A gente sabe, ainda que inconscientemente, que ser livre implica se responsabilizar pelo que faz. E a gente não quer se responsabilizar.
A gente age como age porque nossos pais não souberam nos criar, porque fomos abusados na infância, porque somos pecadores, enfim, nunca assumimos a nossa responsabilidade por nossos atos: sempre a culpa é dos outros – sempre eles são os responsáveis.
Mas liberdade é responsabilidade. Especialmente na vida cristã. A vida da graça é a vida da liberdade. É a vida do podemos fazer tudo o que queremos. Mas também é a vida do mas nem tudo é bom, nem tudo é útil. O que complica a nossa vida nessa hora é que Deus coloca em nós a liberdade e a maturidade para que sejamos responsáveis de saber o que convém, o que é bom e o que é útil, em todas coisas que nos são lícitas fazer. Paulo está nos dizendo que somos livres, enquanto cristãos, mas que somos responsáveis por saber que nossa liberdade não significa que tudo o que podemos fazer pode ser feito. Mas tenham cuidado para que essa liberdade de vocês não faça com que os fracos na fé caiam em pecado (1 Co. 8. 9).
Então, deparados com a liberdade revolucionária da graça, preferimos a prisão por não querermos nos responsabilizar por nossos atos. Temendo a liberdade, preferimos as regras, as normas, a Lei, para que ninguém debande para a libertinagem – nem nós mesmos – uma vez que não aprendemos nem queremos viver de maneira responsável.
Por isso, é fácil o sentimento religioso de que viver com Cristo é cumprir normas. Mas esse sentimento não tem fundamento bíblico. Ser santo, na Bíblia, não é seguir normas – não é adotar certos estilos de comportamento. Não é fazer – ou deixar de fazer – um monte de coisas, como parecem acreditar parte considerável dos cristãos. Aliás, esse sentimento não é novo e já era combatido por Paulo como mundanismo: Então, por que é que vocês estão vivendo como se fossem pessoas deste mundo? Não obedeçam mais a regras como estas: "Não toque nesta coisa", "não prove aquela", "não pegue naquela". Todas essas proibições têm a ver com coisas que se tornam inúteis depois de usadas. São apenas regras e ensinamentos que as pessoas inventam (Cl. 2. 20 – 22).
Muitos de nós procuram regras religiosas, normas e Leis simplesmente porque não se sentem capazes de serem responsáveis por si só. Alguns não entenderam que a graça liberta. Outros não quiseram entender e preferem a Lei à graça porque a Lei torna a vida mais fácil à medida que me tira a necessidade de responder por meus atos – eu não preciso pensar no que faço, nem preciso responder por minhas ações; eu só preciso fazer o que mandam o pastor, a Igreja e as leis que assumi como minhas. Eu não preciso de liberdade porque não quero ser responsável e, assim, opto por não experimentar a vida na liberdade da graça – barateando o sacrifício de Cristo e tornando a Sua morte unicamente o passaporte para o Céu e não a entendendo como o Caminho para uma vida abundante e verdadeira a partir de agora até a eternidade. Porque eu prefiro seguir regras a viver.

6.6.06

Sobre o orgulho

Ó Senhor Deus, eu já não sou orgulhoso; deixei de olhar os outros com arrogância. Não vou atrás das coisas grandes e extraordinárias que estão fora do meu alcance.
Salmo 131. 1

Quantas coisas são inalcançáveis para nós! Na nossa relação com Deus entramos em uma dimensão em que, mesmo as coisas nos dizendo respeito, são coisas que não são para nós: estão longe e além de nós.
No entanto, a religião é uma cilada eficaz que pavimenta nosso caminho até a arrogância. A arrogância que nasce da sensação de nos sentirmos proprietários do Divino. Se o compreendemos por inteiro, somos donos dele.
O místico e o espiritual existem na dimensão do que extrapola nossa capacidade intelectual. O âmbito de nossa comunhão íntima com o Pai não é a racionalidade pura, mas a experiência: a amizade, o afago, o afeto.
A experiência não pode se tornar em um termo de posse espiritual. A experiência é a liberdade da vida em comunhão. Apenas o pensamento religioso se supõe possuidor e dono da experiência espiritual. Desse modo, a encarcera nos moldes cúlticos, teológicos e religiosos que se coadunam com a religiosidade do sujeito.
O religioso reafirma, como única forma válida, a sua forma particular de expressar fé e culto a Deus. Ele enquadra tudo na sua fôrma e tudo o que a supera ou foge dela não é reconhecido como santo. Ele reduz a experiência e vida de fé à racionalidade religiosa, manifesta nos moldes de uma arrogância que supõe a compreensão racional do que envolve a relação com Deus: coisas que estão além do racional.
Ó Senhor Deus, eu já não sou orgulhoso; deixei de olhar os outros com arrogância. Não vou atrás das coisas grandes e extraordinárias que estão fora do meu alcance. O ser que encontra a esperança, a confiança e o descanso na experiência de comunhão íntima com o Senhor – o adorador – reconhece a cilada da racionalidade: a cilada da arrogância. O adorador fiel se liberta da tentação da arrogância religiosa e se rende à experiência da vivência íntima com Deus. Abre mão do compreendo a Deus e o que Ele faz e vive a dimensão da fome e da sede insaciáveis por mais dEle.
Paulo relata uma experiência que lhe ensina algo semelhante ao que aprendeu o salmista: Embora não adiante nada, eu preciso me gabar de mim mesmo. Agora vou falar a respeito das visões e revelações que o Senhor tem me dado. Conheço um cristão que há catorze anos foi levado, de repente, até o mais alto céu. Não sei se isso, de fato, aconteceu ou se ele teve uma visão; somente Deus sabe. Repito:sei que esse homem foi levado, de repente, ao paraíso. Não sei se isso, de fato, aconteceu ou se foi uma visão; somente Deus sabe. E ali ele ouviu coisas que palavras humanas não conseguem contar. Eu me gabarei desse homem. Mas não me gabarei de mim mesmo, a não ser das coisas que mostram as minhas fraquezas. No entanto, se eu quisesse me gabar de mim mesmo, isso não seria uma loucura, porque estaria dizendo a verdade. Mas eu não me gabarei, pois quero que a opinião que as pessoas têm de mim se baseie naquilo que me viram fazer e me ouviram dizer (2 Co. 12. 1 – 7). Mesmo tendo visto e ouvido coisas inimagináveis, Paulo se põe em seu lugar humilde. Ele não possui nenhuma dessas coisas. Apenas as experimentou. É Deus quem possui Paulo, não o contrário.
Assim como Paulo e o salmista compreenderam isso, espero que eu e você possamos viver a experiência da intimidade com o Senhor, abandonando toda religiosidade arrogante.

28.5.06

Abandonado

Quando as altas autoridades da Babilônia enviaram mensageiros a Ezequias para fazerem perguntas sobre o milagre que havia acontecido em Judá, Deus não o ajudou, pois queria pô-lo à prova a fim de descobrir o que estava no fundo do seu coração.
2 Crônicas 32. 31

Muitas histórias na Bíblia – e em nossa vida pessoal – ilustram o sofrimento e a angústia provocados pela sensação de se sentir só e abandonado. Às vezes, em meio a tantos problemas e momentos difíceis, tudo o que precisamos é de alguém ao nosso lado. No mais das vezes, voltamo-nos em angustiosa oração ao Pai e aguardamos, ansiosos, pelo Seu toque, pela Sua cura, Sua resposta. Porém, não são poucos os momentos em que Ele se cala.
É difícil para nós entendermos porque Deus silencia ou porque fica ausente. Na angústia, clamamos. Na dificuldade, oramos. Precisamos do Seu toque e cuidado. Não entendendo, sentimos Deus ausente. Como se tivesse nos abandonado com nossa dor. Como se nossas orações não passassem do teto.
Procuramos mil e um motivos, na ansiedade por descobrir uma razão disto. Na nossa mentalidade religiosa, buscamos em nós a resposta: seria nossa culpa, por um pecado inconfesso? Estaríamos respondendo pela conseqüência de alguma omissão nossa? Responder essas questões afirmativa é a primeira e mais fácil resposta que podemos encontrar.
Quando as altas autoridades da Babilônia enviaram mensageiros a Ezequias para fazerem perguntas sobre o milagre que havia acontecido em Judá, Deus não o ajudou, pois queria pô-lo à prova a fim de descobrir o que estava no fundo do seu coração. Sempre me chamou a atenção esse texto. Deus não abandonou Ezequias por qualquer pecado ou como conseqüência de qualquer ato. O motivo de Deus é claro no texto: testar o coração do Rei. Quer dizer, descobrir quais as motivações, descobrir o que ia no coração de Ezequias.
Deus faz isso conosco. Afasta-se de nós para provar que tipo de relação temos construído com Ele. Por que andamos com Ele? Se for amor nossa motivação, ainda que tenhamos a sensação de estarmos sozinhos, longe dEle, não conseguiremos nos desligar. Se, no entanto, tivermos construído uma relação superficial com o Pai, esse teste será definitivo para provar a fragilidade de quem somos e de nossa fé.
Esse é parte do sentido da prova de Jó. Deus testa sua motivação em seguí-lo. Em sua perseverança – às vezes, teimosa – Jó prova a honestidade de suas motivações em buscar ao Senhor. Ainda que essa seja uma busca um tanto sem conhecimento, ao fim, como resultado de tudo, Jó experimenta um aprofundamento magnífico na sua relação com o Pai: Eu sei que para Ti nada é impossível e que nenhum dos Teus planos pode ser impedido. Tu me perguntaste como me atrevi a pôr em dúvida a Tua sabedoria, visto que sou tão ignorante. É que falei de coisas que eu não compreendia, coisas que eram maravilhosas demais para mim e que eu não podia entender (Jo. 42. 2 – 3).
É isso. Não é raro nos sentirmos sós, inclusive abandonados por Deus. Nosso amor é, desse modo, provado. E, caso resistamos, será ele fortalecido e nossa relação com o Pai aprofundada.

16.5.06

Diante do trono

Quem são estes que estão vestidos de branco? De onde foi que vieram?
Apocalipse 7. 13.

O Apocalipse é literatura de resistência. Diante da opressão representada pelo Império Romano, especialmente depois da perseguição sofrida sob Nero, João escreve uma mensagem de esperança para a Igreja: o sofrimento da perseguição é intenso, mas o Senhor Todo-Poderoso não está alheio a isso. Ele caminha no meio das igrejas, tem o Seu povo nas Suas Mãos, conhece o seu sofrimento, ouve o seu clamor e descerá a fim de livrá-lo. O fim da história não é dor e perseguição: é Jesus descendo como um Poderoso Cavaleiro para esmagar o poder de Satanás e, em novos céus e nova terra, celebrar com o Seu povo numa cidade nova que desce dos céus.
É por isso que a mensagem de Jesus às sete igrejas é um estímulo à perseverança. Porque, se aos olhos humanos a situação é de opressão e derrota, do ponto de vista cósmico o Senhor da história a tem feito caminhar para o fim de paz e redenção. Apesar dos poderosos que, no mundo, querem por fim nisso.
Depois disso olhei e vi uma multidão tão grande, que ninguém podia contar. Eram de todas as nações, tribos, raças e línguas. Estavam de pé diante do trono e do Cordeiro, vestidos de roupas brancas, e tinham folhas de palmeiras nas mãos. E gritavam bem alto: - Do nosso Deus, que está sentado no trono, e do Cordeiro vem a nossa salvação. Todos os anjos estavam de pé em volta do trono, dos líderes e dos quatro seres vivos. Então eles se jogaram diante do trono, encostaram o rosto no chão e adoraram a Deus, dizendo: - Amém! Ao nosso Deus pertencem para todo o sempre o louvor, a glória, a sabedoria, a gratidão, a honra, o poder e a força! Amém! Um dos líderes me perguntou: – Quem são estes que estão vestidos de branco? De onde foi que vieram? – Eu não sei. O senhor sabe! – respondi. Então ele me disse: – Estes são os que atravessaram sãos e salvos a grande perseguição. São as pessoas que lavaram as suas roupas no sangue do Cordeiro, e elas ficaram brancas. É por isso que essas pessoas estão de pé diante do trono de Deus e o servem de dia e de noite no seu templo. E aquele que está sentado no trono as protegerá com a sua presença. Elas nunca mais terão fome nem sede. Nem o sol nem qualquer outro calor forte as castigará. Pois o Cordeiro, que está no meio do trono, será o pastor dessas pessoas e as guiará para as fontes das águas da vida. E Deus enxugará todas as lágrimas dos olhos delas (Ap. 7. 9 – 17).
É a Igreja que está diante do trono! Aquela gente de todos os povos que foi lavada no sangue de Jesus. Os poderosos do mundo, que perseguem e matam a Igreja, que infligem dor e sofrimento, que acham os grandes, não podem conceber nem se colocar diante do trono. O lugar diante do trono está reservado àqueles que vencem pela fé a grande perseguição. Os poderosos acham que podem calar o povo de Deus. Acham-se com o poder de vida e de morte. Mas desconhecem o Senhor do Trono. É a Igreja, e só ela, quem está diante da face do Senhor, prostrada ao Seu trono!
A Igreja sofre perseguição no mundo, mas louva ao Senhor, porque está certa que dEle vem a salvação! - Do nosso Deus, que está sentado no trono, e do Cordeiro vem a nossa salvação. A Igreja grita, entusiasmada, esta verdade.
O nosso louvor é uma festa de libertação por já estarmos na presença do trono. Gritos entusiasmados! Ainda que as aparências pareçam dizer o contrário, somos nós – não os que nos oprimem – que estamos na presença de Deus. E, assim, somos nós os salvos pelo Cordeiro! Estes são os que atravessaram sãos e salvos a grande perseguição. São as pessoas que lavaram as suas roupas no sangue do Cordeiro, e elas ficaram brancas. É por isso que essas pessoas estão de pé diante do trono de Deus e o servem de dia e de noite no seu templo. E aquele que está sentado no trono as protegerá com a sua presença. Elas nunca mais terão fome nem sede. Nem o sol nem qualquer outro calor forte as castigará. Pois o Cordeiro, que está no meio do trono, será o pastor dessas pessoas e as guiará para as fontes das águas da vida. E Deus enxugará todas as lágrimas dos olhos delas.
O lugar diante do trono é daqueles que escapam sãos e salvos da grande perseguição: aqueles que mantiveram a fé em Jesus, a vitória que vence o mundo, ainda que pondo em risco a própria vida. São esses que foram lavados no sangue do Cordeiro.
É a Igreja que pode usufruir a proteção de Deus, não os poderosos do mundo. Ainda que esses poderosos – ou aqueles que nos oprimem e perseguem – possam usar o nome de Deus e o discurso religioso, não são eles que se encontram diante do trono ou são guardados sob a proteção do Senhor: esse é um privilégio meu e seu! Somos nós os sustentados pela graça do Senhor! Somos nós os que conduzidos a lugares e espaços espirituais de refrigério pelo Senhor!
Mais que tudo, somos nós que, diante da dor e do sofrimento que a nós é infligido pela opressão e perseguição, somos consolados pelas próprias Mãos do Senhor: são as Mãos do Senhor que tocam para enxugar todas as lágrimas que choramos.
Diante do trono já estamos nós, os lavados no sangue do Cordeiro, protegidos, consolados, guardados pelo Senhor. Diante do trono já estamos nós, os que celebram, com gritos entusiasmados, o Deus que nos livra de todo mal. Do nosso Deus, que está sentado no trono, e do Cordeiro vem a nossa salvação.

Mais e mais bênçãos

Eu sempre darei graças a Deus, o Senhor; o Seu louvor estará nos meus lábios o dia inteiro.
Salmo 34. 1

Essa não é mais uma reflexão. É uma explicação em forma de testemunho. Em março desde ano terminei o mestrado em Lingüística Aplicada como alvo do milagre e da graça de Deus. Isso foi uma bênção que também se tornou uma preocupação: e agora, com o fim de minha bolsa, como me manteria? Deus foi sendo fiel ainda mais dia a dia, desde então.
Primeiro, um momento de dúvidas e dificuldades. Disse algum tempo atrás que havia sido aprovado em um concurso para professor substituto da UFPB. Fui para João Pessoa dar aulas e fiquei lá três semanas. Na hora de assinar o contrato, descobri que a universidade não levaria em conta o meu mestrado e que o valor do salário seria quase quinhentos reais a menos que eu – e o departamento de Comunicação – esperava. O resultado é que não assinei o contrato e, depois de três semanas dando aulas de graça, voltei para casa. Desde a quinta-feira, 4 de maio, estou de volta. Mas aí foi meu computador que passou a atrapalhar minha comunicação com o mundo e, obviamente, o envio das reflexões que um dia já foram diárias.
Claro que fiquei preocupado com o futuro. Com minhas contas para pagar. No domingo seguinte à minha volta, pedi oração durante o culto para que Deus interviesse nisso. Na quinta-feira seguinte, sem dinheiro, fui conferir meu saldo em conta para saber quanto precisaria pedir à minha mãe para que pudesse pagar as minhas dívidas. Fui surpreendido ao perceber que fora depositada em minha conta – de forma inesperada – ainda uma parcela da bolsa do mestrado. Fiquei em extremo feliz e agradecido a Deus. Nisso tudo, estava sem acesso à Internet para partilhar as bênçãos e lutas.
Mas as surpresas não pararam aí. No fim do ano passado, resolvi fazer o concurso para jornalista da Petrobrás porque o valor da inscrição era muito baixo. Não estudei especificamente para o concurso e fui fazê-lo em uma manhã de domingo do mês de dezembro. Pela graça do Senhor – e de novo de forma inesperada, como resultado único e exclusivo da graça de Deus – fiquei em uma boa posição [32º lugar].
Pois bem, na sexta-feira, enquanto participava de uma reunião na assembléia legislativa do nosso estado, recebi um telefonema de casa informando que eu recebera um telegrama de convocação da Petrobrás. Uma semana depois de minha volta de João Pessoa. Cinco dias depois de meu pedido de oração na igreja.
Sou grato a Deus por isso tudo. Não sei ainda o que virá pela frente. Mas estou mais que certo que o meu futuro, minha vida e meus passos estão guardados pelo sangue do Cordeiro. Nada nem ninguém será capaz de impedir que Ele realize o Seu projeto em minha vida. A Ele eu dedico toda a glória! Dele eu suplico a graça, o cuidado e a proteção! Sob Suas asas declaro desejar estar hoje e para sempre! Em nome dAquele que nos amou primeiro e por Seu grande amor, entregou a vida para que eu – e vocês – tivéssemos a vida de verdade: Jesus!

3.4.06

Escravos

Se o Filho os libertar, vocês serão, de fato, livres.
João 8. 36.

Como nunca na minha vida antes, tenho sido nos últimos dias conduzido a refletir sobre uma realidade clara e difícil da Bíblia: o pecado escraviza, a graça liberta.
Temos discutido em vários contextos diferentes na nova comunidade da qual tenho participado a realidade, a injustiça e o incomodo da graça. Muitas vezes já falei sobre isso antes, mas tem entrado com muito mais força em meu pensamento e meu coração nos últimos tempos o que traz de transtorno à nossa mente retributiva a realidade da justiça de Deus que se manifesta na graça do evangelho. Funcionamos e pensamos que ser justo é retribuir com o bem, o bem feito; retribuir com punições as faltas cometidas. É assim que funcionam todos os sistemas de controle social que conhecemos. Nossa mente funciona assim. Esperamos, então, que na nossa relação com Deus o mesmo princípio ainda valha.
Por isso, nos cobramos muito no relacionamento com Deus. Sabemos que Deus é santo. Sabemos o quão pecadores somos. Sabemos o quão distantes dEle nos lançam os nossos atos. É inconcebível para nós que simplesmente isso não importa na relação com Deus. Sabemos sermos merecedores de punição, não de amor. Sabemos que o salário de nosso pecado é a nossa morte. Sabemos que Deus seria justo se nos punisse. Mas não é assim na dimensão da graça. Deus nos olha com graça e amor – imerecidos, é claro. Deus nos olha com os olhos da cruz. O amor de Deus nos alcança pela cruz. Ali, onde toda culpa foi apagada, todo pecado foi castigado. A partir de onde, não importa mais.
O desespero de Lutero, por muito tempo, foi perceber que só existe vida em um relacionamento com Deus. No entanto, Deus é santo e o homem é um miserável pecador. Por mais que o homem precise de Deus, então, é impossível ter um relacionamento com Deus. E Lutero se desesperava dessa realidade terrível – uma vez que só era possível conceber a justiça de Deus como uma retribuição implacável. Até que, um dia, se deparou com um texto revolucionário: Porque no evangelho é revelada, de fé em fé, a justiça de Deus, como está escrito: Mas o justo viverá da fé (Rm. 1. 17). A justiça de Deus não se revela em um retribuição implacável, mas no evangelho! Ou seja, a justiça de Deus se revela na cruz do Calvário. E não se vivencia de outra forma a não ser pela fé. De forma absolutamente gratuita. Não é preciso fazer nada, pagar nada ou sentir nada para se ter a liberdade ou o perdão: basta crer.
Isso nos incomoda demais. A realidade da graça fere o nosso senso de justiça. É como se para cada homicídio que fosse cometido de forma cruel nenhum criminoso jamais fosse punido com a cadeia – porque Jesus já está ocupando a sua cela!
Uma vez que a injustiça da graça nos inquieta, muitas vezes nos deixamos escravizar pelo pecado. Esses dias vi isso de uma maneira inteiramente inédita para mim. Conversando com um amigo, percebi que ele tem sido escravizado pelo pecado de uma maneira que eu nunca imaginei ser possível. Não falo da prática do pecado, mas da idéia do pecado. Incapaz de vivenciar a graça, ele se deixa dominar pelo senso de culpa e de pecado. Ele se sabe pecador mas não experimentou a realidade da graça – mesmo que seja pastor! Como se sabe pecador, se pune de tal maneira que se afasta da graça de Deus. Ele se condenou a não ter comunhão possível com o Pai porque se deixou escravizar pelo seu pecado. Ele se pune pelos pecados que têm cometido se afastando por si só da presença de Deus. Não entendeu que, na dimensão da graça, nossa comunhão com Deus não depende do que fazemos ou pensamos ou sentimos. Na dimensão da graça que liberta, a comunhão com o Pai depende única e exclusivamente da cruz. E essa dependência é testemunha de que fomos salvos como pecadores, somos pecadores em nossa peregrinação e andamos com o Senhor enquanto pecadores que dependem e vivenciam o evangelho da graça. O povo de Deus não é um grupo de pessoas especiais – supersantos – mas é bando de pecadores que tenta encontrar uma melhor maneira de celebrar e festejar com Jesus. Pecadores que se sabem pecadores e se entregam à injustiça da graça para se fazerem um tanto melhores do que podem ser nas próprias forças.
Muitos de nós fizeram para si uma lista de coisas que precisam ser feitas – cumpridas – para que se sintam santos e próximos ao Pai. Muita igreja e muita teologia reforçam essa idéia. A idéia retributiva de que, caso não cumpra algo dessa lista – dessa Lei – serei rejeitado por Deus. Aos gálatas, Paulo escrevia contra essa idéia absurda diante da cruz de Jesus: Eu me recuso a rejeitar a graça de Deus. Pois, se é por meio da lei que as pessoas são aceitas por Deus, então a morte de Cristo não adiantou nada! (...) Vocês começaram a sua vida cristã pelo poder do Espírito de Deus e agora querem ir até o fim pelas suas próprias forças? (...) Os que confiam na sua obediência à lei estão debaixo da maldição de Deus (Gl. 2. 21; 3. 3; 3. 10). Essa idéia nos escraviza ao pecado porque transforma – pelo menos para nós mesmos – o nosso pecado em algo maior que o amor e a graça de Deus que se deu em Cristo por nós à morte de cruz! Para muitos, os seus pecados são maiores que a graça de Deus. Mas é melhor lembrar do que nos diz João, e se deixar ser liberto pelo amor e graça de Jesus: Pois, se o nosso coração nos condena, sabemos que Deus é maior que o nosso coração e conhece tudo (1 Jo. 3. 20). Ser escravo do pecado é viver a punição de algo que Deus já perdoou e apagou. É se sentir culpado por algo de que Deus já não nos culpa. Por isso, conhecer a verdade é ser liberto do pecado. Porque conhecer a verdade é conhecer o perdão de Deus em Jesus Cristo.